RIO - A iminência da venda do Gávea Tourist Hotel, hoje um esqueleto encravado no meio da floresta, em São Conrado, reacende a polêmica que se arrasta há mais de 50 anos. Moradores da Estrada das Canoas enviaram à prefeitura um abaixo-assinado no qual pedem a demolição da construção, cujas obras foram interrompidas ainda nos anos 50, além da recuperação ambiental da área. As propostas dos interessados em arrematar o prédio serão abertas hoje, em sessão pública da 5 Vara Cível. Em seguida, serão divulgados os habilitados a entrar na disputa pela propriedade do hotel, cujo leilão está marcado para o dia 6 de outubro, a partir das 13h.
No texto do abaixo-assinado endereçado ao prefeito Eduardo Paes, moradores dizem que o espaço é constantemente ocupado por moradores de rua, além de servir de abrigo para bandidos e lugar de abandono de carros roubados. Além disso, seria um foco de proliferação de mosquitos e ratos. Já se houver um grande empreendimento no local, moradores sustentam que isso poderia afetar o fornecimento de água para boa parte das residências vizinhas.
Paes afirma que garante construção O prefeito Eduardo Paes disse ontem que ainda não recebeu o abaixo-assinado. Segundo ele, no entanto, a prefeitura fará tudo para viabilizar a instalação de um empreendimento naquele prédio.
— Lerei o abaixo-assinado com o maior carinho, mas vamos garantir a possibilidade de construção ali. O comprador pode ficar tranquilo. Nossa legislação é muito restritiva, mas ali vale a regra (da época). Hoje eu não daria autorização, mas aquilo está assim há mais de 40 anos. A prefeitura não criará qualquer obstáculo.
Uma das preocupações dos moradores é avaliar o impacto ambiental de um grande empreendimento na área. Além da possibilidade de construção de um hotel, há um projeto do arquiteto Paulo Casé, feito em 2005, prevendo um prédio residencial com 204 apartamentos duplex e 221 vagas de estacionamento. Os moradores se posicionam “inteiramente contra a concessão de licença para qualquer projeto arquitetônico, por ser uma área importante para a preservação ambiental da Floresta da Tijuca”.
A atriz Christiane Torloni, que assinou o abaixo-assinado, disse que não houve debate sobre o impacto ambiental de um empreendimento:
— Os moradores deveriam ter sido consultados. E o efeito sobre a área, que já tem luz e água precárias, será terrível. Outros investimentos seriam prioritários por aqui, como transporte e segurança. Não podemos permitir mais uma aberração na cidade.
A chefe do Parque Nacional da Tijuca, Maria de Lourdes Figueira, disse que o hotel não está na unidade.
— Eu teria que verificar se o hotel fica na zona de amortecimento para avaliar se haveria algum impacto ambiental — explicou ela.
Imóvel está avaliado em R$ 29,9 milhões Pela estimativa de um dos moradores, o jornalista Cláudio Chagas Freitas, o abaixo-assinado tem mais de 500 nomes. Morador do bairro, o administrador de empresas José Carlos Senna disse que a melhor solução seria a derrubada do “esqueleto” e a recuperação da área verde.
— O que não pode é ficar do jeito que está. Prefiro a derrubada, mas há um aspecto econômico que não podemos esquecer. A massa falida quer R$ 29 milhões e seriam necessários mais R$ 15 milhões para a demolição. Se o governo arcar com os custos, ótimo. Se não, sou favorável ao hotel.
Para o urbanista Sérgio Magalhães, professor da UFRJ, o impacto de uma construção daquele porte numa área de floresta requer uma discussão maior, na qual seria importante contar com a colaboração de especialistas de diversos campos, como historiadores, ambientalistas, arquitetos e até mesmo empresários:
— Não é simplesmente porque há um “esqueleto” que se pode construir um prédio residencial ou um hotel no local. Temos que avaliar também que os tempos são outros. O tempo atual é outro, diferente daquele em que, nos anos 50, a construção foi autorizada. Podemos enfrentar essa situação de uma maneira inovadora, reunir as pessoas para um debate complexo.
Avaliado em R$ 29,9 milhões, o “esqueleto” fica num terreno de 22 mil metros quadrados e a área construída é de 30 mil metros quadrados. O imóvel foi projetado em 1958 com 16 pavimentos e 480 apartamentos, pela Companhia Califórnia de Investimentos. A empresa vendeu 11.520 cotas do empreendimento, com a promessa de que cada uma daria ao portador direito a 15 dias de hospedagem por ano no hotel. Dificuldades financeiras, porém, arruinaram os planos. Em 1972, numa operação irregular, a Califórnia transferiu a propriedade do imóvel a duas pessoas físicas, que depois a repassaram a um grupo do setor imobiliário. Em 1977, a Califórnia faliu. Cotistas calculam que têm a receber mais de R$ 29 milhões, levando-se em conta a correção monetária.
O estado de conservação do prédio é o pior possível. Pilares corroídos, carcaças de quatro carros (dois deles cravados de tiros) e muita sujeira compõem uma visão desoladora em meio a um cenário de mata exuberante.
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