O escândalo na Petrobras, que nesta sexta-feira atingiu nova magnitude com a sétima fase da Operação Lava-Jato, incluindo prisões do alto escalão de grandes empreiteiras por suspeitas de corrupção em contratos com a estatal, abre uma oportunidade sem precedentes para importantes reformas no setor privado e no governo, acredita a ONG Transparência Internacional, com sede em Berlim.
Em entrevista à BBC Brasil, o diretor para a América Latina da organização, Alejandro Salas, disse que, no curto prazo, as construtoras envolvidas no caso terão de mostrar ao mercado que "estão limpas", para reduzir o inevitável impacto negativo.
"São grandes empresas, que investem ao redor do mundo, em obras importantes. Seus nomes são conhecidos, é claro que vai haver impacto. O desafio é mostrar para todos que estão limpas o mais rápido possível", diz o mexicano.
A longo prazo, no entanto, Salas acredita que a crise atual, num momento em que o país discute reformas e está prestes a começar um novo mandato presidencial, com um novo Congresso, abre uma grande oportunidade de mudanças.
"Não são coisas que mudam da noite para o dia, mas o setor privado precisa se tornar mais transparente, mais confiável, e o governo deve aproveitar para mostrar que, além do inegável abalo na imagem das empresas e do país, esta crise pode servir para algo positivo, como um impulso para empreender importantes reformas", opina.
Leia os principais trechos da entrevista:
BBC Brasil – Por um lado, a magnitude das investigações da Operação Lava-Jato pode ser vista como um sinal positivo, de que a Justiça brasileira está investigando corruptores e corruptos. Por outro, a gravidade das denúncias abala a confiança no país e em importantes empresas conhecidas em todo o mundo. Qual visão deve predominar para o mercado e a comunidade internacional?
Alejandro Salas – A análise é justamente esta. Há dois ou três anos, ficamos muito animados com as notícias das prisões do caso do Mensalão e novidades como a Ficha Limpa e a Lei de Acesso à Informação. Agora, com este escândalo, normalmente diríamos tratar-se de algo positivo.
Mas a verdade é que isto pode ter um impacto muito negativo para a imagem do Brasil. Muitos terão mais cautela ao fazer negócios no país e mais uma vez a percepção de que trata-se de um país permeado por problemas de corrupção é reforçada para a comunidade internacional. As duas faces da crise surtirão efeitos.
Quanto à uma fuga de investidores, acho exagero. O Brasil é um parceiro muito importante e, embora seja chocante, temos que admitir que notícias de corrupção no Brasil não são novidade. Não creio que haja risco de um impacto gigantesco deste tipo.
BBC Brasil – Que medidas de curto e longo prazo as empresas envolvidas e o governo podem tomar para conter os efeitos negativos e transformar a crise numa oportunidade de promover mais transparência?
Salas – A resposta honesta é que, se há corrupção, você pode escondê-la por algum tempo, mas não para sempre. É difícil tomar a decisão de combater essas práticas, tanto para uma grande empresa quanto para um governo, mas a longo prazo é algo que se revela muito positivo.
Nos próximos dias, as empresas envolvidas terão que limpar a casa e mostrar para o mercado internacional que não são sujas, sob o risco de começarem a perder negócios caso não o façam. Já o setor privado como um todo e diferentes instâncias públicas como o Congresso, o Governo Federal, e os governos estaduais e municipais poderão se empenhar em aprofundar reformas importantes que tornem o país mais transparente, de forma duradoura.
Entre elas, estão aumentar a eficiência das leis e reforçar seu cumprimento, investigar e culpar responsáveis por corrupção, e promover reformas mais intensas e profundas, que tornem o Estado brasileiro muito mais transparente para a população. Não só em Brasília, mas também nos níveis estaduais e municipais. Países federativos precisam combater a corrupção em todas as esferas da administração pública.
BBC Brasil - Como o senhor compara a atuação de empresas brasileiras no exterior e de grandes companhias estrangeiras, de países com bons índices de transparência, mas que sofrem processos de corrupção no Brasil e outros países emergentes?
Salas – É muito interessante perceber esta relação e é algo que nos comprova que o corrupto não é necessariamente o brasileiro, o alemão, o finlandês ou o americano, mas, sim, o sistema de cada um desses países, que é mais ou menos leniente com a corrupção, o que afeta a relação da população com as más práticas.
Anos atrás uma empresa da área médica, com base na Finlândia, um dos países com melhores índices de transparência do mundo, foi processada por ter pago subornos milionários na Costa Rica. A alemã Siemens passou por casos semelhantes no Brasil e em outros países. O Walmart foi processado no México. É percepção de que em casa precisam respeitar a lei, mas em países como Brasil, Quênia, África do Sul, Argentina, podem fazer diferente.
O contrário também acontece. Empresas brasileiras que atuam de forma corrupta em casa, respeitam as leis e agem de forma limpa em mercados como a União Europeia e os Estados Unidos, por medo de multas, sanções e processos. Há corrupção em todo o mundo, mas as empresas agem de formas diferentes em cada país.