Empresário e jornalista de formação, Samuel Seibel, 65 anos, preza por um conceito colocado em xeque com a pandemia. Dono da rede Livraria da Vila, Seibel defende a experiência sensorial da ida à loja, onde o leitor pode folhear livros, ouvir uma boa música e sentar para tomar um café. Em 2019, a rede aderiu de vez ao mundo virtual, colocando no ar sua loja e-commerce. A atualização da empresa foi providencial: com o fechamento do comércio em 2020, seguido de protocolos com horários restritos, a Livraria da Vila conseguiu manter no on line parte de suas vendas. E em um cenário de crise econômica, ainda provou solidez, abrindo novas lojas.
A Receita Federal afirmou em documento que livros são adquiridos por quem ganha mais de dez salários, um argumento para levar adiante o plano de retirar a isenção de tributos sobre o produto. Qual sua opinião? A Receita está se baseando em dados técnicos, porém, demonstra uma visão distorcida sobre o assunto. Quem frequenta feiras e festas literárias, especialmente em comunidades de baixa renda, percebe o interesse e a importância da formação de leitores e futuros escritores em todas as classes. Não corresponde à realidade dizer que pessoas de baixa renda não leem. Porém, o poder aquisitivo dessas pessoas faz com que elas comprem menos livros do que gostariam. Ao aumentar o preço médio do livro, vamos alimentar ainda mais a desigualdade do país. A educação, os livros, aliás, são necessários na luta contra a desigualdade.
O deputado Rodrigo Maia argumenta que o valor arrecadado com a tributação ajudaria a incentivar projetos de leitura para os mais pobres. Concorda? Não faz sentido pensar que um produto que vai ficar mais caro vai continuar vendendo o mesmo. Com certeza, o livro vai vender menos. Vendendo menos, a arrecadação não vai ser grande. Na balança, não vai surtir esse efeito. Sem dizer que me preocupa promessas culturais no Brasil, raramente levadas adiante. Nosso setor está em crise, está combalido, e um preço competitivo ajuda. Há países que, durante a pandemia, consideraram livrarias como essenciais, como farmácia e supermercados. Livros são um remédio para a alma.
A Livraria da Vila conseguiu se manter sem fechar lojas ou demitir funcionários. Ainda abriu três novas lojas no fim do ano passado. Como superaram a crise para chegar nesse ponto de expansão? Essas novas lojas são parte de um planejamento antigo. Nos ajudou o fato de ter lançado em 2019 um e-commerce com maior presença nas redes. Nos adequamos ao jeito de trabalhar que se tornaria imperativo na pandemia. Claro que o faturamento das lojas físicas caiu muito, mas conseguimos vender com esquemas como drive thru, encomendas via WhatsApp e lives. Hoje alcançamos um patamar de faturamento em torno dos 70% em comparação ao ano de 2019, nossa última referência de normalidade.
As lojas físicas são parte do DNA da empresa. Acha que esse modelo vai sobreviver? Sim, é o que acreditamos. A situação que estamos vivendo vai passar. Será superada. As pessoas vão reassumir hábitos corriqueiros. É parte da natureza humana sair, se encontrar, ir no cinema, teatro, restaurante, livrarias. Esperamos esse retorno ao tal do velho normal.