O reino animal classificado, descrito e esmiuçado na tela do computador do zoológico do Rio impressionou o delegado Luiz Torres, em 1996. Mamíferos, répteis, anfíbios ou aves, condições de saúde, localização dentro do zoo e outros detalhes apareciam em uma rica planilha, num tempo em que as artimanhas da informática ainda não estavam tão disseminadas como atualmente. Levado até ali pelo seu mais recente amigo — e responsável pelas planilhas —, o guarda patrimonial Carlos da Cruz Sampaio Júnior, o veterano delegado impressionou-se. Começava ali uma carreira que levaria o entusiasmado funcionário do zoológico ao topo do prédio da Central do Brasil, sede da Secretaria estadual de Segurança Pública.
— Percebia que ele só aparecia na hora do almoço. Ele não tinha dinheiro, e eu o convidava para almoçar — lembrou Torres, num tom quase de orgulho diante dos feitos do antigo amigo.
Em 2002, quando o delegado era diretor operacional da Secretaria de Segurança, convidou Sampaio para ajudar na aplicação da informática à gestão criminal. Recebia R$ 800 de salário.
Até então, era o auge de Sampaio. A euforia foi tanta que, no primeiro dia no cargo, ele dormiu na Secretaria de Segurança. O falso coronel espraiava-se pelo que realmente o seduzia: o combate ao crime.
Contratado como civil em sua primeira passagem pela Secretaria de Segurança, Sampaio começou a criar naquele momento o seu personagem. Ficcionista ardiloso, tratou de esboçar um falso passado. Um dia, ao chegar andando de forma estranha, disse a Torres que o problema na coluna era herança de um acidente "dos tempos de Exército". O enredo minucioso enriqueceria com os anos. Até o coronel Fernando Príncipe, caveira linha-dura do Bope, seria enganado por Sampaio.
Em 2009, comandante do 6 BPM (Tijuca), Príncipe o contratou para criar um programa de computador de gestão criminal. A sugestão veio de um oficial, de cujo nome o coronel não lembra. Mas o caveira apressa-se em afirmar que as atividades do Coronel Caô não ultrapassavam a seara tecnológica:
— Todas as funções policiais eram desempenhadas por oficiais.
Falar sobre a atuação de Sampaio é difícil para outros policiais.
Elogiado nos agradecimentos do livro de Sampaio, o subsecretário de Inteligência Rivaldo Barbosa evita o caso:
— No ano passado, essa história já deu muita dor de cabeça.
Aposentado da Polícia Civil e dos ritos da política oficial, o delegado Torres confirma que Sampaio teve, sim, atuação além da informática.
Sem dificuldade, Torres lembra da vez em que, trabalhando ao seu lado, Sampaio sugeriu que a PM intensificasse o policiamento num trecho da Linha Vermelha. Resultado: a queda nas ocorrências na Ilha do Fundão.
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