GACC - Grupo de Assistência à Criança com Câncer

GACC - Grupo de Assistência à Criança com Câncer
Desde o início de suas atividades, em 1996, o GACC - então Grupo de Apoio à Criança com Câncer - existe para aumentar a expectativa de vida e garantir a oferta e a qualidade global do tratamento oferecido integral e indistintamente a crianças e jovens com câncer, diagnosticados com idades entre 0 e 19 anos incompletos, independente de sexo, cor, religião ou posição socioeconômica.

segunda-feira, 27 de abril de 2015

Sem medo de morrer. O que pensam os usuários de anabolizantes


Fernando Sardinha é tão forte que faz um segurança de balada parecer pequeno. Normal, ele é o fisiculturista mais vitorioso do Brasil e passou dos 70 títulos nacionais e internacionais. Cirano Bueno não é atleta, nem tem este nível de músculos, mas é grande porque frequenta a academia com uma assiduidade religiosa. Além do gosto por puxar ferro, eles usam anabolizantes. Sem medo.

Ambos acreditam que a ingestão destas substâncias não prejudica a saúde ou que pode provocar a morte. Como tantos outros, a dupla confia que exames periódicos e tratamentos depois dos períodos de consumo de esteroides conseguem contornar os efeitos colaterais.

Batem de frente com a Medicina, que condena os anabolizantes e elenca uma série de danos ao organismo, incluindo câncer, problemas cardíacos, renais, impotência e calvície (leia mais abaixo). E a principal ameaça, pode matar, como aconteceu recentemente com Tainá Barbosa, 24 anos, em Fortaleza.

Duas paradas cardíacas provocaram a morte da estudante de direito em 14 de março e os esteroides foram apontados como causa. Situações de pessoas perdendo braços ou outros membros também são relatadas na imprensa com certa frequência.

Estas histórias não desencorajam os usuários de anabolizantes que consideram estes casos consequência da falta de informação. Eles não negam que as substâncias podem prejudicar o organismo ou matar, mas justificam que a diferença entre o remédio e o veneno é a dose aplicada. O fisiculturista Fernando Sardinha ressalta ainda que o produto utilizado quando há complicações à saúde quase nunca é um esteroide.

"Isso chama-se ADE, vitamina A, vitamina D e vitamina E. Um óleo viscoso que é usado para colocar essas vitaminas em alta quantidade em equinos, suínos e bovinos. Não que existe vitamina para equinos, suínos e bovinos, é uma só, tudo igual (a de humanos). Os caras colocam esse óleo viscoso que é bem grosso dentro dos músculos para ficar com um inchaço. Aí este óleo vai tomando conta e necrosa."

Sardinha defende que é possível usar anabolizantes sem prejudicar a saúde, mas pondera que é necessário a supervisão médica. "Todo mundo que fizer acompanhamento com endocrinologista pode fazer uso seguro porque o endocrinologista estuda para isso, só para hormônio. Para saber o que pode e o que não pode tomar".

O empresário Cirano Bueno diz que depois dos chamados ciclos, período entre oito e 12 semanas em que se usam anabolizantes, é feito um TPC (tratamento pós-ciclo). Ele serve para evitar que o excesso de testosterona no corpo prejudique o organismo. Mas Sardinha questiona o uso destas substâncias para fins estéticos.

A diferença de abordagem ocorre porque existem perfis distintos nos usuários de esteroides: os atletas profissionais que contam com uma equipe completa com nutricionista e médicos; pessoas que buscam orientação com educadores físicos ou atletas experientes e podem ou não frequentar um médico; e os que utilizam sem informação alguma. Na visão dos usuários de anabolizantes, notícias de perda de membros e até mesmo morte quase sempre se relacionam com integrantes do último grupo.

No meio termo entre a falta de informação e o profissionalismo há pessoas como o empresário Cirano Bueno. Ele conta que começou neste mundo usando um remédio para cavalo. "Meu primeiro ciclo eu fiz na doida, com anabolizantes de uso veterinário. Tudo o que você imaginar de efeito colateral deu. Espinha, queda de cabelo, impotência." A namorada da época ficou preocupada, mas a situação foi passageira.

Os problemas não desencorajaram, mas antes de nova tentativa Cirano consultou um nutricionista para mudar a alimentação. O empresário tinha 43% de gordura corporal e queria perder peso. A montagem do segundo ciclo ficou a cargo de um coach, como são chamados os profissionais com experiência em educação física ou musculação que ensinam a usar esteroides.

