GACC - Grupo de Assistência à Criança com Câncer

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Desde o início de suas atividades, em 1996, o GACC - então Grupo de Apoio à Criança com Câncer - existe para aumentar a expectativa de vida e garantir a oferta e a qualidade global do tratamento oferecido integral e indistintamente a crianças e jovens com câncer, diagnosticados com idades entre 0 e 19 anos incompletos, independente de sexo, cor, religião ou posição socioeconômica.

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Artigo 100 da Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições) e os cabos eleitorais

Excelentíssimo Presidente do Diretório do Partido da República (PR) do Município de Bauru – Senhor José Fernando Casquel Monti, apresenta consulta e solicita elaboração de parecer jurídico a respeito da aplicabilidade e constitucionalidade do artigo 100 da Lei nº 9.504/97, denominada Lei das Eleições, em decorrência da necessidade de contratação de “cabos eleitorais” para o pleito de 2014 (Presidente da República, Senador, Deputado Federal, Governador de Estado e Deputado Estadual).
Informa o consulente que filiados ao Partido da República (PR) de Bauru, candidatos a deputado federal e estadual, precisam contratar diversos colaboradores – cabos eleitorais – para ajudá-los na divulgação da campanha eleitoral, por período determinado e com remuneração fixa, e vêm buscando orientação no sentido de saber se estas contratações geram vínculo trabalhista.
Assim, faz o senhor Presidente do Diretório do Partido da República (PR) em Bauru as seguintes indagações:
a) O artigo 100 da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97) é constitucional?
b) A Justiça do Trabalho é competente para dirimir controvérsia sobre a contratação de cabos eleitorais?
Passo ao respectivo parecer jurídico.

PARECER JURÍDICO

Excelentíssimo Senhor Presidente,
1. Submeto à consideração parecer jurídico decorrente de consulta para analisar a constitucionalidade do artigo 100 da Lei nº 9.504/97 – denominada Lei das Eleições – bem como a respeito da competência da Justiça do Trabalho para analisar casos de contratação de cabos eleitorais que promovem a campanha de candidatos através da distribuição de santinhos, agito de bandeiras, atendimento em comitês, produção de programa eleitoral, dentre outros serviços de divulgação da propaganda eleitoral.
2. Importante mencionar de antemão que a criação e desenvolvimento da Justiça Eleitoral em nosso país, data dos idos de 1932, fruto da revolução de 30 e das práticas da República Velha, como voto de cabresto, currais eleitorais de coronéis e seus jagunços, atores estes que compunham o cenário contra o qual se pretendia por um fim.
3. A Justiça Eleitoral é um ramo especializado da Justiça Federal, recriada na redemocratização que culminou com a promulgação da Constituição Federal de 18 de setembro de 1946 – artigos 109 a 121[1] – tendo sido reafirmada na Constituição Federal de 1988[2].
4. Fato é que em julho de 1965 foi promulgado e sancionado o Código Eleitoral[3] que vige até os dias atuais[4], tendo como atribuição precípua a reorganização das eleições em razão das novas necessidades da ordem vigente e que completa agora no ano de 2014, 49 (quarenta e nove) anos de existência, mas que é omisso ao disciplinar alguns aspectos das eleições (como por exemplo, propaganda na TV, debates eleitorais, arrecadação e gastos de recursos, prestação de contas, etc.), razão pela qual era necessária a edição de leis infraconstitucionais de eficácia limitada a cada eleição que era realizada no Brasil.
5.  Conforme dito por Péricles Prade em prefácio à obra de Pedro Roberto Decomain, ELEIÇÕES (Comentários à Lei nº 9.504/97)[5]:
..., antes da edição do atual texto, as eleições pretéritas e sucessivas exigiam, no período das eleições, lei nova para discipliná-las, com eficácia limitada e congelada ao seu término, não obstante a vigência contemporânea do Código Eleitoral, sofrendo este, com frequência, modificações tópicas nem sempre pertinentes e provocadas pela singularidade das situações de feição casuística, fruto de momento político.
6. Como exemplo destas normas de eficácia limitada que serviam apenas para eleições às quais se referiam, podemos citar a Lei nº 7.332/85, que regulou as eleições de 1985, Lei nº 7.493/86, que regulamentou as eleições de 1986 e que por seu intermédio elegeram-se os Deputados e Senadores da Assembleia Nacional Constituinte, Lei nº 7.664/88 promulgada para as eleições de 1988, Lei nº 8.214/91 para as eleições de 1992, Lei nº 8.713/93 para as eleições gerais de 1994 e, por fim, Lei nº 9.100/95 para as eleições de 1996.
7. Rompendo com este paradigma de edição sazonal de leis eleitorais, em 30 de setembro de 1997, o Vice-Presidente da República, em exercício do cargo de Presidente da República MARCO ANTÔNIO DE OLIVEIRA MACIEL, sanciona a Lei nº 9.504/97 que estabelece normas para as eleições.
8. Referida lei é considerada o marco regulatório das eleições, pois disciplina todas as eleições que ocorrem no país – em âmbito federal, estadual e municipal – de forma ampla e sem prazo de vigência, estando em vigor até os dias atuais, com duas recentes reformas pontuais, denominadas “minirreformas eleitorais” (Lei nº 12.034/2009 e Lei nº 12.891/2013) que a alterou somente em alguns aspectos, gerando certa segurança jurídica no sistema eleitoral vigente, tendo em vista que se sabe, de antemão, as regras básicas de todo o processo eleitoral, o que é importante para futuros candidatos e operadores do direito.
9.  Entretanto, há que se afirmar que, sem romper com a prática tradicionalista de regulação a cada eleição, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é costumeiro em expedir resoluções e instruções com objetivo de regulamentar determinadas questões temas a cada pleito que se realizada no país, nos termos do que preconiza o artigo 23, IX do Código Eleitoral[6] e artigo 105 da Lei das Eleições[7].
10. Assim, é que a cada eleição os operadores do direito que atuam nesta seara devem ficar atentos para as normas infraconstitucionais que regulam a arrecadação de recursos, as propagandas eleitorais e as prestações de contas, dentre outros assuntos, sendo que no que se refere à contratação de pessoas para divulgação do candidato e atendimento em comitês, os chamados “cabos eleitorais”, a regra é a observância do artigo 100 da Lei das Eleições, que prescreve:
A contratação de pessoal para prestação de serviços nas campanhas eleitorais não gera vínculo empregatício com o candidato ou partido contratantes – grifo nosso.
