Os Bombeiros, a Polícia Militar, a Polícia Civil e os agentes penitenciários do Rio de Janeiro entraram em greve oficialmente às 23h30 desta quinta-feira. A partir da 0h, todos os policiais ficarão aquartelados em seus respectivos batalhões.
Quem estiver de folga também ficará aquartelado, além de inativos e aposentados que, na medida do possível, foram convocados a comparecer nos quartéis. Policiais foram destacados para continuar nas UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), mas o movimento grevista recomenda que trabalhem sem armas.
A orientação do comando de greve é que nenhum PM ou bombeiro saia para ocorrência alguma. A Polícia Civil só atenderá ocorrências emergenciais, como violência grave, furto de veículo e as relativas à Lei Maria da Penha. A Delegacia de Homicídios continuará operando normalmente, segundo o diretor jurídico do Sindipol (Sindicato dos Policiais Civis), Francisco Chao. "Em nenhuma hipótese serão aceitos atos de vandalismo da Polícia Civil", afirmou Chao.
O cabo da Polícia Militar lotado no 22º BPM (Maré) Wellington Machado afirmou que, a partir de agora, "qualquer ocorrência que ocorrer na cidade é de responsabilidade do exército e da Força Nacional de Segurança".
O sargento do 1º GSE (Grupamento de Socorro e Emergência) Paulo Nascimento havia afirmado mais cedo que o governador Sérgio Cabral teria até 23h59 de hoje para aceitar as reivindicações da categoria e evitar uma greve geral das entidades de classe da segurança pública fluminense.
Segundo o sargento do Corpo de Bombeiros, a ideia dos grevistas é a de "evitar o pânico". Por esse motivo, os manifestantes pedem que a população do Rio "evite transitar pelas ruas a partir de amanhã", conforme anunciava uma mensagem de um carro de som próximo ao palanque montado na praça da Cinelândia, no centro do Rio.
"Essa medida é para evitar acidentes ou colisões. A gente não quer criar pânico. Acendemos um pavio e, se tiver explosão, é culpa do governador", disse.
Nascimento afirmou ainda que não tem medo de ser preso, a exemplo do cabo Benevenuto Daciolo --líder do movimento S.O.S Bombeiros que foi preso na noite de ontem após divulgação de uma interceptação telefônica na qual ele supostamente "incita" a greve.
"Nosso movimento não tem uma só liderança. Na verdade, nós somos líderes das nossas famílias, e por elas que estamos lutando. Eu perdi o medo há muito tempo. Desde o dia em que invadiram o quartel central da corporação e nós não desmobilizamos", finalizou.
Assembleia
Cerca de 2.500 manifestantes, entre policiais civis e militares, bombeiros e agentes penitenciários, compareceram na noite desta quinta-feira (9) à praça da Cinelândia, no centro do Rio de Janeiro, para a assembleia conjunta que definiu o início da greve
O momento de maior comoção entre os manifestantes foi quando uma das lideranças anunciou que todo o efetivo do Corpo de Bombeiros e da Polícia Militar foi proibido de deixar os quartéis. Segundo o comandante do Corpo de Bombeiros Militar do Rio, Sérgio Simões, os militares estão em regime de prontidão, e não de "aquartelamento". O comando da PM ainda não se pronunciou sobre o assunto.
Reivindicações
De acordo com o sargento Paulo Nascimento, lotado no 1º GSE (Grupo de Socorro e Emergência), as principais reivindicações unificadas das quatro forças da segurança pública do Rio são: piso salarial de R$ 3.500, auxílio-alimentação na ordem de R$ 350 (e fim dos ranchos nos quartéis), e uma jornada de trabalho de 40 horas semanais.
Os militares aceitam uma carga horária maior do que a reivindicada, desde que o governo do Estado pague hora extra.
