O art. 319 do Código Penal diz que é crime de prevaricação“retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício (...) para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”, e o art. 11, inciso II, da Lei 8.429/92 diz que é improbidade administrativa a “ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente (...) retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício”.
Isso significa que o servidor público que deixa de cumprir suas funções (ato administrativo) sem que haja interferência de terceiros (o que seria corrupção passiva ou concussão), pode estar praticando prevaricação ou improbidade administrativa. Em ambos os casos, apenas um servidor público pode ser o réu. Além disso, é necessário que o servidor soubesse e quisesse retardar ou deixar de praticar sua obrigação (ou seja, é necessário que ele tenha agido dolosamente).
Ambas as leis também falam em ‘retardar’ ou ‘deixar de praticar’. ‘Retardar’ significa postergar, ou seja, é ainda possível fazer algo, mas esse ‘algo’ será feito depois do que deveria ter sido, enquanto ‘deixar de praticar’ significa que se torna impossível fazer aquele ‘algo’. Às vezes – ou quase sempre – é difícil distinguir esses dois tipos de omissões na prática. Por isso a lei inclui os dois.
Quer dizer que prevaricação e improbidade administrativa cobrem a mesma conduta?
Há uma diferença importante entre elas: para que haja prevaricação, o servidor precisar se omitir “para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”, enquanto para haver a improbidade administrativa não é necessário olhar a motivação do servidor: basta que ele se omita.
O interesse do servidor na prevaricação pode ser tanto abstrato quanto concreto. Se ele retarda um alvará para ter tempo de comprar o terreno vizinho e se beneficiar da valorização, esse é um interesse material (patrimonial). Se ele deixa de multar um partido político porque apoia seus candidatos, esse é um interesse abstrato (moral).
A lei também pune se ele deixou de agir por "sentimento pessoal". Se ele deixa de multar a creche porque tem pena das crianças, esse é um sentimento pessoal. Óbvio que, na hora de aplicar a pena, o juiz vai levar a motivação em conta para aplicar uma pena maior nos casos do alvará e do partido político, e uma pena menor no caso da creche, mas o fato de ele se omitir por causa de um sentimento de caridade não faz com que o crime deixe de ser crime (é o mesmo caso da eutanásia).
Se o servidor deixar de fazer algo por interferência de terceiros, ele estará praticando a corrupção passiva (ou, se ele exigiu uma vantagem indevida, será o caso de concussão).
Entre os juristas há um debate se comodismo e preguiça são ‘sentimentos pessoais’. Se o magistrado achar que são, o caso da matéria acima será de prevaricação. Se achar que não são, poderá ser improbidade administrativa.
Mas a vingança também é um sentimento pessoal. No caso de vingança, não há dúvida entre os juristas: é prevaricação.
O art. 319 do Código Penal também diz que é prevaricação pratica um ato de ofício “contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”. Ou seja, a lei proíbe, mas o servidor faz aquilo que é proibido para satisfazer seu interesse ou sentimento pessoal; ou a lei diz que ele deve agir de determina maneira e ele age de outra, pelas mesmas razões. Logo, prevaricação não é apenas se omitir, mas também agir contra a lei.
O Blog do Guilherme Araújo é um canal de jornalismo especializado em politicas publicas e sociais, negócios, turismo e empreendedorismo, educação, cultura. Guilherme Araújo, CEO jornalismo investigativo - (MTB nº 79157/SP), ativista politico, palestrante, consultor de negócios e politicas publicas, mediador de conflitos de médio e alto risco, membro titular da ABI - Associação Brasileira de Imprensa.
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