Uma sensação de déjà vu ronda a reunião anual da Comissão
Internacional Baleeira (CIB), que entra em sua fase final nesta semana
na Cidade do Panamá. Num impasse que já dura mais de uma década, países
tradicionalmente baleeiros continuam pedindo o fim da moratória à caça
do cetáceo; enquanto países conservacionistas tentam mais uma vez
aprovar a criação do Santuário do Atlântico Sul para proteger as baleias
na região entre a América do Sul e a África.
O que causou
estranheza nos participantes, porém, é que o Brasil, historicamente
defensor desta bandeira, neste ano não compareceu às reuniões
preliminares. Entidades ambientalistas questionam se o País estaria
abandonando a liderança da causa. Durante as duas últimas semanas,
ocorreram os encontros do comitê científico e do comitê de conservação.
Neste último, a Argentina, que junto com Brasil e Uruguai é
copatrocinadora da proposta, defendeu a criação do santuário sozinha.
"É
uma vergonha ver a cadeira do Brasil vazia depois de, por tantos anos,
ter construído uma participação de liderança aqui dentro", queixa-se
Truda Palazzo, diretor do escritório brasileiro do Centro de Conservação
Cetácea, que está no Panamá acompanhando a reunião.
Viagem negada
O
Ministério do Meio Ambiente (MMA) relativiza, afirmando que não mandou
ninguém para lá por um "contratempo burocrático", uma "infelicidade". A
técnica do Centro de Mamíferos Aquáticos do Instituto Chico Mendes que
deveria ter ido para o Panamá, ao solicitar o afastamento, não teve a
justificativa aceita por uma "falha do novo sistema".
No lugar
foram dois cientistas brasileiros, financiados pela Secretaria de
Biodiversidade e Florestas, que acompanharam as discussões, subsidiaram o
ministério do que está acontecendo lá e ajudaram na redação das
posições brasileiras, segundo a Assessoria de Assuntos Internacionais do
MMA.
"Neste ano não aconteceu nem mesmo a reunião prévia com as
ONGs que tivemos em outros anos", afirma Márcia Engel, presidente do
Instituto Baleia Jubarte. "Agora é um momento muito importante; a gente
entende que o governo brasileiro deveria estar lá."
Marcus
Henrique Paranaguá, secretário da Divisão do Mar, da Antártida e do
Espaço do Ministério das Relações Exteriores, afirma que, para a
plenária, a delegação brasileira terá quatro integrantes, sendo dois
técnicos do Ministério do Meio Ambiente, sob chefia do embaixador Marcos
Pinta Gama. "Entendo perfeitamente a preocupação das ONGs, que são
legítimas, mas não creio que seja o caso de dizer que o Brasil está
?abandonando o barco?", diz.
Desde 2000, o Brasil, liderando o
chamado Grupo de Buenos Aires, apresenta a proposta de criação do
santuário e defende o uso não letal de baleias. Além de assumir uma
postura conservacionista - após ter permitido a caça em suas águas até
1985 -, o País percebeu que o turismo de observação é um negócio muito
mais rentável e gerador de emprego do que a morte do animal.
Para
ser aprovado, o santuário precisa ter 75% dos votos dos 88 membros da
CIB. Os conservacionistas até têm maioria simples, mas não têm
conseguido superar a barreira criada por Japão, Noruega, Islândia e
Rússia, acusados, inclusive, de comprar votos de países neutros. Na
reunião de 2011, os baleeiros bloquearam a decisão simplesmente saindo
da sala na hora da votação.
Por conta disso, o tema volta neste
ano como o primeiro item substantivo da agenda. É esse o momento
importante a que se refere Márcia. Há uma expectativa, tanto do governo
quanto dos ambientalistas, de que essa manifestação nada democrática dos
países baleeiros no ano passado tenha caído mal e possa ajudar a mudar o
cenário.
Cartas
Segundo Paranaguá, para tentar aumentar a
quantidade de apoio, o Itamaraty disparou circulares telegráficas para
as embaixadas do Brasil em países membros da CIB orientando que os
embaixadores se empenhassem pessoalmente em passar um recado para as
chancelarias dos países: "Esse é um tema da maior importância política
para o Brasil".
Mesmo sem falar em números, ele diz que o apoio é
crescente. "Acho que temos uma chance." A Assessoria de Assuntos
Internacionais do MMA afirma que a proposta tem apoio da África do Sul
(que em outros anos foi copatrocinadora do projeto), da Austrália, de
países latinos e até de países improváveis, como os Estados Unidos. O
posicionamento de outros africanos, porém, é incerto. A União Europeia
decidiu votar em grupo a favor do santuário. E mesmo a Noruega, apesar
de se posicionar contra, teria sinalizado que votaria de acordo com essa
diretriz.
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