O relato da cura funcional de um bebê infectado por HIV nos EUA repercutiu intensamente no meio científico. Porém, mais investigações são necessárias para constatar se os procedimentos adotados neste caso teriam os mesmos resultados em outros bebês. Também é preciso observar o paciente por mais tempo, para saber se o vírus permanecerá inativo durante toda sua vida.
O ineditismo da situação deve-se ao fato de o vírus ter sido detectado no sangue do bebê em exames feitos no 2.º, 7.º, 12.º e 20.º dias de vida, antes de se tornar indetectável, no 29.º dia. O recém-nascido recebeu um coquetel de três drogas antirretrovirais apenas 30 horas após o nascimento. O tratamento continuou até os 18 meses de idade, período em que a carga viral ficou indetectável. Nesse momento, a mãe do bebê interrompeu o tratamento por dez meses, contrariando o protocolo.
Em geral, quando há infecção confirmada, a suspensão do uso do coquetel não é recomendada, mesmo que a carga viral esteja indetectável no sangue.
Quando o acompanhamento médico do bebê americano foi retomado, constatou-se que pequenas quantidades do vírus permaneciam no sangue, porém sem atividade de replicação - estado chamado de cura funcional. Nesses casos, a pessoa deixa de transmitir o vírus, de tão baixa a quantidade do HIV no sangue.
O infectologista Ésper Kallas, professor de Imunologia Clínica da USP, diz que é preciso cuidado ao se falar em cura. "Na cura funcional, o vírus ainda está no corpo. Nesse caso, o organismo da criança conseguiu fazer ele parar de se reproduzir, por algum motivo que ainda não se conhece." Kallas diz que o bebê deve ser acompanhado, pois o vírus poderá voltar a se reproduzir.
Praxe
O protocolo recomenda que o coquetel com três drogas seja administrado somente após a confirmação da infecção pelo HIV. Caso contrário, se utiliza apenas uma droga. "Quando o tratamento com as três drogas foi iniciado, ainda não se sabia se a criança tinha o vírus, o que só foi constatado 48 horas após o parto. A equipe médica não seguiu nenhuma normatização", diz Jorge Senise, do Núcleo Multidisciplinar de Patologias Infecciosas da Gestação da Unifesp. Ele observa que, quando a mãe não é tratada, os riscos de infecção do bebê varia de 25% a 30%.
Para o infectologista Jacyr Pasternak, do Hospital Albert Einstein, não está claro o que aconteceu. "Não dá para dizer que o vírus vai sumir para sempre. Tem muito adulto que a gente acompanha em que o vírus fica indetectável, mas se parar com a medicação, a doença volta", diz.
O médico Ralcyon Teixeira, do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, diz que devem ser feitas outras pesquisas para ver se o mesmo pode acontecer. "Pode ser uma particularidade do tratamento, da criança ou do vírus. Pode ser um vírus mais fraco, por exemplo, ou um sistema imunológico mais forte", afirma.
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