Quem utiliza as rodovias do Litoral Norte pode ter sensações que passam da euforia, do vislumbre, para o medo. Isso porque ao mesmo tempo em que se tem uma das mais belas vistas do litoral paulista, e porque não dizer brasileiro, a mesma estrada que proporciona este visual, é a mesma que mata. E muito e justamente naqueles locais que permitem, literalmente ‘viajar’ pelas paisagens compostas do mar e da vegetação da Mata Atlântica.
São quase 200 quilômetros da rodovia Rio-Santos (SP-55 e BR-101) ligando São Sebastião, Caraguatatuba e Ubatuba, e claro, o único acesso por terra para Ilhabela. E embora essa pareça uma reportagem de turismo, o que retrataremos hoje são as condições dessa estrada que é a única ligação do Litoral Norte com o Vale do Paraíba e Baixada Santista.
Ao mesmo tempo a Rio-Santos é uma rodovia e uma avenida quando se confunde com os trechos urbanos das cidades – Boiçucanga, Maresias e do Centro ao bairro São Francisco, em São Sebastião – cortando ainda Caraguá e Ubatuba.
Uma das principais características dessa rodovia são as curvas acentuadas, em especial na Costa Sul de São Sebastião, na Praia das Cigarras, também em São Sebastião, no trecho que vai da Casa Branca ao Jetuba, em Caraguá, e em praticamente todo o trecho de Ubatuba.
Constantemente a Editoria de Polícia do Imprensa Livre publica relatos de acidentes ocorridos na SP-55. Foi em função desses sinistros que um engenheiro chamou a atenção para o que ele considera um perigo na pista: as curvas.
“Acompanho as reportagens do jornal e percebi que a maioria dos acidentes foi registrada nos trechos de curvas. Como também faço muita viagem entre Juquehy e o Centro de São Sebastião, observei vários carros, motos e ônibus envolvidos em colisões, e batidas. Sem contar a quantidade de defensas e muretas de concreto instalados nesses locais e que estão constantemente quebrados”, alerta o engenheiro civil Emílio Iarussi.
Um dos detalhes que teria chamado a atenção de Iarussi seria a falta da sobrelevação nas curvas. Isso significa que o lado de fora da curva tem que ser um pouco mais alto que o lado de dentro, ou seja, ela tem que ser inclinada. “Com isso, é possível aumentar a força centrípeta (que puxa para o centro) na curva enquanto o veículo está trafegando mesmo com velocidade elevada. Assim reduz a possibilidade do veículo perder a aderência ao fazer a curva”, exemplifica.
Entre as causas dos acidentes, conforme relatado por especialistas, estão imprudência de muitos condutores e problemas com a conservação das vias, isso porque quando é feito o reparo da pista, em alguns casos, não seria obedecida a topografia original, o que faria alguns trechos perderem as inclinações necessárias. Mas erros técnicos no projeto de estradas podem agravar ainda mais a questão.
Em suas explicações, Iarussi destaca que a Lei da Inércia obriga o veículo a sair pela tangente à curva. No caso de uma motocicleta, ao ingressar em uma curva o piloto, por instinto, inclina seu corpo com a moto e assim controla essa lei que o obriga a manter a trajetória retilínea e que não o sujeita à força centrífuga. “Ao corrigi-la, o motociclista cria uma força centrípeta, evitando o acidente”.
No caso de um veiculo de quatro rodas, segundo o engenheiro, a única maneira de vencer a Lei da Inércia é sobrelevar a guia do lado externo da curva - se ela é para a direita a sobrelevação é da guia esquerda. Outro fator determinante para realizar a curva com segurança é a velocidade e ela depende do raio da curva. Mas, conforme o engenheiro Iarussi, as placas nas estradas são muito incoerentes, por isso nem sempre são levadas a sério pelos motoristas.
“A sinalização deve respeitar a diferença que existe entre veículos leves e pesados e em geral a velocidade estabelecida acaba sendo baixa demais para automóveis e alta para caminhões, sendo que o caso mais grave acontece nas curvas em descida, nas serras ou alças de pontes e viadutos, em que a velocidade máxima indicada vale para os carros, mas quase sempre é alta para os caminhões. O resultado é que somos recordistas em tombamentos de caminhões”.