11. Mesmo com a disposição legal acima, que é muito clara ao afirmar a ausência de vínculo empregatício, é fato que com o fim do processo eleitoral alguns contratados que auxiliam nas campanhas busquem direitos trabalhistas decorrentes desta contratação esporádica e limitada no tempo, razão pela qual existe a necessidade de se verificar a constitucionalidade da norma, não havendo até a presente data manifestação do Supremo Tribunal Federal (STF) acerca da constitucionalidade ou da inconstitucionalidade do texto legal, razão pela qual deve ser observada.
12. Isto porque  compete precipuamente ao Supremo Tribunal Federal, órgão de cúpula do Poder Judiciário, a guarda da Constituição Federal, conforme definido no artigo 102, em julgamentos de ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, bem como a arguição de descumprimento de preceito fundamental decorrente da própria Constituição – temas estes de competência originária.
13. Em grau de recurso, sobressaem-se as atribuições de julgar, em recurso ordinário, o habeas corpus, o mandado de segurança, o habeas data e o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão, e, em recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida contrariar dispositivo da Constituição.
14. Como dito, até a presente data, não há nenhum questionamento do disposto no artigo 100 da Lei das Eleições junto ao STF, razão pela qual é perfeitamente aplicável aos casos concretos, sendo norma constitucional, conforme se verifica de alguns julgados abaixo transcritos.
“Vínculo de emprego. Inexistência. Serviços voltados para campanha eleitoral. Artigo 100 da Lei n. 9.504/97. Não só aqueles que se ativam nas ruas, entregando 'santinhos' de candidatos ou empunhando bandeiras, estão abrangidos pelo artigo 100 da Lei n. 9.504/97. Para uma campanha eleitoral, necessário que o candidato ou partido tenha toda uma estrutura de pessoal, que vai do coordenador, passando pelo motorista da carreata, chegando-se ao faxineiro que limpa o comitê, ou seja, toda uma gama de pessoas, exercendo as mais diversas atividades, dando o suporte logístico e técnico, todas voltadas para o fim comum, qual seja, a eleição do candidato, pouco importando se tal ou qual pessoa é ou não 'simpatizante', 'militante' ou 'cabo eleitoral'. A lei não ressalva qualquer tipo de trabalho. Basta que a atividade se dê em prol e enquanto durar a campanha eleitoral, para que se ajuste à exceção legal" (TRT – 2ª R. – 1ª T. – RO n. 20000365585 – Rel. Maria Inês Moura Santos Alves da Cunha – j. 28.5.2001 – DOE 19.6.2001).
“Vínculo de emprego. Lei n. 9504/97. A Lei n. 9504/97 não deixa dúvidas de que, se a contratação de serviços de pessoal se der entre o candidato ou o partido político, para realização de serviços relativos à campanha eleitoral, não gerará vínculo de emprego (art. 100)” (TRT – 3ª R. – 5ª T. – RO n. 22146/98 – Rel. Levi Fernandes Pinto – DJMG 21.8.99 – p. 17).
“Vínculo de emprego. Labor em período de campanha eleitoral. Impossível o reconhecimento de vínculo de emprego entre contratado para labor em campanha eleitoral e seus contratantes (candidato ou partido político). Aplicação do art. 100 da Lei n. 9.504/97. Provimento negado” (TRT – 4ª R. – 2ª T. – RO n. 01540.411/98-2 – Rel. Jane Alice de Azevedo Machado – j. 15.5.2001 – DJ 4.6.2001).
“Campanha eleitoral. Prestação de serviços. Vínculo de emprego inexistência. Óbice legal para o reconhecimento. Prestação de serviços voltada para a execução de atividades político-partidárias que não configura a relação de emprego. Atuação de pessoal em campanhas eleitorais, para candidatos ou partidos, que, por expressa vedação legal, não caracteriza vínculo de emprego. Eventualidade que se evidencia. Consideração da matéria de direito que sobrepuja a confissão quanto a matéria de fato, tendo em vista a natureza do serviço prestado e os objetivos propostos. Provimento negado” (TRT – 4ª R – 3ª T. – RO n. 01529.411/98-0 – Rel. Pedro Luiz Serafini – j. 28.3.2001 – DJ 23.4.2001).
15. Desde antes da entrada em vigor da Lei nº 9.504/97, a jurisprudência pátria vacilava sobre o reconhecimento do vínculo empregatício dos cabos eleitorais, entendendo aqueles que se filiam à aplicação do artigo 100, que o candidato não se enquadra no conceito de empregador, bem como em decorrência da ausência de atividade econômica[8] por parte dos candidatos e comitês.
16. Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante, em artigo publicado pela Academia Paranaense de Estudos Jurídicos e doado ao acervo do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região[9], em 03.12.2010, ainda que se filie à inconstitucionalidade do artigo 100 da Lei das Eleições, assim ponderou.
No caso dos trabalhadores contratados exclusivamente para exercer atividades ligadas à campanha eleitoral, entende João Augusto da Palma ser uma situação típica de contrato de trabalho impossível, não havendo como termos o reconhecimento de vínculo empregatício com o candidato ou partido político, pois “ainda que possam estar presentes as características definidas no artigo 3º da CLT, como pessoalidade, continuidade, onerosidade e subordinação, a lei impede o reconhecimento do vínculo empregatício, não sendo o trabalhador credor de qualquer direito próprio do empregado, ainda que sua relação de fato com este coincida”.
Continua João Augusto: Neste caso, poderá ser uma simples relação de trabalho eventual, que é a menos onerosa para o tomador dos serviços, porque não existem direitos resultantes da prestação de serviços não prolongada, não repetida ou simplesmente esporádica.
Admite-se que possa ser uma locação de serviços, nos moldes dos artigos 1.216 a 1.236 do Código Civil Brasileiro, porque toda a espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode ser contratada mediante retribuição (artigo 1.216 do CCB).
A relação, em razão do contrato impossível, poderá, ainda, adquirir a característica de uma empreitada, com base nas disposições dos artigos 1.237 a 1.247 do Código Civil vigente.
Em qualquer dessas hipóteses, ao trabalhador será pago o que for tratado pelas partes, seja quanto ao valor, ocasião do pagamento, local de pagamento, forma de calcular as quantias de cada título combinado.
17. De acordo com o artigo 2º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço, sendo que, nos termos do § 1º equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.
18. Definindo o que é empregado, o artigo 3º da CLT assim preleciona:
Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
19. Assim, nos termos da definição legal da legislação trabalhista, não há que se considerar empregado os cabos eleitorais que prestam serviços eventuais, esporádicos e por tempo determinado às campanhas eleitorais de candidatos, pois estes não estão enquadrados no artigo 2º da CLT, além do serviço eleitoral não gerar atividade econômica.
