A maioria dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), em sessão nesta quarta-feira (7), decidiu a favor de manter Renan Calheiros (PMDB-AL) na presidência do Senado, com a ressalva de que ele fique impedido de substituir Michel Temer como presidente da República. Votaram desta forma seis dos nove ministros que participaram do julgamento, contra três que preferiam a saída imediata de Renan. Todos os votantes concordaram que Renan fica proibido de substituir Temer no caso de viagem do presidente. O presidente do Senado é o segundo na linha sucessória da Presidência da República. O primeiro é o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Votaram para manter Renan no cargo os ministros Celso de Mello, Teori Zavascki, Dias Toffoli, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski e a presidente do tribunal, Cármen Lúcia. Optaram - sem sucesso - pelo afastamento os ministros Marco Aurélio Mello, relator do processo, Edson Fachin e Rosa Weber. Os outros dois ministros do STF - Gilmar Mendes, que está em viagem no exterior, e Luís Roberto Barroso, que se declarou impedido de julgar o caso - não participaram da sessão.
A votação por 6 a 3 referendou em parte a liminar que o ministro Marco Aurélio Mello concedeu na segunda-feira (5), em ação a pedido da Rede Sustentabilidade (leia mais abaixo), sob o argumento de que réus não podem ocupar cargos na linha sucessória da Presidência da República.
Em seu voto, Celso de Mello, que é o ministro com mais tempo de STF foi o primeiro a votar pela permanência de Renan, criticou a decisão do senador de não aceitar o afastamento provisório pedido por Marco Aurélio, mas também disse que "não se justifica o afastamento cautelar" de Renan, o que seria uma "medida extraordinária" com "grande impacto na agenda legislativa" em meio à "gravíssima crise que atinge e assola o nosso país".
Renan é réu por peculato (desvio de dinheiro público), por decisão do próprio STF no último dia 1º. A denúncia da Procuradoria-Geral da República que levou à decisão do STF de torná-lo réu acusa o senador de ter desviado parte de sua verba parlamentar, à que todo senador tem direito para pagar por atividades do mandato, para pagar a pensão alimentícia de uma filha. O desvio teria ocorrido, segundo a denúncia, por meio da simulação do aluguel de carros para o gabinete do senador. Ele nega ter cometido irregularidades.
Crise institucional
A decisão liminar de Marco Aurélio (de pedir o afastamento de Renan da presidência do Senado) foi alvo de surpresa e de severas críticas por parte de políticos e até mesmo de colegas, como o ministro Gilmar Mendes. Renan, seguindo orientação oficial da Mesa Diretora do Senado, desafiou o Supremo ao recusar o recebimento da ordem judicial e ficou à espera de decisão final do Supremo, que saiu nesta tarde.
O ministro Luís Roberto Barroso (que se declarou impedido de votar no caso) disse mais cedo que considerava a decisão de Renan de não se afastar um "crime de desobediência ou golpe de Estado". "Eu não participo desse julgamento por estar impedido e portanto não quero fazer comentário sobre ele. Porém, falando em tese, diante de decisão judicial é possível protestar e apresentar recurso. Mas deixar de cumpri-la é crime de desobediência ou golpe de Estado", afirmou.
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, era favorável ao afastamento e chegou a discursar na sessão desta terça-feira, antes dos votos dos ministros.
Em seu voto nesta tarde, Marco Aurélio disse que não afastar Renan seria um "deboche institucional" e classificou a postura do presidente do Senado em não aceitar uma ordem judicial de "inaceitável, intolerável e grotesca". "Desafiar uma decisão judicial é desafiar as noções fundamentais de um estado democrático de direito", disse.
A presidente do Supremo, Cármen Lúcia, embora tenha votado pela permanência do senador alagoano, também condenou sua atitude. "Dar as costas a um oficial de Justiça é uma forma de dar às costas ao Poder Judiciário", afirmou. Segundo a magistrada, uma ordem judicial pode ser discutida, mas "tem que ser cumprida" para que não prevaleça "o voluntarismo de quem quer que seja". A presidente do Supremo disse ainda que todos estão "subordinados rigorosamente ao que está na Constituição".
MARCO AURÉLIO: RENAN TEVE POSTURA GROTESCA
ENTENDA O CASO
A ação que pedia o afastamento de Renan Calheiros da presidência do Senado, e que foi acatada por liminar provisória pelo ministro Marco Aurélio Mello, foi movida pelo partido Rede Sustentabilidade.
A legenda usou em seu pedido uma decisão do próprio STF, de maio deste ano, que afastou Eduardo Cunha da presidência da Câmara dos Deputados. À época, o então deputado era réu em duas ações penais no Supremo, e a própria Rede solicitou seu afastamento da presidência.
O Supremo acatou, também a pedido da Procuradoria-Geral da República, que acusava Cunha de usar o cargo para atrapalhar investigações contra ele. O fato de Cunha ser réu e estar na linha de substituição do presidente da República foi um dos fatores considerados pelo STF.
Após o Supremo transformar em réu o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), a Rede apresentou um novo pedido para que o STF determinasse também o afastamento dele do cargo.
O Supremo começou a julgar a ação da Rede no dia 3 de novembro, mas a sessão foi suspensa por pedido de vista do ministro Dias Toffoli, quando já havia maioria de seis votos (dos 11 ministros) a favor de impedir réus entre os substitutos do presidente da República. O caso voltou a ganhar força na semana passada, quando Renan Calheiros virou réu no STF por peculato.
A ação contra Eduardo Cunha foi citada por Marco Aurélio Mello no voto desta terça. "Qual é a diferença? Não há qualquer diferença." Ao falar do deputado cassado, o ministro disse que "parece elementar" que o presidente da Câmara deve "cumprir com requisitos mínimos", como não ser réu no STF, para fazer parte da linha sucessória da Presidência da República.
POR QUE RÉUS NÃO PODEM ESTAR NA LINHA DE SUCESSÃO?
O argumento para impedir que réus no Supremo ocupem a presidência da Câmara ou do Senado vem da determinação prevista na Constituição Federal de que, se for aberto um processo penal contra o presidente da República por crimes comuns praticados no exercício do mandato, o presidente fica afastado do cargo por 180 dias.
O dispositivo é semelhante ao do processo de impeachment, onde também há o afastamento do presidente. A diferença é que, no impeachment, o presidente é julgado pelo Senado por acusação de crime de responsabilidade, que são crimes de natureza política e administrativa.
A questão ganhou maior relevância após o impeachment da presidente Dilma Rousseff, consumado em agosto.
Após o vice-presidente Michel Temer ser alçado a titular do cargo, os presidentes da Câmara e do Senado passaram a ser seus substitutos imediatos.
A linha de sucessão do presidente é composta, nessa ordem, pelo vice, pelo presidente da Câmara dos Deputados, pelo presidente do Senado Federal e pelo presidente STF.