Emílio Iarussi cita o trabalho do professor e engenheiro da Escola Politécnica da USP, o já falecido Adervan Machado, que teria passado boa parte da sua vida cobrando das autoridades a correção dessas curvas (sem sobrelevação ou com sobrelevação negativa) que jogam os veículos para fora da pista. “Ele as chamava de ‘curvas assassinas’ e conseguiu que umas 50 fossem reformadas”, relembra.
Derrapagens
A reportagem do Imprensa Livre percorreu alguns trechos da rodovia Rio-Santos com o engenheiro Emílio Iarussi onde ele mostrou os locais mais comuns onde ocorrem os acidentes no trecho de São Sebastião. Um caso de falta de sobrelevação é apontado no Km 187, em Bora-Bora, na Costa Sul, sentido Boracéia. Ali, conforme a velocidade que entra na pista – o limite ali é de 80 Km/h, o motorista tende a sair da sua faixa, sentido pista contrária. O resultado são as constantes colisões ocorridas na defensa instalada na pista sentido Centro.
Uma das vistas mais bonitas desse trecho da Costa Sul fica na Praia Preta e é lá também que está um dos trechos considerados mais perigosos, segundo engenheiro. Além do problema da curva, há ainda trechos que acumulam água em períodos de chuva, o que leva o risco de aquaplanagem.
Na famosa serrinha de Boiçucanga/Maresias, a situação é considerada mais crítica. A pista é estreita e as curvas são fechadas. No ano passado, pai e filho que estavam em um caminhão morreram após saírem da pista. No local, duas cruzes lembram as vidas perdidas.
Em dezembro do ano passado, outro registro grave, desta vez no Km 137,600, na serrinha de Guaecá. O motociclista João Batista Alves Ferreira, 26 anos, seguia com a moto Intruder sentido Centro-Costa Sul, quando colidiu de frente com um caminhão que vinha no sentido contrário. Com o impacto, a vítima faleceu no local.
Aliás, esse é um dos trechos considerados mais perigosos até mesmo pelos usuários da rodovia. O motorista vem de uma reta e logo na seqüência já entra em uma curva acentuada. Ali é possível ver os veículos ‘comendo’ a faixa.
Um dia após a reportagem fazer o trecho com o engenheiro, um novo acidente foi registrado na área. Desta vez envolvendo dois veículos de passeio e um caminhão. O motivo foi óleo derramado na pista, mas quem mora nas imediações é unânime ao contar que já perdeu a conta da quantidade de acidentes que presenciou ou simplesmente se transformou em mais uma estatística.
É o caso do eletricista Edílson Alves de Souza Dutra, 23 anos, que mora no bairro e foi ao local do acidente após outros dois veículos terem rodado na pista. “Esta pista é ruim. Os motoristas entram em alta velocidade e acabam indo para a outra via. Se vem carro no sentido contrário, pode esperar que tem acidente”, descreve.
Imprudência deve ser levada em consideração
Embora com um número considerado excessivo de acidentes nos trechos de curvas, órgãos responsáveis pela rodovia Rio-Santos apontam que a imprudência ainda é uma dos principais fatores de colisões na pista.
O inspetor de tráfego do Departamento de Estradas de Rodagens (DER), Flávio Risther Moraes, observa que a rodovia não é perigosa porque é bem sinalizada e com vários trechos planos.
Na avaliação da Polícia Rodoviária Estadual falta mais atenção aos motoristas. Segundo o órgão, na maioria dos casos de acidente, a imprudência com excesso de velocidade e ultrapassagem em local proibido, são os fatores preponderantes para os sinistros.
Com relação à possível correção dos trechos sinuosos, o DER explicou que “a rodovia Rio-Santos é uma das mais antigas rodovias do Estado de São Paulo, o que explica a quantidade de curvas sinuosas em toda sua extensão”. Em função disso, está sendo elaborado projeto para implementar faixas adicionais na via no trecho entre Ubatuba e Caraguatatuba. O governador Geraldo Alckmin anunciou ainda, no início de junho de 2011, a construção de um contorno viário ligando a Rodovia dos Tamoios (SP-99) ao Porto de São Sebastião pela SP-55. A obra estimada em R$ 1 milhão servirá como alternativa para desafogar o fluxo de veículos que passam diariamente pela via. (M.C.)
