As centenas de páginas dos processos da Operação Lava Jato não estavam apenas sob responsabilidade de Teori Zavascki, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) morto na quinta-feira em uma queda de avião em Paraty (RJ). Outros três juízes dividam as tarefas relativas à leitura dos documentos, pesquisas e recolhimento de depoimentos.
Márcio Schiefler Fontes, Paulo Marcos de Farias e Hugo Sinvaldo Silva da Gama Filho foram escolhidos por Teori para os cargos de confiança que ocupam hoje em seu gabinete.
Agora, com a morte do ministro, o trio é considerado peça-chave na transição para o novo relator da Lava Jato por conhecerem muito bem o tema. Nada garante, no entanto, que continuarão na função após a substituição de Teori.
É praxe que novos ministros do STF formem sua própria equipe de juízes auxiliares. Se a mudança acontecer, dizem juristas consultados pela BBC Brasil, isso pode atrasar ainda mais o andamento das ações.
Mesmo que a presidente do STF, Carmen Lúcia, redistribua a relatoria para outro membro da corte - possibilidade prevista por seu regimento em casos urgentes -, o novo relator pode preferir seus próprios assessores.
"É comum ter um período de transição entre as equipes dos gabinetes, mas, em geral, os ministros levam seus juízes de confiança. É difícil que continuem quando houver um novo ministro", diz Eloísa Machado, professora de Direito da FVG-Rio.
De acordo com ela, o trabalho desses magistrados é muito relevante, porque é "humanamente impossível" uma pessoa lidar com tanta informação.
"Eles ajudam com as provas, elaboram resumos, pesquisam a jurisprudência, dão todo o apoio para que o ministro possa tomar uma decisão, inclusive debatendo com ele."
Juízes úteis
No caso específico da Lava Jato, os entrevistados consideram que Fontes, Farias e Gama Filho podem ser muito úteis ao novo relator, já que estão familiarizados com o caso.
Thomaz Pereira, professor da FGV-Rio, diz que, pela complexidade dos processos, é possível que o costume da Corte seja quebrado, e eles permaneçam.
"Podem decidir mantê-los pela capacidade que têm de ajudar. Eles são um instrumento importante, porque, com a perda do ministro Teori, do conhecimento que ele tinha, a transição não fica completa."
O advogado Marcelo Figueiredo, presidente da Associação Brasileira de Constitucionalistas Democratas (ABCD), explica que o novo ministro não é obrigado a aceitar os juízes de Teori, mas avalia não ser recomendável desperdiçar a experiência deles após meses debruçados sobre os documentos.
Caso não fiquem, diz Figueiredo, o novo relator pode pedir que preparem um relatório minucioso de seu trabalho. Se nada disso for feito, a transição, já demorada por causa da nomeação de um novo ministro, pode levar ainda mais tempo.
"Acredito que, nessa circunstâncias, o relator não vai dispensar a experiência de quem estudou e conhece detalhes dos textos. Senão, quem entrar vai levar seis meses para ler tudo."
Braço-direito:
Dos auxiliares de Teori na Lava Jato, o juiz catarinense Márcio Schiefler Fontes é o mais antigo. Ele trabalhava com o ministro desde 2014 e era considerado seu braço-direito.
Antes de ser convidado para o gabinete, era juiz em Santa Catarina e professor de Direito Constitucional e Processual da Escola de Magistratura do Estado.
Apesar de não ter tanta familiaridade com a área criminal, era elogiado por sua atuação nas ações penais da Lava Jato. A BBC Brasil entrou em contato com Fontes, mas ele não quis dar entrevista.
O ministro também era auxiliado por Paulo Marcos de Farias, também de Santa Catarina, o Estado onde Teori nasceu - ele era de Faxinal dos Guedes.
Antes de ser convidado por Teori, Farias comandava a vara do Tribunal do Júri de Florianópolis, considerada em 2014 a mais eficiente do país pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Sua chegada à em maio passado foi algo inédito no Supremo: enquantos outros membros da Corte têm dois magistrados à disposição, Faria tornou-se o terceiro do gabinete de Teori.
Farias disse à BBC Brasil "não estar em condições" de responder se ficará ou não na função. O juiz classificou Teori Zavascki como um "catarinense típico", com um imenso apreço pelo Estado e que sentia-se em casa quando estava lá.
"Seu legado é inestimável e será honrado por aqueles que tiveram o privilégio de aprender com ele."
Gama Filho não foi localizado pela reportagem, mas seus assessores em Goiânia o descreveram como as mesmas palavras usadas para falar de Teori: discreto, sério e muito estudioso.
Apesar do jeito sóbrio, disseram, estava sempre aberto a ouvir as partes e seus auxiliares. "As decisões dele eram bastante justas - não se sentia pesar para um lado ou outro", contou um funcionário da 13ª Vara.
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