Na quarta-feira (29), a enfermeira da Diretoria de Atenção Básica da Secretaria de Saúde (SESAU) de São Sebastião, Aline Cardoso Utescher Intrieri, acompanhada por profissionais da Diretoria de Especialidades e do Hospital de Clínicas de São Sebastião – Costa Sul (HCSS - Costa Sul), deu testemunho da experiência vivida durante a tragédia provocada pelas fortes chuvas, em fevereiro, durante o 11º Simpósio Internacional de Enfermagem do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein. O evento foi no Auditório Moise Safra, no bairro Morumbi, em São Paulo.
Aline conta que participar do simpósio e relembrar os primeiros dias da tragédia foi emocionante. “Chorei muito durante o relato; fomos aplaudidos de pé.”
Ela explica que começou a trabalhar para a Prefeitura de São Sebastião em janeiro, na Unidade de Saúde da Família (USF) de Barra do Sahy, portanto, era recém-admitida quando tudo aconteceu. “Trabalhei durante doze anos no SAMU de Santos e a experiência em urgência e emergência ajudou demais nos atendimentos”, diz.
Aline mora em Bertioga e se desloca a São Sebastião todos os dias para trabalhar. Como a calamidade também atingiu Bertioga, ela ficou temporariamente isolada. “Estava tensa porque minha equipe estava toda atuando e eu não conseguia chegar para ajudar”, conta. “Somente na segunda-feira tive a informação, pela Defesa Civil, de que a estrada de acesso ao morro da Petrobrás, em Bertioga, estava liberada. Fui de carro, juntamente com meu esposo, que também é enfermeiro e atuou como voluntário, até Juquehy, e de lá seguimos de barco à Vila Sahy.”
A enfermeira relatou que o mar estava muito revolto, foram orientados a não embarcar, mas resolveram arriscar. “Fomos com uma mala de insumos, pois não sabíamos a situação que iríamos encontrar. O mar de fato estava agitado e, na arrebentação, fomos lançados alto, caímos sentados no barco e ficamos com dor na lombar durante dias”, conta. “Também nos molhamos com a água do mar já misturada com a lama da enchente e ficamos em contato com essa água por horas.”
Aline explica que trabalhou durante 30 horas seguidas, até conseguirem montar uma escala para atender toda a população. “De imediato fomos ao Instituto Verdescola, mas lá a situação estava controlada, e uma médica nos avisou que tinha muita gente precisando de ajuda na escola Henrique Tavares. Lá estava caótico: tinha quatro médicos voluntários atendendo cerca de 700 pessoas. Eles estavam como turistas na Barra do Sahy e a casa em que estavam desmoronou, aí arrombaram a escola e começaram a prestar os primeiros atendimentos”, diz.
Continuando o testemunho, a enfermeira contou que fizeram uma escala de 12 por 12 horas, a fim de manter os atendimentos durante 24h, e ela, o esposo e a Dra. Luciana ficaram com o período noturno. “Acabávamos fazendo mais que isso, uma média de 18h de plantão e mais um tempo para resolver outras questões, dormindo cerca de uma hora e meia a duas horas por dia na primeira semana. Foi muito exaustivo.”
Na sexta-feira, explicou Aline, chegou o reforço da Marinha e do Hospital Albert Einstein, e na segunda-feira conseguiram retornar à USF do bairro, na tentativa de voltar a atender os pacientes crônicos. “Fizemos um esquema para que os pacientes crônicos alojados não ficassem sem medicação, dávamos a quantidade suficiente para dois dias, assim os víamos sempre, pois o psicológico deles estava muito abalado.”
Aline ficou durante três semanas na Barra do Sahy, voltando para a casa apenas nos finais de semana. Somente na quarta semana conseguiu retomar a rotina em Bertioga, viajando todos os dias. “Ainda estamos diante das consequências do desastre, tentando reerguer a comunidade, a cidade”, conta.
Ela finaliza dizendo que a população não ficou desassistida em nenhum momento e que sua equipe foi incansável. “Tenho funcionários que perderam suas casas e estavam lá trabalhando, guardaram a própria dor ‘no bolso’ e foram trabalhar. Não tinha como eu agir de outra forma, a não ser dar o meu melhor com eles”, diz.
Nenhum comentário:
Postar um comentário