São quase 200 quilômetros da rodovia Rio-Santos (SP-55 e BR-101) ligando São Sebastião, Caraguatatuba e Ubatuba, e claro, o único acesso por terra para Ilhabela. E embora essa pareça uma reportagem de turismo, o que retrataremos hoje são as condições dessa estrada que é a única ligação do Litoral Norte com o Vale do Paraíba e Baixada Santista.
Ao mesmo tempo a Rio-Santos é uma rodovia e uma avenida quando se confunde com os trechos urbanos das cidades – Boiçucanga, Maresias e do Centro ao bairro São Francisco, em São Sebastião – cortando ainda Caraguá e Ubatuba.
Uma das principais características dessa rodovia são as curvas acentuadas, em especial na Costa Sul de São Sebastião, na Praia das Cigarras, também em São Sebastião, no trecho que vai da Casa Branca ao Jetuba, em Caraguá, e em praticamente todo o trecho de Ubatuba.
Constantemente a Editoria de Polícia do Imprensa Livre publica relatos de acidentes ocorridos na SP-55. Foi em função desses sinistros que um engenheiro chamou a atenção para o que ele considera um perigo na pista: as curvas.
“Acompanho as reportagens do jornal e percebi que a maioria dos acidentes foi registrada nos trechos de curvas. Como também faço muita viagem entre Juquehy e o Centro de São Sebastião, observei vários carros, motos e ônibus envolvidos em colisões, e batidas. Sem contar a quantidade de defensas e muretas de concreto instalados nesses locais e que estão constantemente quebrados”, alerta o engenheiro civil Emílio Iarussi.
Um dos detalhes que teria chamado a atenção de Iarussi seria a falta da sobrelevação nas curvas. Isso significa que o lado de fora da curva tem que ser um pouco mais alto que o lado de dentro, ou seja, ela tem que ser inclinada. “Com isso, é possível aumentar a força centrípeta (que puxa para o centro) na curva enquanto o veículo está trafegando mesmo com velocidade elevada. Assim reduz a possibilidade do veículo perder a aderência ao fazer a curva”, exemplifica.
Entre as causas dos acidentes, conforme relatado por especialistas, estão imprudência de muitos condutores e problemas com a conservação das vias, isso porque quando é feito o reparo da pista, em alguns casos, não seria obedecida a topografia original, o que faria alguns trechos perderem as inclinações necessárias. Mas erros técnicos no projeto de estradas podem agravar ainda mais a questão.
Em suas explicações, Iarussi destaca que a Lei da Inércia obriga o veículo a sair pela tangente à curva. No caso de uma motocicleta, ao ingressar em uma curva o piloto, por instinto, inclina seu corpo com a moto e assim controla essa lei que o obriga a manter a trajetória retilínea e que não o sujeita à força centrífuga. “Ao corrigi-la, o motociclista cria uma força centrípeta, evitando o acidente”.
No caso de um veiculo de quatro rodas, segundo o engenheiro, a única maneira de vencer a Lei da Inércia é sobrelevar a guia do lado externo da curva - se ela é para a direita a sobrelevação é da guia esquerda. Outro fator determinante para realizar a curva com segurança é a velocidade e ela depende do raio da curva. Mas, conforme o engenheiro Iarussi, as placas nas estradas são muito incoerentes, por isso nem sempre são levadas a sério pelos motoristas.
“A sinalização deve respeitar a diferença que existe entre veículos leves e pesados e em geral a velocidade estabelecida acaba sendo baixa demais para automóveis e alta para caminhões, sendo que o caso mais grave acontece nas curvas em descida, nas serras ou alças de pontes e viadutos, em que a velocidade máxima indicada vale para os carros, mas quase sempre é alta para os caminhões. O resultado é que somos recordistas em tombamentos de caminhões”.