O governo já descartou o piso de R$ 3.500 e mandou um projeto de lei sobre o reajuste aos deputados, que o aprovaram nesta quinta-feira. O projeto define que todas as 11 parcelas do aumento previsto para este ano (0,915% mensal) serão aplicadas já neste mês. Até fevereiro de 2013, isto é, em um período de um ano, o somatório do reajuste escalonado será de 39%, e o piso salarial chegará a R$ 2.077 --considerando o adicional do auxílio-moradia (R$ 551,36). Policiais civis e agentes penitenciários não recebem tal benefício.
Após uma reunião emergencial do governador Sérgio Cabral (PMDB) com a chefe de Polícia Civil do Rio, Martha Rocha, e o presidente da Alerj, Paulo Melo (PMDB), na noite de ontem, o governo do Estado fez uma nova proposta: além da antecipação do reajuste escalonado --que foi aprovado em 2010--, os profissionais da segurança pública terão direito a uma nova reposição em 2014.
O aumento previsto para daqui a dois anos levará em consideração a inflação acumulada do IPCA em um espaço temporal de 12 meses (de fevereiro de 2013 a fevereiro de 2014), e corresponderia, segundo o governo estadual, ao dobro da inflação no período.
Além disso, os servidores serão beneficiados a partir de 2014 com um auxílio-transporte no valor de R$ 100 mensais e a garantia de que não mais haverá corte da gratificação da Delegacia Legal em caso de afastamento por acidente de trabalho.
Deputada cobra "direitos iguais"
A deputada estadual Janira Rocha (PSOL), que aparece em gravações telefônicas autorizadas pela Justiça e exibidas pelo "Jornal Nacional" articulando o movimento grevista junto com o cabo do Corpo de Bombeiros Benevenuto Daciolo, uma das lideranças do movimento, cobrou "direitos iguais" ao comentar a prisão de Daciolo, na noite de ontem –realizada após a divulgação das gravações.
"Eu tenho a liberdade de falar, pois vivemos em uma democracia. Nós estávamos discutindo sobre o momento do ponto de vista político. A presidente da República, Dilma Rousseff, fatalmente ligou para o governador Sérgio Cabral para debater sobre o assunto e falar sobre as perspectivas do governo. O mesmo direito que ela tem, eu tenho", argumentou.
Segundo a parlamentar, ela mantém "contatos regulares" com Daciolo desde o movimento grevista do Corpo de Bombeiros iniciado no segundo semestre do ano passado.
"A diferença é eu honro as minhas calças e assumo isso. Não há problema nenhum em discutir política seja com o Daciolo ou qualquer outro integrante do movimento", afirmou.
"Meu marido não é bandido”
A mulher do cabo Benevenuto Daciolo afirmou que o marido está sendo mantido em uma penitenciária de segurança máxima (Bangu 1, na zona oeste), a mesma utilizada para abrigar criminosos de alta periculosidade.
Segundo Cristiane Daciolo, que está na assembleia das categorias, este será o argumento do defensor público do marido na hora de protocolar o pedido de habeas corpus.
"A prisão do Daciolo é totalmente ilegal. Ainda não consegui contato com ele, pois meu marido está isolado em Bangu 1, não nos deram qualquer tipo de acesso a ele, nem para a família nem para o defensor público. Meu marido não é bandido. Estão negando a ele o seu direito de defesa", disse.
Cristiane reclamou que o coronel Sérgio Simões, comandante do Corpo de Bombeiros, não autorizou que ela e a filha visitassem Daciolo quando ele ainda estava detido no quartel central da corporação.
"O Simões não quis nos receber e deixou com que eu e minha filha ficássemos até cinco horas da manhã na porta do quartel, sentadas na calçada", afirmou.
O último contato que Cristiane teve com o marido foi quando ele ainda estava no avião, voltando da Bahia em direção ao Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão. "Ele já sabia que ia ser preso quando desembarcasse e me ligou para avisar”.
Na versão de Cristiane, o cabo líder do movimento grevista só viajou para a Bahia a convite de um juiz militar e da AMB (Associação de Magistrados do Brasil). "Eles queriam que o Daciolo ajudasse e intermediasse e negociação com os policiais militares da Bahia. Acredito que a desocupação da Assembleia Legislativa só foi possível por causa dele", finalizou.