20. Neste sentido vem decidindo, em corrente majoritária e praticamente pacífica o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região[10] (TRT/15), filiando-se pela constitucionalidade do artigo 100 da Lei das Eleições, conforme se verifica pelos julgados abaixo.
VÍNCULO EMPREGATÍCIO - TRABALHO VOLUNTÁRIO EM CAMPANHA ELEITORAL. O trabalho em campanha eleitoral não gera vínculo empregatício com o candidato ou partido, nos exatos termos do art. 100, da Lei 9.504/97. Trata-se de restabelecimento, por lei especial, de disciplina de relação de trabalho subordinado, do velho regime de locação de serviço, estranho à normatização da relação de emprego. Recurso não provido. PROCESSO TRT 15ª REGIÃO Nº 00445-2005-023-15-00-4 – RECURSO ORDINÁRIO - RITO SUMARÍSSIMO – 1ª VT DE JACAREÍ – RECORRENTE: SILVANA APARECIDA DA SILVA – RECORRIDO: JOSE ANTERO DE PAIVA GRILO.
4ª CÂMARA (SEGUNDA TURMA) – 0002285-38.2010.5.15.0077 RO - Recurso Ordinário – VARA DO TRABALHO DE INDAIATUBA – Recorrente: Suzette Tavares Souza Bicudo – Recorrido: Agostinho Andrade Junior – Recorrido: Município de Indaiatuba
Destaque-se, por oportuno, que o art. 100 da Lei 9.504/97 é compatível com o texto constitucional. Adoto como razão de decidir o seguinte acórdão da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, cuja ementa segue transcrita:
INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 100 DA LEI Nº 9.504/97. INEXISTÊNCIA.
A República Federativa do Brasil se funda, dentre outros, nos valores sociais do trabalho (primeira parte do inciso IV do art. 1º). É o trabalho um dos direitos sociais elencados pelo art. 6º da Carta Magna, sendo, ainda, a sua valorização um dos princípios fundantes da ordem econômica e financeira (art. 170, da CF). Note-se que a Constituição Federal refere-se a trabalho e não a relação de emprego, mesmo porque este é espécie do gênero relação de trabalho. À Constituição Federal não coube a definição da relação de emprego, contrato de trabalho e tampouco dos requisitos para a caracterização de empregado e empregador. Coube à CLT tal mister, requerendo, para tanto, o preenchimento dos requisitos específicos previstos em seus arts. 2º e 3º. Todavia os conceitos adotados pela CLT não abrangem todas as relações de trabalho, mas apenas aquelas que se enquadram nos requisitos por ela traçados - conceituados como relações de emprego. Nesse espeque, não há que se falar na inconstitucionalidade do art. 100 da Lei nº 9.504/97, tendo em vista que esta lei ordinária apenas distingue uma relação de trabalho, excluindo-a do rol das relações empregatícias. Ademais, a inconstitucionalidade de uma espécie normativa apenas se dá mediante a incompatibilidade com preceitos constitucionais e não em relação à legislação infraconstitucional, o que não ocorre “in casu”. Não vislumbro, pois, mácula substancial capaz de tornar inconstitucional o art. 100 da lei em comento, por se tratar de relação de trabalho com requisitos próprios.
(Processo nº 0124300-78.2003.5.15.0004, Relator Designado. Des. LUÍS CARLOS CÂNDIDO MARTINS SOTERO DA SILVA, publicado em 26/10/2004, DEJT).
Cabo eleitoral. Vínculo Empregatício. Inexistência. Demonstrado que as atividades desenvolvidas pelo autor foram aquelas correspondentes a serviços prestados no período da campanha eleitoral, não há se falar em vínculo de emprego por inferir que a finalidade da prestação de serviços era unicamente eleitoral e que o trabalho do reclamante se desenvolveu tão somente em função da campanha. Aplicação do artigo 100, da Lei Eleitoral n.º 9.504/97 (Recurso Ordinário 0124800-68.2009.5.15.0026 – 3º Turma – 5º Câmara).
21. Importante mencionar aqui que, nos julgamentos de segundo grau, caso se entenda pela inconstitucionalidade do artigo 100 da Lei das Eleições, reconhecendo o vínculo empregatício entre candidato e cabo eleitoral, deve-se, obrigatoriamente, respeitar a cláusula de reserva de plenário, insculpida no artigo 97 da Constituição Federal[11] e da Súmula Vinculante nº 10 do Supremo Tribunal Federal[12], que impõe o julgamento do caso pela maioria absoluta de seus membros ou dos membros do órgão especial, pena de nulidade da decisão.
22. Ainda que o Poder Judiciário incline-se pela constitucionalidade do artigo 100 da Lei das Eleições, doutrinadores insistem na tese de que a aplicação deste dispositivo é inconstitucional por violar o direito da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III da CF) e da igualdade de todos perante a lei (artigo 5º, “caput” da CF).
23.  Neste sentido, novamente Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante, em artigo informado no item 16 deste parecer:
Além de ser inaplicável no âmbito do Direito do Trabalho, o artigo 100, da Lei n. 9.504/97é inconstitucional, por violação expressa ao princípio da igualdade (art. 5º, caput, CF).
O princípio da igualdade tem razão de ser na seguinte premissa: dar tratamento isonômico às partes significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de sua desigualdade.
O princípio da igualdade deve ser visto sob dois prismas: como vedação ao legislador de editar normas que tratam situações iguais de forma desigual e como interdição ao juiz de aplicar a lei de forma desigual para situações iguais.
Patente, assim, a inconstitucionalidade do artigo 100, Lei n. 9.504/97, pois não poderia o legislador impor distinções às situações fáticas idênticas, de maneira a garantir apenas a alguns direitos trabalhistas e a outros não.
24.  Fernando Gubnitsky, em artigo publicado na Escola Superior da Advocacia em 07.11.2013, “O trabalho sem vínculo empregatício em campanhas eleitorais e a dignidade da pessoa humana”, com o objetivo de “mostrar que o trabalho sem vínculo empregatício em campanhas eleitorais, nos termos do art. 100 da Lei n° 9.504/97 tem seus limites determinados pelo art. 3° da CLT, pelos arts. 6° e 7° da Constituição Federal, bem como pelo princípio da dignidade da pessoa humana[13]”.
