Construída entre 1927 e 1928, a Casa Modernista da Vila Mariana tem um longo histórico de resistência aos conservadores. Marco da arquitetura modernista, o projeto do russo Grigori Warchavchik (1896-1972) só foi aprovado pela Prefeitura depois que o arquiteto apresentou uma falsa fachada, camuflada de ornamentos. A partir de hoje, ela será palco de novas provocações com a segunda edição do programa de exposições do Centro Cultural São Paulo, transferido para a Casa Modernista em razão da Bienal da Arquitetura. A primeira provocação é a performance (às 15h e às 20h) de outro russo, Fyodr Pavlov-Andreevich, que vai rolar nu na piscina da casa e ocupar seu banheiro. Nele, Andreevich usa tablets que simulam azulejos e mostram fotos de violência contra judeus na Ucrânia. Neles, rostos das vítimas são trocados por Warchavchik, que nasceu em Odessa, cidade ucraniana, e chegou ao Brasil em plena ebulição modernista.
A exemplo de Warchavchik, o jovem Andreevich descende de judeus e conhece bem a história da Ucrânia e dos pogroms antissemitas que levaram à morte milhares de seus pares antes e depois da Revolução. Muitas de suas performances fazem referência a esse passado. A própria família de Andreevich foi vítima de todos os regimes russos – e isso é lembrado numa de suas performances (Flick Me on My Memory, 2010). Nela, o performer, participante ativo dos festivais organizados por Marina Abramovic, recorre a uma antiga lenda judaica segundo a qual toda criança que vem ao mundo tem memória absoluta até sair da barriga da mãe. Para lembrar do que esqueceu, Andreevich tirou a roupa (ele adora fazer isso) e regrediu ao estado infantil, subindo uma escada numa galeria e pedindo ao público que apertasse seu nariz, como Deus faz para que os pequenos não tragam ao mundo a pesada bagagem da memória absoluta.
Se Andreevich resolveu ocupar a Casa Modernista com lembranças dos pogroms, os outros três artistas brasileiros convidados para a mostra do CCSP se mostraram pouco reverentes ao ícone modernista brasileiro. O curador da mostra, Márcio Harum, explica que seu objetivo não era o de fazer a apologia da modernidade, mas o de mostrar que, antes dos ideais bauhausianos, de Warchavchik ou de Niemeyer, o Brasil já tinha uma história – não só arquitetônica – que precisa ser repensada.
Logo na entrada da Casa Modernista, o visitante poderá atestar a resistência à ordem formal do modernismo europeu na obra site specific Priscila, de Chico Togni. Trata-se de uma edícula de papelão pintado, deliberadamente rudimentar e sem estilo, que contrasta com os volumes prismáticos brancos de Warchavchik.
A provocação continua no interior da casa: Fernando Marques Penteado ocupa a cozinha como cenário de um ritual pagão e Rodolpho Parigi mostra um esqueleto de minotauro na sala. Também participa da mostra o carioca Jimson Vilela.
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