O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) retirou sua candidatura para a presidência nesta sexta, dia 13 de junho, e indicou o nome do deputado Marcelo Freixo. Este, sugeriu Luciana Genro, que deverá ser a candidata pelo partido. Mas segundo informações divulgadas na mídia, a renuncia do senador Rodrigues deveria ser mantida em segredo pela direção partidária até a próxima semana, mas após o rompimento desse acordo interno o senador Randolfe Rodrigues divulgou um carta "ao povo brasileiro" na qual justifica sua decisão e faz uma análise de conjuntura.
Veja abaixo a Carta do senador ao povo brasileiro.
O Brasil está dividido. De um lado, forças sociais conservadoras cada vez mais unificadas em torno de personalidades e discursos, empenhadas em fazer retroceder direitos e colocar o Brasil de novo na via expressa do neoliberalismo, com um viés abertamente de direita, sem o verniz social-democrata de antes. De outro lado, as forças sociais progressistas, divididas em diferentes plataformas e organizações, sem uma liderança comum agregadora e sem uma compreensão compartilhada do contexto e das tarefas necessárias para fazer o Brasil avançar, mostram-se frágeis frente ao avanço conservador.
Diante desse choque entre forças antagônicas, o Brasil sofre uma profunda crise de liderança. A sociedade se divide entre a justa indignação pela ampliação de conquistas e uma agenda de demandas de difusas, sem eixo, à procura de uma bandeira que as unifique. Gerente de bom desempenho no governo do presidente Lula, Dilma Rousseff não se mostrou à altura da tarefa de liderar o país em torno de uma proposta de avanços sociais combinados com desenvolvimento econômico, que possibilitasse ganhar corações e mentes da nação brasileira e recuperar a credibilidade do país diante do mundo.
Personagem da vida pública brasileira desde o fim da ditadura, trazido aos holofotes pelas mãos do avô Tancredo, Aécio Neves se tornou herdeiro da pauta conservadora, alijada do poder de mando desde a queda de Fernando Henrique, o que o tornou incapaz de apresentar ao país nada mais do que bravatas oposicionistas e proposições requentadas do passado. É um novo ecoando velhas propostas elitistas, incapazes de responder aos novos dilemas nacionais e de alçar a condição de amálgama nacional que o momento exige. Eduardo Campos e Marina Silva, que despontavam como terceira via numa disputa desde sempre tencionada entre PT e PSDB, frustraram o país, mostrando-se claudicantes em palavras e atos e contraditórios em declarações cada vez mais desencontradas, não dando à população a segurança necessária para serem identificados como uma efetiva quebra na bipolarização entre petistas e tucanos. Não constituem uma unidade, caráter indispensável a uma liderança que possa reunificar o Brasil em crise.
Num contexto de acirrada debate não em torno de ideias, mas em torno de vitupérios e acusações mútuas cumulativas, o país se prepara para uma campanha eleitoral sem líderes e sem ideias. Percebendo o vazio, a nação vai se sentindo órfã e essa orfandade vai aprofundando um sentimento de abandono que dá acolhida ao desespero e com ele, a propostas de corte fascista, como da pena de morte, panaceia direitista para a violência, que se alastra não apenas na falta de políticas públicas voltadas a minimizar o choque de interesses entre ricos e pobres, mas sobretudo na falta de autoridade, que não é dada pelas armas e pelos blindados, mas pela condução moral e intelectual que só uma liderança maiúscula pode oferecer à nação brasileira.
Segundo a pesquisa Data folha de dezembro de 2013, sobre o perfil ideológico do eleitorado brasileiro, 41% se identificaram como sendo de esquerda ou centro-esquerda e 39% se identificaram como sendo de direita ou centro-direita. O que vemos, no entanto, é o avanço eleitoral célere da somatória de candidatos e propostas que tencionam à direita o pêndulo da política nacional, abrindo caminho para o ódio e para a discriminação como instrumentos de luta eleitoral. Um olhar ligeiro nas redes sociais já serve como prova inconteste de que o ódio e a intolerância se tornaram matéria-prima na caça ao voto em 2014.