25.Para aqueles que se filiam à tese da inconstitucionalidade da norma, haveria incidência também do artigo 7º da Constituição Federal, que garante direitos iguais para os trabalhadores urbanos e rurais, sendo que, salvo melhor juízo, esta norma se aplica aos trabalhadores empregados e não de forma indiscriminada e geral a todos os prestadores de serviços, já que é permitida a regulação de trabalhos especiais sem qualquer vício de ilegalidade.
26.  Como exemplo de serviços especiais podemos citar o trabalho do portuário (Lei nº 8.630/93)trabalho voluntário (Lei nº 9.608/98) ou mesmo de estagiário (Lei nº 11.780/08), não havendo motivo para que o trabalho dos “cabos eleitorais” não possa ser regulamentado através de lei específica, tendo em vista coordenação de trabalhos com ausência de subordinação hierárquica, lembrando ainda que o Código Civil prevê vários tipos de trabalhadores que não têm vinculo empregatício reconhecido (autônomos, mandatários, empreiteiros, etc.).
27. Desta forma, em que pese alguns seguimentos doutrina afirmar a necessidade de atendimento do princípio da igualdade na questão ora em debate, é fato que até mesmo o Tribunal Superior do Trabalho (TST), que tem competência para conhecer das decisões proferidas em violação às disposições da Constituição Federal, ao julgar casos debatidos em sede de recurso de revista[14], vem decidindo pela constitucionalidade do artigo 100 da Lei nº 9.504/97.
28. Neste sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. VÍNCULO DE EMPREGO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO EM CAMPANHA ELEITORAL. A Corte Regional consignou que o reclamante prestou serviços em campanha eleitoral do reclamado, o que não gera vínculo de emprego, a teor do art. 100 da Lei 9504/97. Para se chegar a conclusão diversa, necessário o revolvimento de fatos e provas, procedimento defeso nesta esfera recursal, consoante Súmula 126 do TST, a inviabilizar a aferição de afronta a dispositivos legais e constitucionais e da divergência jurisprudencial invocada.
Agravo de instrumento não provido. (Processo: AIRR - 85340-36.2003.5.19.0006. Data de Julgamento: 18/04/2007, Relatora Ministra: Rosa Maria Weber Candiota da Rosa, 6ª Turma, Data de Publicação: DJ 04/05/2007).
RECURSO DE REVISTA. RELAÇÃO DE EMPREGO. LABOR NO PERÍODO ELEITORAL. Diante do disposto no art. 100 da Lei nº 9.504/97, relativo à ausência de vínculo empregatício entre prestadores de serviços, candidatos e partidos, não se faz potencial o alegado maltrato aos preceitos constitucionais indicados. Por outra face, a verificação dos argumentos da parte esbarra no óbice da Súmula 126/TST. Recurso de revista não conhecido.     (Processo: RR - 3968500-57.2002.5.04.0900. Data de Julgamento: 25/06/2008, Relator Ministro: Alberto Bresciani, 3ª Turma, Data de Publicação: DJ 22/08/2008).
PRESTAÇÃO DE SERVIÇO EM CAMPANHA ELEITORAL - ART. 100 DA LEI 9.504/97 - VÍNCULO DE EMPREGO NÃO DEMONSTRADO. 1. O art. 100 da Lei 9.504/97 reza que a contratação de pessoal para prestação de serviços nas campanhas eleitorais não gera vínculo com o candidato ou partido contratantes. 2. Na hipótese, o Regional entendeu que o referido dispositivo legal não obstaria o reconhecimento do vínculo empregatício caso tivesse sido demonstrado que a relação de trabalho havia se convolado em relação de emprego, o que não ocorreu, sendo certo que, no aspecto, o reexame de tal pressuposto fático em recurso de revista encontra o óbice da Súmula 126 do TST. 3. Por outro lado, não se identifica a inconstitucionalidade do dispositivo legal em comento, porque, muito embora a Constituição Federal assegure a todos os trabalhadores relação de emprego protegida, não proíbe a regulamentação de trabalhos especiais e, consequentemente, não impede a formação de relação de trabalho de natureza diversa, como no caso da prestação de serviço em campanhas eleitorais, que, além de ter natureza ocasional, conta com colaboradores não necessariamente motivados pela retribuição pecuniária do trabalho, mas por convicções políticas e afinidades de ideais. Agravo de instrumento desprovido. Processo: AIRR - 977- 22.2010.5.09.0242 Data de Julgamento: 20/09/2011, Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 23/09/2011.
28. Há que se anotar neste momento, que não gera vínculo empregatício até mesmo a relação entre o cabo eleitoral e os comitês dos candidatos contratantes – ainda que a lei seja silente –, tendo os candidatos e comitês a obrigação de contabilizar os gastos com remuneração ou gratificação de qualquer espécie paga a quem preste serviços a candidatos, partidos políticos e comitês financeiros[15], nos termos do artigo 100-A, §§ 3º a 6º da Lei das Eleições[16].
29. Verifica-se assim, que os Tribunais Regionais do Trabalho e até mesmo o Tribunal Superior do Trabalho vêm fazendo a denominada “interpretação conforme” a Constituição Federal, visando declarar a constitucionalidade do artigo 100 da Lei das Eleições, sendo a norma infraconstitucional compatível com o ordenamento jurídico vigente, lembrando-se que é o Supremo Tribunal Federal quem deve dar a última palavra sobre a questão.
30.  Certo é, que até o momento, nenhum recurso extraordinário versando sobre o tema deu entrada no STF, razão pela qual o TST foi o órgão máximo do Poder Judiciário a apreciar a matéria até então, decidindo pela constitucionalidade da norma.
31.  Importante apontar que a atual Ministra Rosa Weber, já foi integrante do TST e já se manifestou sobre a constitucionalidade do mencionado artigo 100 da Lei nº 9.504/97[17].
32. Definida a questão relativa à constitucionalidade do artigo 100 da Lei das Eleições, no sentido de que não há vínculo empregatício na contratação de cabos eleitorais por candidatos ou partidos políticos, passamos à analise da competência da Justiça do Trabalho para julgar demandas relacionadas ao tema.
33. Emenda Constitucional nº 45/2004, ampliou a competência desta Justiça Especializada, que deixou de apreciar apenas os dissídios oriundos das relações de emprego, passando a julgar controvérsias provenientes de relações de trabalho.
34.artigo 114inciso I da Constituição Federal afirma que compete à Justiça do Trabalho julgar as ações oriundas da relação de trabalho, razão pela qual, ainda que não seja reconhecido o vínculo empregatício, deve a Justiça do Trabalho resolver as demandas oriundas desta contratação – que geram relação de trabalho e não de emprego –, tendo competência constitucional sobre o tema.
