Era 1987, quando Lilia Cabral sentou-se num divã pela primeira vez. A perda da mãe foi o baque que impulsionou a atriz a procurar a análise, mas uma série de conflitos, pessoais e profissionais, já rondavam sua cabeça há tempos...
— Estava em meio a um turbilhão de acontecimentos. Sou filha única e, com a morte dela, me senti realmente sozinha no mundo. Ao mesmo tempo, a carreira custava a engrenar. Já tinha feito meia dúzia de trabalhos na TV e as pessoas ainda estavam começando a me conhecer. Tive que aprender a lidar comigo mesma para sobreviver, e essa luta interna muitas vezes me desestabilizou. Eu era ingênua, não tinha muita experiência de vida. Aprendi na porrada — lembra Lilia, na época com 30 anos.
Eu era ingênua, não tinha muita experiência de vida. Aprendi na porradaLilia Cabral
— Por pura falta de tempo! — garante a atriz, de 54 anos: — Daqui a pouco, volto. Por enquanto, se sinto falta de desabafar, ligo para uma amiga, mas não é a mesma coisa.
Mercedes Cunha Ribeiro, a personagem que Lilia interpretou nas bem-sucedidas versões para o teatro e para o cinema do livro "Divã", se antecipa à atriz e retoma sua análise nesta terça-feira — quando estreia, na Globo, a versão da obra para a TV, em forma de seriado.
— No filme, Mercedes se transforma com a terapia (ela se separa do marido e se relaciona com homens mais jovens) e termina sozinha, mas bem-resolvida. Agora, ela volta às consultas com Lopes (o analista) porque está apaixonada por um homem casado. Chegou a hora de Mercedes ser a amante — adianta Lilia, aos risos.
Novas experiências
Ao longo dos oito episódios previstos, essa mulher tão descolada vai passar por experiências inéditas, como a de viver um amor virtual, reencontrar um amigo de escola, acompanhar o envolvimento do filho adolescente com uma cinquentona e disputar um homem com a amiga. A temática da morte também volta a rondar os maiores pesadelos de Mercedes:
— Ela vê uma mulher, com a mesma idade dela, morrer e se assusta, decide viver a vida ainda mais intensamente.
Com um texto leve e pontuado pelo bom humor, "Divã" pretende desmitificar o processo terapêutico junto ao grande público.
— Muita gente não assistiu ao filme, muito menos gente ainda conferiu a peça. Na TV, vamos falar para um público infinitamente maior e diverso, que ainda pensa que quem se senta no divã tem problemas psiquiátricos graves. Não é isso! Analista é alguém que estudou para ser seu amigo. Ele não é seu cúmplice. Você fala sua história e ele dá o olhar dele, não vai passar a mão na sua cabeça — insiste Lilia.
Com "Divã", Lilia Cabral ganha, oficialmente, sua primeira protagonista na TV. O seriado joga luzes sobre a atriz antes mesmo de a novela "Fina estampa" estrear — a personagem central da trama de Aguinaldo Silva, que vai substituir "Insensato coração" em meados de agosto, já foi prometida a ela.
— Quando você tem seu valor, tudo tem seu tempo — teoriza a atriz, que vem a ser "coroada" justamente no momento em que completa três décadas de trabalhos na telinha:
A verdade é que a televisão pouco reconheceu o meu trabalho no teatroLilia Cabral
Torcida pela mocinha
Os paparicos que vieram a reboque de Mercedes, nas gravações de "Divã", são a grande novidade:
— Escutava toda hora: "E a roupa da Lilia?", "E o sapato da Lilia?", "E o microfone da Lilia?", "Onde está a Lilia?", "A Lilia quer almoçar?", "Já pegou o papel para a Lilia?". Era tanta Lilia, Lilia, Lilia... Gente, eu nunca fui tão falada na vida! Acho até que fiquei mal acostumada!
A atriz garante, no entanto, que nada disso deixa seu ego superinflado:
— Não muda absolutamente nada no meu jeito de ser. Digo mais: trabalhei feito uma camela! São oito episódios, e não há uma cena sequer em que eu não esteja.
Virou moda as pessoas torcerem pela vilã da história. Quero reverter issoLilia Cabral
— Mercedes se despede de Lopes assim: "Vou abrir um outro capítulo, vou conhecer novas personagens, novos cenários, novos ares. Quem sabe nossa temporada no divã não termine aqui? Quem sabe eu volte para contar o final da minha novela? Tô chique à beça! Tô fina estampa!".
O desafio, agora, lhe parece maior:
— Virou moda as pessoas torcerem pela vilã da história. Quero reverter isso, fazer com que o telespectador volte a ter amor pelas heroínas, pela minha heroína Griselda.