O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está de volta à arena política. E para anunciá-lo, nada mais simbólico que se reunir neste sábado em São Bernardo do Campo, seu berço político, com o ex-presidente do Uruguai José Mujica, um dos líderes mais populares da América Latina e do mundo hoje em dia, e falar para uma plateia formada por ministros, deputados, prefeitos, vereadores, lideranças sindicais e simpatizantes. “Fiquei calado durante muito tempo porque tinha que cumprir meu papel de ex-presidente. (…) Mas não me deixam em paz. Só matam um pássaro se ele fica parado. E eu voltei a voar outra vez”.
O anúncio ocorreu um dia depois de sinalizar em uma entrevista que poderia voltar a se candidatar em 2018. Durante o discurso deste sábado, que encerrou o seminário Participação Cidadã, Gestão Democrática e as Cidades no Século XXI, Lula não chegou a mencionar uma possível candidatura. No entanto, parece ao menos se posicionar como porta-voz de um Governo que tem dificuldades de comunicar e de um partido desgastado após 12 anos de poder. A presidenta Dilma Rousseff tem menos de 8% de popularidade, segundo as pesquisas, e seu Governo está atolado em uma crise econômica que derrubou 1,9% do PIB no segundo trimestre. Além disso, enfrenta um escândalo de corrupção na Petrobras, investigado pela Operação Lava Jato, e a pressão das ruas e da oposição para sofrer um impeachment.
No entanto, as imagens recentes de um ex-presidente Lula abatido, pedindo para que o Partido dos Trabalhadores fizesse uma autocrítica, parecem ter ficado no passado. Esse papel ficou com "Pepe" Mujica, o carismático ex-presidente do Uruguai venerado em todo o mundo. Mujica fez uma enfática defesa da democracia "é a melhor porcaria que encontramos" e da necessidade de partidos políticos para que ela exista. "Eles são a vontade coletiva de grupos humanos de fazer as coisas melhores. Mas também ficam doentes. Temos que lutar por partidos republicanos, onde os dirigentes aprendam a viver como a maioria do país e não como a minoria", discursou. "Não se deve confundir um presidente com um monarca. O cargo não é nada mais que um voto de confiança dos cidadãos. Não há homens imprescindíveis, há causas imprescindíveis".
Sua fala foi toda uma introdução para o ex-presidente Lula. Se Mujica defendeu a necessidade de partidos políticos, Lula saiu em defesa do PT do seu partido como há muito tempo não fazia. "A cidadania é um tema que nosso partido tem que ensinar. (...) O PT passa por um momento de criminalização e esse é o momento de levantar a cabeça e voltar à rua como antes", pediu aos presentes, sob fortes aplausos e gritos que pediam sua volta.
O retorno de Lula aos holofotes acontece logo após pesquisas de opinião revelarem que se a eleição fosse hoje, o senador Aécio Neves (PSDB) venceria com 19 pontos de vantagem sobre Lula; o senador José Serra com 7 pontos a mais do que o petista; e o governador de São Paulo Geraldo Alckmin com 4 pontos, segundo uma apuração do IBOPE. Mas Lula não se dá por vencido e parece querer dar volta por cima e sair do "volume morto" expressão usada por ele mesmo há alguns meses. A campanha para próximas eleições presidenciais, seja lá quando ocorram, parece já ter começado. “A direita reacionária deste país gosta de dizer que o Lula já era. Como eu tenho as costas largas, vou ver se eles deixam a querida Dilma em paz e voltam a se incomodar comigo”.
Mais uma vez, tocou na tecla da educação como ponto de partida. "Temos que colocar na ordem do dia a questão da educação nesse país. Quem pode fazer isso é o PT. Temos que voltar a revolucionar a política. O PT é a voz do povo desse país, temos que fazer essa revolução".
Durante seu discurso, Lula voltou a ser Lula. Ignorou o que estava escrito no papel, improvisou por cerca de uma hora, arrancou gargalhadas e gritos que pediam uma nova candidatura. Se vangloriou do seu Governo e defendeu enfaticamente o seu partido por "comandar os últimos 35 anos de luta popular no Brasil". Além disso, argumentou que o PT fez uma "revolução silenciosa no país" a partir das prefeituras ao fazer o orçamento participativo, o primeiro deles na Administração de Diadema, em 1982. "Pela primeira vez o povo humilde era chamado a discutir cada prioridade do seu bairro. Esse partido mudou a cultura administrativa das cidades desse pais. E isso incomoda muita gente", explicou.
Sobre seu Governo, disse que o seu principal legado foi a relação que estabeleceu com a sociedade e com os movimentos sociais. "Se juntar todos os presidentes do país, antes de mim, eles não fizeram 10% das reuniões que fizemos. Essas reuniões definiram as políticas publicas deste país. Não eram políticas do governo, eram da sociedade. Aquele palácio continuou recebendo empresários e príncipes, mas também passou a receber a sociedade".
Lula ainda citou algumas das conquistas sociais das últimas décadas, como o aumento contínuo do salário mínimo e o fato de que, hoje, mais pessoas podem viajar de avião. E disse que vai passar para a história com o presidente que mais fez universidades. "Pode ser que alguns tenham razão em suas críticas, mas por que todo esse ódio? Será que por que as empregadas domésticas conquistaram mais direitos? Essas pessoas vão às ruas para desfazer as melhorias que fizemos". Lula promete falar e viajar mais pelo país. Está em campanha outra vez.