35. Tanto é assim que em todos os julgados encartados neste parecer e nos pesquisados para fundamentar a questão, tem-se que os magistrados julgaram o mérito do pedido das reclamações trabalhistas, sem declinar da competência para julgamento.
36. Como a questão submete-se à Justiça do Trabalho, os candidatos ficam à mercê do paternalismo notório desta justiça, sendo que o Ministério Público do Trabalho (MPT) pode atuar para verificar cumprimento de regras trabalhistas no decorrer da relação de trabalho entre as partes, impondo regramentos mínimos, como jornada de trabalho, pagamento não inferior ao salário mínimo, condições de trabalho, etc., como já ocorrido recentemente em Roraima[18] – em julho de 2014 foi firmado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre o Ministério Público do Trabalho e os partidos – e no passado em Mato Grosso[19].
37. As campanhas eleitorais já são criticadas pelos altos valores que são desembolsados para a divulgação do material de propaganda eleitoral dos candidatos, sendo que se houver vínculo trabalhista entre cabos eleitorais e candidatos, o valor desembolsado para uma campanha de Presidente da República será ainda mais alto, tendo em vista a necessidade de pagamento de aviso prévio, 13º e férias proporcionais, entre outros encargos, razão pela qual o bom senso leva a crer que a constitucionalidade da norma deverá ser mantida.
38.  A título de informação sobre valores de gastos com campanhas eleitorais, segue reportagem Rodrigo Haidar para o sítio Consultor Jurídico[20].
“Os gastos de candidatos e partidos políticos com campanhas eleitorais no Brasil saltaram de R$ 798 milhões nas eleições presidenciais de 2002 para R$ 4,6 bilhões em 2012, as últimas eleições municipais. O crescimento é de 471%, enquanto a inflação, no mesmo período, foi de 78%. Nas últimas eleições, apenas uma construtora doou para diversos candidatos brasileiros o montante de R$ 50 milhões. O valor é praticamente todo o dinheiro gasto na França com campanhas políticas nas eleições presidenciais e legislativas daquele país, feitas no ano passado. Os franceses gastaram US$ 30 milhões.”
39.  Recentemente, a Folha de S. Paulo[21] divulgou os gastos pretendidos pelos candidatos a governador do estado de São Paulo, o que pode somar até R$ 280 milhões de reais, com envolvimento somente de 3 partidos (PT, PSDB e PMDB) num aumento de 43% relativo ao ano de 2010.
40.  No âmbito da disputa presidencial temos que “A corrida presidencial deste ano deverá custar quase R$ 1 bilhão. A campanha mais cara será a de reeleição da presidente Dilma Rousseff (PT), que estabeleceu como limite de gasto em R$ 298 milhões. Por sua vez, a candidatura do senador Aécio Neves (PSDB) deve custar R$ 290 milhões. Terceiro colocado nas pesquisas de intenção de votos, atrás de Dilma e Aécio, Eduardo Campos (PSB) fixou o custo em R$ 150 milhões.[22]
41.Por fim, cabe mais uma vez lição de Pedro Roberto Decomain, ELEIÇÕES (Comentários à Lei nº 9.504/97)[23], que, ao comentar o artigo 100 da Lei das Eleições, assim se pronunciou:
Com este artigo, a lei criou uma espécie de contrato de trabalho temporário, em que o único direito do empregado é o recebimento do salário combinado. Como a contratação do pessoal exclusivamente para o fim de trabalhar em campanha eleitoral não gera vínculo empregatício, não surge relação de emprego, cuja existência é o pressuposto para a incidência dos diversos direitos trabalhistas previstos na legislação própria. Assim, a contratação dos auxiliares de campanha não lhes dá direito a aviso prévio, férias, gratificação natalina (13º salário), depósito de FGTS e indenização correspondente a 40% desses depósitos, em caso de despedida injustificada.
42. Oportuno indicar ao consulente algumas regras sobre a contratação de cabos eleitorais, no que se refere a débitos tributários devidos pela contratação, sendo que verificando o sítio do Partido da República, encontra-se o manual de todas as Instruções do TSE referente à campanha de 2014[24], o qual no tópico referente à contratação de mão-de-obra para campanha eleitoral deve-se atentar para aInstrução Normativa RFB nº 872/2008[25] que assim dispõe sobre o pagamento da contribuição previdenciária:
Art. 1º Esta Instrução Normativa disciplina a declaração e o recolhimento das contribuições previdenciárias e das contribuições devidas a outras entidades ou fundos, decorrentes da contratação, por comitê financeiro de partido político e por candidato a cargo eletivo, de pessoal para prestação de serviços em campanha eleitoral.
Art. 2º É segurado contribuinte individual, nos termos das alíneas "g" e "h" do inciso V do art. 12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, a pessoa física contratada, respectivamente, por comitê financeiro de partido político ou por candidato a cargo eletivo, para prestação de serviços em campanha eleitoral.
Art. 3º Os comitês financeiros de partidos políticos se equiparam à empresa em relação aos segurados contratados para prestar serviços em campanha eleitoral, nos termos do parágrafo único do art. 15 da Lei nº 8.212, de 1991.
Art. 4º A equiparação de que trata o art. 3º não se aplica ao candidato a cargo eletivo que contrate segurados para prestar serviços em campanha eleitoral.
Art. 5º O comitê financeiro de partido político tem a obrigação de:
I - arrecadar a contribuição do segurado contribuinte individual a seu serviço, descontando-a da respectiva remuneração; e
II - recolher o valor arrecadado juntamente com a contribuição a seu cargo, utilizando-se de sua inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ).
Parágrafo único. Além das obrigações previstas nos incisos I e II do caput, o comitê financeiro de partido político deve arrecadar, mediante desconto no respectivo salário-de-contribuição, e recolher a contribuição ao Serviço Social do Transporte (SEST) e ao Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (SENAT), devida pelo segurado contribuinte individual transportador autônomo de veículo rodoviário que lhe presta serviços em campanha eleitoral.
Art. 6º A ocorrência de fatos geradores de contribuições previdenciárias e de contribuições devidas a outras entidades ou fundos, bem como as demais informações pertinentes, deverão ser declaradas à Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) mediante Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social (GFIP).
Art. 7º O disposto nos arts. 3º, 5º e 6º se aplica aos fatos geradores ocorridos até 31 de dezembro do ano em que as inscrições no CNPJ forem feitas.
Art. 8º Esta Instrução Normativa entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 9º Fica revogada a Instrução Normativa MPS/SRP nº 16, de 12 de setembro de 2006 .