Cirano disse que 'secou' e bateu 11% de gordura. "Se não funcionasse, ninguém usava", resume. Mesmo assim, ele não toma todos os anabolizantes possíveis. Evita estanozolol por entender que a substância prejudica o coração e ele tem histórico de problemas cardíacos na família.

FÁCIL DE COMPRAR

Encontrar os esteroides não é difícil. Há páginas de internet com telefones para pedidos por WhatsApp, perfis no Facebook e farmácias. Por se tratar de medicamento, é necessário receita médica, mas isto não é um obstáculo. Ocorre que a maioria recorre a vendedores conhecidos, conta Cirano.

Ele explica que estes fornecedores vão até o Paraguai com uma mochila e trazem R$ 1 mil em anabolizantes. O contato pessoal é preferido porque trata-se de um mercado sem regulação e a quantidade de falsificações é grande. "No Brasil hoje ser esperto é ser honesto. Quem é honesto se destaca", diz Cirano.

Um vendedor conversou por Facebook com o Blog do Guilherme Araújo e falou que as características deste mercado paralelo estão mudando. Antes vinha tudo do Paraguai, mas os chineses começam a se inserir. Os preços variam bastante, conforme Cirano. Um ciclo feijão com arroz sai por R$ 300 ao mês, enquanto um atleta de ponta pode gastar R$ 15 mil em quatro meses.

Aprender a aplicar as injeções pode ser resolvido em vídeos no You Tube e outros tantos dão dicas sobre ciclos. Mas os usuários de anabolizantes refutam que seus músculos são apenas resultado de bombas no organismo. Ressaltam que são anos de treinamento e seguindo uma dieta restrita de sete refeições diárias sem gordura ruim ou açúcar. A dobradinha cigarro e álcool é proibida, e balada não combina com desempenho físico.

Sem falar que é preciso fazer muita força para desenvolver os músculos. Sardinha relata sua rotina para mostrar a renúncia e disciplina que um atleta tem. "Ninguém estava comigo agora pouco quando eu tive de fazer uma refeição de batata doce com frango, que eu não gosto. Eu como porque precisa. Ninguém estava lá dividindo a comida magra comigo. Quando eu vou treinar, quando sai a bola dos zóio para fora de tanta intensidade ninguém vai chegar para mim e falar: 'do caralho hein! Você treina muito mesmo com todos os problemas da tua vida'."

MÉDICOS ABOMINAM

A linha de pensamento dos usuários de anabolizantes é refutada pela Medicina, que considera o uso de esteroides para ganhar músculos perigoso. "Corte do efeito (colateral) é história", afirma Roberto Navarro Sousa Nilo, nutrólogo e clínico geral. Ele diz que não existe nível seguro e que as pessoas que utilizam as substâncias podem ter problemas de saúde.

Câncer, problemas cardíacos, insuficiência renal e hepática são algumas das possibilidade diz Dimitri Homar, presidente da Regional-Brasilia da Sociedade Brasileira de Nutrologia. Ele acrescenta que mulheres podem sofrer crescimento de pelos no rosto, aumento de clitóris e engrossamento da voz, este último um dano irreversível. Os homens podem ter aumento das mamas.

O alerta é bem conhecido, mas não significa que seja respeitado. Homar conta que em seu consultório aparecem vários casos de pessoas na faixa dos 30 anos com problemas nos rins e fígado. A situação existe porque não são poucos casos de homens com índice de testosterona em 2 mil quando o máximo é mil. A situação é semelhante com mulheres. Já houve registro de 400 quando o limite é 75. "Não justifica para ganhar massa muscular ou condicionamento físico usar estas substâncias".

O raciocínio de que é possível controlar os efeitos colaterais de anabolizantes é consequência de uma vulgarização de conhecimentos da Medicina por parte de educadores físicos e nutricionistas, opina o nutrólogo e clínico geral Roberto Navarro Sousa Nilo. Ele se refere a pesquisas que começaram nos Estados Unidos na década de 1980 sobre gestão do envelhecimento.

A lógica era fazer reposição hormonal em casos de queda acentuada que prejudicava a qualidade de vida do paciente conforme a idade avançava. Na visão do médico, esta atuação foi exacerbada e frequentadores de academia estariam usando a técnica para ministrar doses além dos níveis normais para a idade.

Ele conta que alguns colegas de profissão usaram este raciocínio para vender a ideia de que existe um nível seguro e que levaria as pessoas a rejuvenescer. "Quando é médico falando eu fico triste, finge que tá ajudando falando que é seguro". Homar conta que também é comum pessoas trazerem produtos de Miami e nos banheiros de academia dizerem que está funcionando e passar para os amigos. Os danos são mensurados somente no consultório médico.

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