A prisão do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), líder do governo no Senado, complica a vida da presidente Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores e pode agravar a situação do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Analistas políticos comentaram os riscos que ameaçam os possíveis afetados.
Para Roberto Romano, professor de ética e política da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), a prisão do senador colocou a operação Lava Jato dentro do Palácio do Planalto. "Foi um golpe dos mais duros que o Planalto já recebeu nesse processo. A presidente terá de dar explicações mais sérias e ponderadas do que fez até agora".
Na opinião de David Fleischer, professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília, e de Rui Tavares Maluf, professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo, cresce a chance de um processo de impeachment avançar no Congresso.
Delcídio Amaral foi preso acusado de tentar atrapalhar as investigações da operação Lava Jato. Em gravação obtida pelos investigadores, ele propõe ajuda financeira e um plano de fuga do país ao ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró para que este não fechasse um acordo de delação premiada. O acordo, no entanto, foi fechado.
"Elo procurado"
Nestor Cerveró esteve envolvido na compra, em 2006, da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, que deu um prejuízo de US$ 792 milhões à estatal, e é réu por corrupção na petrolífera. Na ocasião do negócio, Dilma era ministra de Minas e Energia e presidia o Conselho Administrativo da empresa.
Para Fleischer, a compra da refinaria de Pasadena passará a ser o foco da operação Lava Jato, e a delação de Cerveró poderá trazer elementos que relacionem Dilma a malfeitos. "Estão procurando um fato novo contundente para servir de crime de responsabilidade [para aprovar o impeachment de Dilma]. Pasadena pode ser o elo procurado", afirma o professor, um dos autores do livro "De Facção a Partido: A Fundação e Evolução do PSDB, 1987-1998", editado pelo Instituto Teotônio Vilela, vinculado ao PSDB. "Fica difícil enxergar o futuro desse governo", diz Tavares Maluf.
O cientista político Cláudio Couto, professor de gestão pública da FGV-SP (Fundação Getúlio Vargas de São Paulo), discorda dos colegas. Para ele, as prisões recentes são relevantes, chamam a atenção e servem de munição contra o governo, mas não devem agravar a situação do administração Dilma Rousseff. "O que é mais uma flecha para São Sebastião? Para um governo já tão fragilizado, não é essa flecha que vai complicar mais. É um desgaste a mais. Enquanto não se apresenta uma prova categórica não muda a situação da presidente da República".
"Prego no caixão" de partidos
Tavares Maluf e Fleischer também entendem que há um cerco se fechando em torno do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nesta semana, a Lava Jato levou à prisão o empresário José Carlos Bumlai, amigo de Lula. "Acredito que contra ele a situação está ficando mais complicada. Pode escapar de processo e de prisão, mas as consequências políticas [para ele] são duras", avalia o docente da Escola de Sociologia e Política de São Paulo.
"[A prisão de Delcídio] vai baquear mais o PT, que alega que estão tentando destrui-lo. O PT está esperneando e pode perder muito feio nas eleições municipais de 2016 e nas eleições de 2018", declara Fleischer.
"É mais um prego no caixão do PT. Há uma reação, sobretudo da juventude petista, de romper com alianças que garantiram a governabilidade de Lula e Dilma. Essa reação é tardia e equivocada. Estão esquecendo dos que operam dentro do PT", diz Romano. Na opinião do professor da Unicamp, o descrédito em relação ao PT também vale para outras legendas, como o PSDB, o que revela a "falência do sistema partidário".
Eduardo Cunha
Os quatro analistas afirmam que as prisões de Delcídio e de André Esteves, dono do banco BTG Pactual, mostram que a operação Lava Jato poderá voltar a ser dura com políticos e empresários.
Um provável futuro alvo seria o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, outro investigado na Lava Jato e acusado de manter dinheiro em contas no exterior. "Isso pode ser um outro passo que o STF (Supremo Tribunal Federal) pode dar: suspender Cunha da presidência da Câmara", diz Fleischer.
Para Roberto Romano, o foro privilegiado é a grande sustentação da impunidade de políticos. Ainda de acordo com o professor da Unicamp, a prisão de Delcídio mostra que exceções podem acontecer, o que prejudica a situação de Cunha.
Claudio Couto não acredita, porém, que o STF tomará alguma medida contra o presidente da Câmara em breve. "Duvido que aconteça. Seria intervir em outro poder. Não consigo imaginar o Supremo fazendo isso a não ser que Cunha seja flagrado no cometimento de um crime. Precisaria ficar claro que está obstruindo investigação, coagindo pessoas".