Por uma diferença de cinco votos, a Câmara dos Deputados não aprovou a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos para alguns crimes. Na tumultuada sessão iniciada na noite desta terça-feira, 30, e terminada somente na madrugada de quarta, 1º, foram apenas 303 votos a favor. Como se tratava de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), eram necessários 308 votos. Um total de 184 deputados foi contrário à redução. Três se abstiveram.
Como o texto rejeitado era um substitutivo redigido na comissão especial criada para debater o tema, a Câmara ainda votará a proposta original, mais severa, que determina redução para todos os tipos de crimes. Segundo o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a votação ocorrerá na semana que vem ou somente depois do recesso parlamentar de julho.
"A gente sabia que ia ser uma luta. Eu fico feliz de a gente ter conseguido levar a votação. Apesar de todos os contratempos, foi uma sessão histórica e importante", disse Cunha após a votação. Dezessete peemedebistas votaram contra a orientação do partido.
O texto rejeitado reduziria de 18 para 16 anos a maioridade penal para crimes hediondos, homicídio doloso, tráfico de drogas, lesão corporal grave ou seguida de morte e roubo com causa de aumento de pena, como o uso de arma. O governo quer que o prazo máximo de internação de menores que cometem crimes hediondos passe de três para oito anos. A proposta tramita no Senado, que começou a discutir o tema em plenário na sessão desta terça.
A sessão, que durou cerca de cinco horas, foi marcada por discussões acaloradas. "Reduzir a maioridade penal aumenta a violência na sociedade. Não diminui. É ineficaz", afirmou Ivan Valente (PSOL-SP). "Não somos vingadores. Somos legisladores. Temos que garantir o futuro da nossa juventude. O mesmo Estado que não acolhe, que não dá educação, cultura, lazer, não pode ser o Estado da punição", disse Valente.
Integrante da chamada "bancada da bala", o deputado Alberto Fraga (DEM-DF), coronel da reserva da Polícia Militar, criticou texto escrito pelo grupo parlamentar contrário à redução da maioridade penal. "Quem escreveu isso aqui ou fumou maconha estragada ou não sabe o que diz", afirmou da tribuna o deputado.
Ao concluir seu discurso, Fraga foi alvo de manifestação de estudantes que acompanham a sessão nas galerias do plenário. Outros deputados da "bancada da bala", todos vestindo camisetas pretas onde se lê "redução da maioridade penal já", reagiram. O Capitão Augusto (PR-SP) olhou para os manifestantes e friccionou os dedos insinuando recebimento de dinheiro.
Concluída a votação, manifestantes comemoraram a rejeição cantando "O Cunha é ditador", "Nas ruas, nas praças, quem disse que sumiu, aqui está presente o movimento estudantil".
Contrário à redução da maioridade penal, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, afirmou que a medida deve fazer a população carcerária do País aumentar em até 40 mil pessoas por ano, o que agravaria ainda mais o déficit de vagas do sistema prisional brasileiro. Atualmente, faltam 220 mil vagas nos presídios para abrigar os 607 mil presos do País.
O governo tentou durante todo o dia impedir que o grupo de parlamentares favorável à alteração na Constituição atingisse os 308 votos necessários para garantir a mudança.
A ação do governo começou pela manhã. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, convocou reunião com líderes de partidos da base do governo para apresentar argumentos contrários à redução. Segundo ele, se a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) for aprovada, a situação do sistema prisional brasileiro ficaria "catastrófica". "A situação será alarmante. As consequências serão desastrosas para o País", afirmou.
O ministro lembrou o déficit de prisões. "Temos presídios completamente superlotados. A taxa de ocupação chega a 160% e há mais de 400 mil mandados de prisão a serem cumpridos. Temos necessidade de um outro sistema prisional."
Bomba atômica
Cardozo disse que o governo entregará, no fim deste ano, 40 mil vagas prometidas pela presidente Dilma Rousseff em 2011. Ou seja, o governo levou quatro anos para oferecer o número de vagas que seriam necessárias em um ano se a redução da maioridade for aprovada.
"Isso é uma bomba atômica para o sistema prisional dos Estados", disse o ministro da Justiça. "Há momentos em que o governo não pode deixar de informar que o caminho é desastroso." A pesquisa sobre sistema prisional que Cardozo afirmou ter distribuído para deputados e senadores indica ainda que detentos têm nível de contaminação por HIV 60 vezes maior do que quem está em liberdade.
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