Emílio Iarussi cita o trabalho do professor e engenheiro da Escola Politécnica da USP, o já falecido Adervan Machado, que teria passado boa parte da sua vida cobrando das autoridades a correção dessas curvas (sem sobrelevação ou com sobrelevação negativa) que jogam os veículos para fora da pista. “Ele as chamava de ‘curvas assassinas’ e conseguiu que umas 50 fossem reformadas”, relembra.
Derrapagens
A reportagem do Imprensa Livre percorreu alguns trechos da rodovia Rio-Santos com o engenheiro Emílio Iarussi onde ele mostrou os locais mais comuns onde ocorrem os acidentes no trecho de São Sebastião. Um caso de falta de sobrelevação é apontado no Km 187, em Bora-Bora, na Costa Sul, sentido Boracéia. Ali, conforme a velocidade que entra na pista – o limite ali é de 80 Km/h, o motorista tende a sair da sua faixa, sentido pista contrária. O resultado são as constantes colisões ocorridas na defensa instalada na pista sentido Centro.
Uma das vistas mais bonitas desse trecho da Costa Sul fica na Praia Preta e é lá também que está um dos trechos considerados mais perigosos, segundo engenheiro. Além do problema da curva, há ainda trechos que acumulam água em períodos de chuva, o que leva o risco de aquaplanagem.
Na famosa serrinha de Boiçucanga/Maresias, a situação é considerada mais crítica. A pista é estreita e as curvas são fechadas. No ano passado, pai e filho que estavam em um caminhão morreram após saírem da pista. No local, duas cruzes lembram as vidas perdidas.
Em dezembro do ano passado, outro registro grave, desta vez no Km 137,600, na serrinha de Guaecá. O motociclista João Batista Alves Ferreira, 26 anos, seguia com a moto Intruder sentido Centro-Costa Sul, quando colidiu de frente com um caminhão que vinha no sentido contrário. Com o impacto, a vítima faleceu no local.
Aliás, esse é um dos trechos considerados mais perigosos até mesmo pelos usuários da rodovia. O motorista vem de uma reta e logo na seqüência já entra em uma curva acentuada. Ali é possível ver os veículos ‘comendo’ a faixa.
Um dia após a reportagem fazer o trecho com o engenheiro, um novo acidente foi registrado na área. Desta vez envolvendo dois veículos de passeio e um caminhão. O motivo foi óleo derramado na pista, mas quem mora nas imediações é unânime ao contar que já perdeu a conta da quantidade de acidentes que presenciou ou simplesmente se transformou em mais uma estatística.
É o caso do eletricista Edílson Alves de Souza Dutra, 23 anos, que mora no bairro e foi ao local do acidente após outros dois veículos terem rodado na pista. “Esta pista é ruim. Os motoristas entram em alta velocidade e acabam indo para a outra via. Se vem carro no sentido contrário, pode esperar que tem acidente”, descreve.
Imprudência deve ser levada em consideração
Embora com um número considerado excessivo de acidentes nos trechos de curvas, órgãos responsáveis pela rodovia Rio-Santos apontam que a imprudência ainda é uma dos principais fatores de colisões na pista.
O inspetor de tráfego do Departamento de Estradas de Rodagens (DER), Flávio Risther Moraes, observa que a rodovia não é perigosa porque é bem sinalizada e com vários trechos planos.
Na avaliação da Polícia Rodoviária Estadual falta mais atenção aos motoristas. Segundo o órgão, na maioria dos casos de acidente, a imprudência com excesso de velocidade e ultrapassagem em local proibido, são os fatores preponderantes para os sinistros.
Com relação à possível correção dos trechos sinuosos, o DER explicou que “a rodovia Rio-Santos é uma das mais antigas rodovias do Estado de São Paulo, o que explica a quantidade de curvas sinuosas em toda sua extensão”. Em função disso, está sendo elaborado projeto para implementar faixas adicionais na via no trecho entre Ubatuba e Caraguatatuba. O governador Geraldo Alckmin anunciou ainda, no início de junho de 2011, a construção de um contorno viário ligando a Rodovia dos Tamoios (SP-99) ao Porto de São Sebastião pela SP-55. A obra estimada em R$ 1 milhão servirá como alternativa para desafogar o fluxo de veículos que passam diariamente pela via. (M.C.)
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