Por que isso acontece? Porque na ausência de uma liderança que historicamente tenha adquirido envergadura para falar em nome da nação inteira e de uma esquerda incapaz de se renovar para estar à altura da tarefa, os 41% dos brasileiros que se identificam com a esquerda estão desorientados. A leitura incorreta do sentimento das massas e da indignação que explodiu nas jornadas de junho de 2013, levou a esquerda programática a acreditar que estávamos diante de uma "avenida de oportunidades". A revolução estava à porta. A queda vertiginosa da intenção de votos do PT, maior legenda de centro-esquerda do mundo, e a incapacidade de PSOL e PSTU de ultrapassarem o limite dos 2% do eleitorado, demonstram que aquela avaliação não dialogava com a dinâmica real aberta pelas mobilizações. Se é verdade que a indignação levou à rejeição dos modelos tradicionais de política, também é verdade que a ausência de uma direção à altura, abriu espaço a uma pauta conservadora. Vivemos uma clássica crise de direção política.
Minha pré-candidatura estava posta no sentido de construir canais de diálogo que permitissem à esquerda programática servir de polo de atração a setores de centro-esquerda, ampliando o espectro de ação. Buscava, na ausência de uma liderança do porte do ex-presidente Lula na cédula de voto, a edificação de uma nova liderança com base numa plataforma comum construída para além dos muros fortificados dos partidos formais e das teses preconcebidas. Para isso, seria necessário alinhar nossa plataforma ao mundo real. Bandeiras como "não vai ter Copa", por exemplo, que agridem a inteligência nacional e representam a mais desfocada visão da alma brasileira, não poderiam sequer ser pronunciadas por mim, por serem, desde logo, sinônimo de dicotomia com os fatos.
Sem uma política de alianças avançada, sem uma plataforma de esquerda renovadora e sem a amplitude de horizonte necessária, me vi diante ainda da falta de condições materiais para seguir na disputa. Os estados onde o PSOL tem maior peso político – Amapá, Pará, Alagoas, Rio e São Paulo – se recusaram a lançar candidaturas majoritárias competitivas, deixando, numa conjuntura já adversa, minha pré-candidatura sem sustentação local nem nacional para alavancar a conquista de votos. Diante da falta de condições objetivas e subjetivas para fazer a disputa eleitoral, só me resta declinar da pré-candidatura, desejando ao partido e à Luciana Genro, minha companheira de chapa e virtual candidata a presidente, uma boa luta. A saída da disputa como pré-candidato a presidente não me fará sair da disputa de ideias para melhorar o Brasil, construir um polo renovador para a esquerda brasileira e, sobretudo, para a juventude desse país.
Quero mostrar ao povo e aos jovens que somos uma nova esquerda, ética, que defende direitos, benefícios e garantias sociais; que defende a sustentabilidade ambiental combinada com sustentabilidade econômica e social; que se empenha pela igualdade entre raças e gêneros; que quer uma política de segurança que una forças e combata o crime em seu nascedouro; uma esquerda que proponha novas formas de luta social que protejam o trabalhador comum do dano do enfrentamento contra maus governos e maus patrões; que efetive uma reforma urbana que garanta moradia, água, luz, transporte público, educação, saúde e saneamento, mas também garanta cultura e lazer; uma esquerda que lute por uma reforma política que agigante os espaços de participação e preserve a democracia como valor universal.
Quero representar uma nova esquerda que não se intimide em dizer que só a democracia pode universalizar direitos que ainda são restritos a poucos. Saio da pré-campanha presidencial para retomar em plenitude minhas tarefas como senador e a importante função de representante do Amapá, empenhando-me em melhorar cada vez mais as condições de vida do meu povo e a qualidade da política em meu estado. Ao mesmo tempo, assumo como cidadão a campanha permanente por um Brasil cada vez melhor, com ética e propósitos, mostrando que liberdade, igualdade e fraternidade, ideais fundadores da esquerda e da democracia moderna, ainda são bandeiras necessárias e dignas de serem empunhadas.