43. Resume-se a questão da seguinte forma:
a) candidatos não contratam empregados para as campanhas eleitorais;
b) candidatos não se equiparam à empresa;
c) candidatos não devem fazer GFIP;
d) candidatos contratam contribuintes individuais, através de contrato de prestação de serviços em campanha eleitoral, contratado como autônomo e contribuinte individual, devendo por sua responsabilidade ao recolhimento previdenciário, diferentemente do que ocorre na contratação realizada pelos partidos e pelos comitês financeiros que se equiparam à empresa em suas obrigações tributárias, devendo reter e recolher as contribuições dos contratados.
44. Por outro lado, os candidatos estão isentos do recolhimento de encargos (INSS e IMPOSTO DE RENDA)  sobre mão-de-obra contratada.
45. Em decorrência destas normas da Receita Federal, os partidos, candidatos e comitês estão optando pela contratação de empresa especializada em mão-de-obra de terceiros e até mesmo de cooperativas, terceirizando o serviço de cabos eleitorais, deixando os encargos e a responsabilidade sobre os prestadores de serviço para a empresa ou cooperativa contratada.
46.  DIANTE DE TUDO O QUE FOI EXPOSTO, passo à resposta das questões que foram, a mim, submetidas pelo Senhor Presidente do Diretório Municipal do Partido da República de Bauru:
Sobre o item (a), O artigo 100 da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97) é constitucional? – Sim, o artigo 100 da Lei das Eleições é constitucional e vem sendo reconhecido como tal de forma pacífica na jurisprudência dos tribunais pátrios, razão pela qual a contratação de cabos eleitorais, a priori, não gera vínculo trabalhista.
Sobre o item (b), A Justiça do Trabalho é competente para dirimir controvérsia sobre a contratação de cabos eleitorais? – Como o artigo 100 é constitucional e expressamente exclui o vínculo trabalhista na relação candidato/cabo eleitoral, temos que a relação entre as partes é de trabalho, atraindo, desta forma, a competência da Justiça do Trabalho para análise da matéria, conforme dispõe o artigo 114, inciso I da Constituição Federal.

Dano moral sob a ótica da Constituição Federal de 1988

O dano moral, antes de ser regulamentado pelo instituto da Responsabilidade Civil, tem um viés puramente constitucional, visto que a lesão praticada fere diretamente os direitos à honra, vida privada, imagem, dentre outros, o patrimônio personalíssimo criado e regulamentado pela Carta Magna. A Constituição Federal, em seu art. 5°, incisos V e X, prevê a indenização por dano moral como proteção a direitos individuais, o que já haviam feito o Código Brasileiro de Telecomunicações, a Lei de Imprensa e a Lei dos Direitos Autorais, especificamente. 
Os direitos e garantias fundamentais vêm propostos no Título II da Constituição Federal e referem-se a um conjunto de dispositivos contidos na Constituição brasileira de 1988 destinados a constituir direitos, garantias e deveres aos cidadãos da República Federativa do Brasil. Estes dispositivos sistematizam as noções básicas e centrais que regulam a vida social, política e jurídica de todo o cidadão brasileiro.
Os Direitos e Garantias Fundamentais encontram-se regulados entre os artigos 5º ao 17 e, segundo o doutrinador José Afonso da Silva[1], estão reunidas em três gerações ou dimensões: individuais, civis e políticos;  sociais, econômicos e culturais; difusos e coletivos. São prerrogativas constitucionais basilares, sendo obrigatória a presença de todos eles ao ser humano brasileiro. Destaca-se, com isso, que os direitos constituídos no artigo 5º da Constituição Federal de 1988, por exemplo, são inerentes a todos, sendo dever do próprio povo fiscalizar a presença desses direitos à vida social. Segundo Flávio Tartuce:
Sabe-se que o Título II da Constituição Federal, sob o título ‘Dos Direitos e Garantias Fundamentais’, traça as prerrogativas para garantir uma convivência digna, com liberdade e com igualdade para todas as pessoas, sem distinção de raça, credo ou origem. Tais garantias são genéricas, mas também são essenciais ao ser humano, e sem elas a pessoa humana não pode atingir a sua plenitude e, por vezes, sequer sobreviver. [2]
Necessário aduzir que o rol descrito na Carta Magna é exemplificativo, albergando nos dispositivos referentes aos direitos fundamentais todos aqueles que prezam pela boa convivência e dignidade da pessoa, estando ou não no texto constitucional. Para reconhecer o caráter exemplificativo de tais direitos, o ordenamento jurídico brasileiro estabelece uma cláusula geral de proteção da personalidade, qual seja a dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil, previsto no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988. Nesse contexto, Gustavo Tepedino defende:
Com efeito, a escolha da dignidade da pessoa humana como fundamento da República, associada ao objetivo fundamental da erradicação da pobreza e da marginalização, e de redução das desigualdades sociais, juntamente com a previsão do parágrafo 2º do artigo 5º, no sentido de não exclusão de quaisquer direitos e garantias, mesmo que não expressos, desde que decorrentes dos princípios adotados pelo texto maior, configuram uma verdadeira cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana, tomada como valor máximo pelo ordenamento.[3]
Os direitos fundamentais firmados pela Constituição Federal de 1988 configuram-se como diretrizes gerais que garantem um limite ao poder excessivo do Estado, não se confundindo com os direitos da personalidade, que apesar da semelhança e confusão corriqueira, estes são frutos da captação dos valores fundamentais regulados no interior da disciplina civilista. Tais direitos, conforme já defendido, não se confundem, já que são espécies autônomas, mas se encontram em um ponto comum, qual seja a proteção de valores inerentes à pessoa humana.
Verifica-se, portanto, que os direitos fundamentais são construídos sob a perspectiva de efetivar a dignidade do titular da personalidade nas relações públicas, enquanto que os direitos da personalidade seriam uma proteção necessária para o exercício da própria personalidade nas relações privadas. Insta frisar, porém, que, embora sejam conceitos autônomos, muitas vezes um direito da personalidade é também um direito fundamental, da mesma forma em que se torna possível a ocorrência da relação inversa.
O termo “personalidade” significa o conjunto de características psicológicas que determinam os padrões de pensar, sentir e agir, ou seja, a individualidade pessoal e social de alguém. A formação da personalidade é processo gradual, complexo e único a cada indivíduo. Os direitos da personalidade, ou personalíssimos, são aqueles definidos como irrenunciáveis, intransmissíveis e que todo indivíduo tem de controlar, tais como: o uso de seu corpo, nome, imagem, aparência ou quaisquer outros aspectos constitutivos de sua identidade. Dessa forma, estariam os direitos da personalidade vinculados de forma indissociável ao reconhecimento da dignidade humana, qualidade necessária para o desenvolvimento das potencialidades físicas, psíquicas e morais de todo ser humano.
