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Justiça Federal terminou nova perícia médica no ex-juiz Nicolau dos
Santos Neto, ex-presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª
Região (TRT2), em São Paulo, que cumpre pena em regime domiciliar há dez
anos. A medida foi tomada porque Nicolau, segundo a Polícia Federal,
inverteu os papéis: de condenado sob vigilância, ele teria espionado sua
escolta por meio de uma câmera de circuito fechado que mandou instalar
clandestinamente no cômodo da casa onde ficam alojados os federais.
O
equipamento foi descoberto por um agente da equipe da PF que se reveza
dia e noite na guarda de Nicolau, a quem a Justiça impôs 26 anos de
prisão pelo suposto desvio de verbas da obra do Fórum Trabalhista da
capital.
"O dr. Nicolau não estava monitorando os federais", reage
o advogado Celmo de Assis Pereira. "A câmara estava lá há anos, mas
exclusivamente por uma questão de segurança da casa. Ele (Nicolau) não
pode ser exceção, só porque foi juiz."
A ação penal ainda não
chegou ao término porque o Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprecia
recurso especial da defesa. Desde que se entregou, após oito meses
foragido, Nicolau, hoje com 84 anos, alega estado de saúde precário e
por isso permanece no casarão do Morumbi.
Em março, o Ministério
Público Federal requereu que "seja declarada a melhora do estado de
saúde de Nicolau, não havendo justificativa, por motivo de doença, da
permanência em regime de prisão domiciliar". Em 25 de abril, a Justiça
mandou a Coordenadoria de Saúde do Sistema Penitenciário agendar o exame
do ex-magistrado.
Na rua. De início, os policiais ficavam de
plantão na rua, em uma viatura. Depois, a Justiça mandou que fosse
providenciado um cômodo da casa para alojar a equipe. Segundo a PF, a
câmera foi localizada em meados de 2011 atrás da grade de uma janela que
separa o quarto de acomodação dos agentes da garagem da residência. O
aparelho estava embutido em uma caixa de papelão de cor laranja com os
dizeres Black & Decker, com pequenos furos em suas laterais, que
permitiam filmagens.
Peritos constataram que as imagens captadas
pelo mecanismo eram exibidas "em tempo real" para um monitor de TV na
sala principal da casa. Laudo da PF, com 17 fotografias, indica
existência de outro dispositivo eletrônico supostamente para captação de
áudio.
Relatório da PF narra que o próprio magistrado "exigiu a
recolocação da câmera no seu exato local de origem, para que as
gravações do interior do quarto dos plantonistas continuassem sendo
realizadas". A PF destacou que a "conduta acintosa do custodiado ofende a
toda esta instituição, que mantém a vigilância (de Nicolau) há longos
anos, com um custo para a União de mais de R$ 500 mil por ano, somente
considerados os salários dos policiais diretamente encarregados da
missão".
Transferência. A PF representou "pela transferência (de
Nicolau) para o regime disciplinar diferenciado, a ser cumprido em um
estabelecimento prisional federal" e requisitou "a destruição de
quaisquer mídias ou do conteúdo de qualquer dispositivo de armazenamento
de imagens que contenham gravações dos policiais federais no cômodo
destinado à equipe de plantão, vez que ilegais".
"A própria PF fez
um procedimento administrativo concluindo que não há fato típico
penalmente punível", assinala o advogado Celmo Assis Pereira. "Estão
ressuscitando uma coisa que já acabou. A câmara fazia o monitoramento da
garagem." A Procuradoria da República atribui a Nicolau prática de
"falta grave".
"Os documentos, com o laudo pericial, confirmam que
Nicolau monitorou clandestinamente e com finalidade injustificada, por
período de tempo desconhecido, a atividade dos agentes, inclusive com
possibilidade de gravação das conversas por eles tidas", adverte a
Procuradoria. "Este tipo de conduta simplesmente subverteu o objetivo e
as finalidades da execução penal ou mesmo do cumprimento da prisão
preventiva domiciliar, transformando o executando em vigilante daqueles
que deveriam vigiá-lo."