Ele tem 81 anos. Ela, 55. Casados há 17 anos, Aníbal Estevam e Iara Regina Estevam recebem pensão dos filhos e não precisariam vender bombons nos bares de Campo Grande, aos finais de semana, até de madrugada, se não fosse o desejo latente de ajudar a livrar pessoas do vício das drogas.
Aníbal se dedica à recuperação de dependentes químicos desde 1978, quando deu início ao projeto chamado Desafio Jovem. Junto com outros voluntários, ele oferecia os serviços de prevenção, internação, tratamento e ressocialização. Em 1981, por falta de recursos, o Desafio Jovem fechou e deu lugar ao Centro de Recuperação Esperança, que em 2014 passou a se chamar Instituto do Desenvolvimento Humano Pastor Aníbal Estevam.
Funcionando com recursos próprios, desde 2013 a instituição não oferece internação a usuários de drogas. Diante da crise financeira, apenas projetos socais, prevenção, triagem, acolhimento e encaminhamento para tratamento funciona no espaço, instalado na Rua Romeu Alves Camargo, número 73, Bairro Tiradentes, em Campo Grande.
A dificuldade econômica fez com que a administração do Instituto passasse para as mãos do pastor Adonias Souza Junior, presidente da Associação das Igrejas Batistas. Todavia, a direção continua sob o comando de Aníbal e Iara. Aos poucos, a nova administração surte efeito, já que o setor de internação passa por reforma para voltar a operar em breve.
O projeto conta com assistente social e psicólogo, ambos voluntários. Já a Igreja Batista ajuda com cestas básicas. “O trabalho é singelo, mas vai ampliar”, garantiu Iara, explicando que acolhe moradores de rua e os mantém longe das drogas. Hoje, tudo é custeado com dinheiro que o casal consegue vendendo bombons e amendoins nos bares da região central, nas noites e madrugadas dos feriados e finais de semana.
BOMBONS
Iara explica que a fabricação dos bombons vendidos na noite campo-grandense tem fabricação caseira. “Eu e meu marido compramos o material, fabricamos os bombons e vendemos nas ruas para manter as contas de água e luz do espaço, e a alimentação das pessoas que a gente ajuda. Vamos todos os finais de semana em barzinhos. Tem dia que a venda é boa e tem dia que não, depende do dia do mês e do clima”, explicou.
Os dois saem de casa às 21h e só retornam por volta de 2h do dia seguinte. Com relação aos bombons, Iara não perde a chance de fazer propaganda, a alma do negócio: “são feitos com material da melhor qualidade, comprados por mim e meu esposo”.
Sobre o lucro das vendas, ela admite: “a instituição precisa de investimento de no mínimo R$ 500 mil e isso nós não conseguimos vendendo bombom”, lamentou.
SOLIDARIEDADE
Iara explicou que tanto seu filho quanto os filhos de Aníbal estão bem encaminhados na vida, uns são médicos, outro advogado. “Agora, somos só nós dois e o mínimo que a gente pode fazer é alguma coisa em prol do próximo. Se não fizermos, nos sentiremos inútil. Queremos dar esperança de as pessoas viverem, de chegarem na nossa idade, de ter filhos, serem avós e terem essa graça”.
São anos de dedicação a recuperação de dependentes químicos. Aníbal, por exemplo, abriu um centro de recuperação em 1988, na Bolívia. A Arca de Noé, que funciona até hoje e lhe rendeu uma bela homenagem em 2010, é dirigido por uma pessoa se que livrou das drogas em Campo Grande, com ajuda de Aníbal.
FÉ
“O ser humano nasceu para desenvolver algo em prol dos demais e esse é o sentido da vida. Exatamente o que aconteceu comigo, que recebi o chamado de Deus para fazer esse trabalho. Não faço nada achando que é bonito ou para fazer nome. Eu faço porque as almas que estão no vício precisam receber ajuda de alguém e esse alguém, para ajudar, tem que receber o chamado de Deus porque não é um trabalho terapêutico ou médico, é espiritual”, explicou Aníbal.
Ele disse ainda que quando vende os bombons têm liberdade para orientar as pessoas que querem ouvir alguma coisa sobre sua experiência de 81 anos. “Eu conto aquilo que a gente já fez e oriento essas pessoas. Ainda tenho um trabalho para realizar quando o centro estiver em condições, devido a grande necessidade daqueles que têm problemas com droga. Tenho uma visão muito grande, de um trabalho maior, que ninguém faz”, revelou.
Aníbal contou que recentemente recebeu a visita de uma mulher casada, que lhe apresentou o marido, o abraçou, beijou e agradeceu. Ela foi recuperada em 1982. A garota rippie e outras duas colegas foram encaminhadas por um juiz para tratamento porque quase morreram em uma noite de uso excessivo de cocaína.
“Recebemos muitas cartas de recuperados e tenho essa felicidade de ouvir as pessoas falando daquilo que aconteceu, esse é o nosso prazer. Não olhamos a situação financeira, que é difícil e não queremos receber confetes, mas fazer alguma coisa em prol de quem está sofrendo. É do interesse de Deus que todos sejam felizes e eu sou muito feliz assim”, garantiu Aníbal.
AJUDA
O projeto comandado por Aníbal e Iara, à época em que recebia recurso suficiente para se manter, atendia em média 300 dependentes por mês, em regime de internato. Hoje, a falta de dinheiro limitou o atendimento mensal a cerca de 30 pessoas.
Interessados em contribuir com o trabalho do casal pode entrar em contato com os dois meio do telefone ou na Associação das Igrejas Batistas no número .