Posto o conceito de direito personalíssimo, crucial diferir do direito fundamental, visto que estes são traduzidos como inerentes à pessoa humana, que decorrem da própria natureza do homem, sendo, portanto, indispensáveis e necessários para assegurar a todos uma existência livre, digna e igualitária. Tais direitos passaram a ser proclamados e inseridos de maneira explícita nas constituições após a 2ª Guerra Mundial, haja vista as tamanhas violências cometidas pelos regimes fascista, stalinista e nazista naquela época, ameaçando direitos individuais e coletivos essenciais para a vida em sociedade, bem como provocando profundas instabilidades no convívio de âmbito internacional.
A Constituição Federal Brasileira de 1988 representou um grande avanço no reconhecimento dos direitos fundamentais da pessoa humana, trazendo em seu bojo um rol extenso e não exaustivo desses direitos, de forma explícita e implícita, bem como revelando garantias que asseguram o respeito e o cumprimento de tais direitos.
Os direitos da personalidade encontram-se intimamente ligados aos direitos fundamentais, tendo em vista que todo aquele que tem personalidade merece uma proteção fundamental. Tal proteção fundamental são os próprios direitos da personalidade e estes constituem proteção necessária para que a pessoa possa exercer a sua essência com dignidade. Pode-se afirmar, sem erro, que todo direito personalíssimo é fundamental, visto que a característica personalíssima de ser apenas traduz a inalienabilidade e a ampla individualidade de tais direitos que é claro e evidente ser fundamental.
O direito de propriedade, por exemplo, está elencado na Constituição Federal, no artigo 5º, inciso XXII, como sendo um direito individual fundamental, porém, analisando o direito elencado, pode-se afirmar que o mesmo é um direito personalíssimo do ser humano, que não pode, por exemplo, vender esse direito a outrem; em outras palavras, é impossível existir qualquer contrato que comercialize o direito de propriedade. Por conta disso, o Direito Civil não regula os direitos fundamentais, por ser esse ramo do direito próprio da propriedade objetiva dos indivíduos, regulando relações privadas com o objeto sendo lícito, possível e determinado, ou determinável, pelo menos.
Ademais, oportuno esclarecer que os direitos personalíssimos possuem esta nomenclatura pois preservam a integridade física, moral e intelectual das pessoas. Conforme leciona Sílvio Rodrigues, não se pode “conceber um indivíduo que não tenha direito à vida, à liberdade física ou intelectual, ao seu nome, ao seu corpo, à sua imagem e àquilo que crê ser sua honra”, no sentido de afirmar que há direitos inseparáveis da pessoa, pois estão ligados desde o momento em que nascem até mesmo após sua morte, haja vista que seus familiares passarão a ter legitimidade para requerer que cesse os direitos ameaçados.   
Como é de conhecimento, a Constituição Federal de 1988 prevê logo em seu 1º artigo, dentre outros fundamentos da República Federativa do Brasil, a dignidade da pessoa humana, que está ligada de maneira direta aos direitos personalíssimos, haja vista se tratar de atributo essencial do ser humano, conforme preceitua Ingo Wolgang Sarlet em sua obra, in verbis: 
[...] qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existentes mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co- responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.[4]
Outrossim, oportunas são as palavras de Flávio Tartuce a respeito do tema:
Os direitos da personalidade têm por objeto os modos de ser, físicos ou morais do indivíduo e o que se busca proteger com eles são, exatamente, os atributo específicos da personalidade, sendo personalidade a qualidade do ente considerado pessoa. Na sua especificação, a proteção envolve os aspectos psíquicos do indivíduo,além de sua integridade física, moral e intelectual, desde a sua concepção até a sua morte.[5]
   Assim sendo, os direitos da personalidade se encontram entre os direitos extrapatrimoniais, por não se tratar do patrimônio da pessoa, mas sim da integridade física, moral e intelectual, como o direito ao nome, à imagem, à privacidade, ao corpo vivo ou morto etc., são aspectos que dizem respeito ao cerne da pessoa, essenciais ao ser humano.
A melhor definição pura e seca para Responsabilidade Civil está albergada pelo Consultor Jurídico Online, onde menciona que:
Responsabilidade civil é a obrigação de reparar o dano que uma pessoa causa a outrem. Em direito, a teoria da responsabilidade civil procura determinar em que condições uma pessoa pode ser considerada responsável pelo dano sofrido por outra pessoa e em que medida está obrigada a repará-lo. A reparação do dano é feita por meio da indenização, que é quase sempre pecuniária. O dano pode ser à integridade física, à honra ou aos bens de uma pessoa.[6]
O conceito de responsabilidade, de reparar o dano injustamente causado, é da natureza humana, assim sendo, sempre existiu, porém a forma de reparar o dano sofrido na sociedade primitiva era através da violência coletiva, que se caracterizava pela reação conjunta do grupo contra o agressor. Posteriormente, passou-se para a vingança individual, privada, a Lei de Talião demonstrava a reparação, no até hoje conhecido "olho por olho, dente por dente" ou "quem com ferro fere, com ferro será ferido". O poder público pouco intervia.
Já em Roma, o sistema de responsabilidade é extraído da interpretação da "Lex Aquilia de Damno", o princípio pelo qual se pune a culpa por danos injustamente provocados, independentemente da relação obrigacional pré-existente. Por esta razão a responsabilidade extracontratual também é denominada aquiliana.
Com a evolução da sociedade, a idéia de culpa não era mais suficiente para cobrir os danos, devido a sua subjetividade, o mero risco, passou a ser causa de indenização, independente de culpa. Basta provar que o evento decorreu da atividade para gerar o dever de indenização.
Hoje, há ainda o dever de indenizar devido a atos cometidos por terceiros, como entre pais e filhos menores, entre comitentes e prepostos por culpa "in eligendo" etc. Também se responde por fatos de animais ou coisas sob a guarda do imputado e também sobre produtos vendidos por empresa. A teoria da reparação de danos só foi corretamente entendida quando os juristas entenderam que o fundamento da responsabilidade civil situa-se na quebra do equilíbrio patrimonial provocado pelo dano, transferiu-se o enfoque da culpa para a noção de dano. A responsabilidade civil vem com duas funções básicas, que é restabelecer o direito lesado e servir como sanção civil ao ator do fato.
