Ao ler uma notícia recentemente, lembrei-me do Tratado de Tordesilhas, que ainda deve ser ensinado nas escolas, devido à importância do tema.
O tal tratado, de 1494, ganhou o nome da cidade espanhola onde o documento foi assinado e estabelecia uma linha imaginária a 370 léguas de Cabo Verde, sendo que as terras achadas ou ainda por achar, a leste, pertenceriam a Portugal e a Oeste seriam da Espanha, com o direito de explorá-las. Ou seja, o que Portugal e Espanha fizeram foi, basicamente, dividir o mundo entre eles.
Agora – neste ano da graça de 2016, do século XXI – o governo americano deu “total liberdade” a uma companhia de transportes para planejar viagens à Lua. A empresa chama-se Moon Express e localiza-se no Vale do Silício, região da Califórnia onde se concentram companhias de inovação e tecnologia. Outras empresas, como a SpaceX e a Bigelow Aerospace, também disputam os direitos de mineração na Lua, que é rica em recursos naturais.
Passados mais de 500 anos do Tratado de Tordesilhas, a história se repete. Os Estados Unidos concedem direito de exploração a empresas, com objetivos comerciais, como se fossem donos da Lua.
Alguém poderia argumentar: “Bom, mas eles chegaram lá primeiro”. Esse me parece mau argumento, primeiro, porque “chegar primeiro” deveria valer apenas para disputas esportivas e não para decisões cruciais para o destino da humanidade. Depois, porque a Rússia poderia reivindicar-se dona do espaço, já que foi a (antiga) União Soviética a pôr um homem fora da órbita da Terra, Yuri Gagarin.
E, antes dos americanos, um equipamento soviético (não tripulado) também chegou à Lua. A espaçonave Luna 2 tocou o solo lunar e espatifou-se por lá (ainda não havia tecnologia para o pouso). A operação seguinte, a Luna 3 foi ao lado escuro da lua e fez fotos de alta resolução. Em 1970, os soviéticos foram mais longe: fizeram pousar uma sonda em Vênus. Por isso, os russos seriam donos da Estrela d’Alva?
Porém, se a empresas – com recursos econômicos e tecnologia de ponta – fosse negado o direito de explorar os corpos celestes – já que a humanidade vai necessitar expandir-se algum dia -, de que modo isso poderia ser feito?
Alguns analistas defendem um acordo internacional para estabelecer critérios para a exploração do espaço. Seria um tratado para pôr sob a responsabilidade da comunidade internacional todos os corpos celestes, tornando-os patrimônio da humanidade.
Porém, é óbvio que algo assim iria contrariar os grandes grupos econômicos, que olham para o céu como os portugueses e espanhóis olhavam para o “novo mundo”: como oportunidade de negócios.
E, também, será que estamos sozinhos no universo ou poderemos nos encontrar com outras formas de vida inteligentes, como os europeus encontraram, por aqui, os donos primordiais das terras “descobertas”? Se fosse assim, como isso se resolveria?
Mas, enfim, aquele negócio de vender terreno na Lula tornou-se verdade. Não pela façanha de estelionatários enganando incautos, mas sob o controle da maior potência econômica e militar do planeta. Comprar terrenos na Lua tornou-se realidade – vejamos se a serviço de uma boa causa ou para atender aos interesses de uma pequena elite no topo da pirâmide econômica. Uma passada de olhos pela história não admite bons prognósticos.
NOTAS
Hotel no espaço
A empresa SpaceX, do bilionário Elon Musk, pretende enviar uma nave não tripulada até Marte, em 2018. A Bigelow Aerospace, do magnata Robert Bigelow, quer explorar o espaço para fins turísticos. Ele já colocou em órbita uma nave para testar a possibilidade de um hotel espacial.
Morando em Marte
A empresa Mars-One recruta voluntários para uma viagem sem volta até Marte, onde fundariam uma colônia de humanos. A previsão é que a viagem seja feita em 2022. Milhares de pessoas inscreveram-se para participar da experiência.