Neste contexto, o dano, seja ele material ou moral, praticado pelo infrator da norma, dá direito líquido e certo à vítima de ser ressarcida pelos atos praticados com dolo ou culpa do agente transgressor. A Reponsabilidade Civil é a ramificação didática da ciência do Direito que mais se mostra lógica, uma vez que o raciocínio é simples: há o dano, há o direito de ser ressarcido. Com efeito, não é a conceituação da Responsabilidade Civil que importa, mas sim a existência e a delimitação do dano causado; isto sim é o divisor de águas e a questão crucial nas ações de reparação de danos.
Ora, é claro e evidente que o dano praticado tem que ser delimitado, o magistrado é obrigado a saber e ter a plena e absoluta convicção acerca do ato ilícito praticado pelo demandado na ação civil, caso contrário, existindo qualquer resquício de dúvida, é imperioso, mandamental e obrigatório a improcedência da demanda, sob pena de além de haver enriquecimento ilícito, existir injustiça e aberração jurídica, já que um inocente não pode responder pelo ato que não praticou ou praticou com alguma excludente do dever de reparar.
Outrossim, oportuno esclarecer que a evolução histórica, juntamente com o entendimento jurisprudencial e doutrinário atual, caminha para o lado de que a Responsabilidade Civil deve ser tratada com um grau elevado de importância, não suportando a carência de provas robustas e consistentes, a tentativa desleal de enriquecimento ilícito e confusão entre o real dano praticado e o mero aborrecimento comum ao dia-a-dia e presente em todas relações.
Por outro lado, a Responsabilidade Civil é sim um ramo do direito que permite ao magistrado a aplicação de duras sanções e o uso de todos os artifícios hábeis à devolver à vítima o abalo material ou moral sofrido em virtude da má conduta praticado. Ousa-se comparar o Instituto em análise com o Direito Penal, que averigua a conduta delituosa praticada ou não e a posterior aplicação de sanções, tais como: reclusão, detenção, penas restritivas de direito etc.
A diferença entre as comparações acima elencadas é que a Responsabilidade Civil interfere apenas no patrimônio do infrator, ou seja, irá intervir sumariamente na pecúnia, no quantum debeatur e o Direito Penal, por ser regulador de crimes, poderá intervir nos direitos constitucionais de ir e vir.
Assim, guardadas as devidas diferenças, conclui-se que os dois ramos estudam e aplicam sanções a atos ilícitos praticados com dolo ou culpa pelo agente transgressor, não restando dúvidas de que o dano civil não pode ser impune, pelos mesmos aspectos de um crime praticado que não foi feito nada com o criminoso.
Para corroborar o acima exposto, Maria Helena Diniz acerca defende que “é a aplicação de medidas que obrigam uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato que ela mesma praticou, por pessoa a quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou por simples imposição legal."[7]
A responsabilidade civil pode ser subjetiva ou objetiva. A subjetiva está amparada em três requisitos caracterizadores para sua existência, são eles: a culpa, o dano e o nexo causal. Por conta disso, para reparação do dano causado à vítima, é necessário restar demonstrado a culpa do infrator e o nexo de causalidade entre a conduta praticada e o dano perpetrado. No ordenamento jurídico brasileiro, a cláusula geral da responsabilidade subjetiva está prevista no artigo 186 c/c o artigo 927 do Código Civil, in verbis:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Da leitura de ambos os artigos, percebe-se que para a caracterização do ato ilícito, são necessários dois pressupostos: a imputabilidade do agente e a culpa. Diz-se imputável o agente capaz de responder por uma conduta contrária ao dever. Consequentemente, os incapazes não seriam obrigados a reparar o dano que causassem a outrem, por serem inimputáveis. O alegado porém não ocorre, visto que o Código Civil de 2002 adotou a teoria da responsabilidade mitigada e subsidiária dos incapazes, a qual reza que pelos atos dos incapazes responde, primeiramente, a pessoa encarregada de sua guarda. Acaso essa pessoa reste incapacitada de responder, o próprio incapaz responderá, porém, frise-se, somente quando as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes para tanto.
Ademais, o segundo pressuposto é a culpa, categoria mais importante da responsabilidade civil subjetiva. A noção jurídica de culpa alberga a ideia do dolo, como sendo a contida na “negligência, imprudência e imperícia” descrito no artigo acima mencionado. Por dolo entende-se o propósito de causar dano a outrem. Já por culpa em sentido estrito, entende-se a inobservância de uma norma de conduta, seja por negligência, ou seja, falta de cuidado por conduta omissiva, imprudência, falta de cuidado por conduta comissiva, ou imperícia, falta de habilidade no exercício de atividade técnica, que leva a um resultado não desejado, qual seja, a violação de um dever jurídico, causando dano a outrem.
Nesse sentido, deve-se destacar que o conceito jurídico de culpa evoluiu, de modo a surgir o que chamam hoje de “concepção normativa de culpa”. Por essa concepção, a culpa passou a ser entendida como “o erro de conduta”, de modo que age com culpa aquele que age fora dos padrões de conduta esperados.
Desse modo, para verificar se houve culpa ou não, deve-se comparar a conduta concreta do agente causador do dano com a conduta que teria adotado o homem-médio. Ou seja, adota-se um modelo de comportamento esperado, baseado no parâmetro romanista do bonus pater famílias, e o compara com o comportamento do agente causador do dano, aferindo, assim, se esse agiu com culpa ou não.
Por conta do exposto, é de fácil conclusão que a responsabilidade civil subjetiva é aquela em que a obrigação de indenizar só ocorre com a comprovação de dolo ou culpa por parte do causador do dano, cabendo ao prejudicado o ônus de demonstrar a existência desses elementos subjetivos. Para corroborar o alegado acerca do tema, imperioso destacar o posicionamento do doutrinador Carlos Roberto Gonçalves acerca do assunto:
Conforme o fundamento que se dê à responsabilidade, a culpa será ou não considerada elemento da obrigação de reparar o dano.
Em face da teoria clássica, a culpa era fundamento da responsabilidade. Essa teoria, também chamada teoria da culpa, ou "subjetiva", pressupõe a culpa como fundamento da responsabilidade civil. Em não havendo culpa, não há responsabilidade.
Diz-se, pois, ser ‘subjetiva’ a responsabilidade quando se esteia na idéia de culpa. A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável. Dentro dessa concepção, a responsabilidade do causador do dano somente se configura se agiu com dolo ou culpa.[8]
Por fim, interessante destacar duas tendências jurisprudenciais e doutrinárias que se desenvolveram nesse contexto. A primeira tendência se relaciona com a prática de classificar graus de culpa no momento da fixação da indenização. Assim, como modalidade grave de culpa, tem-se o erro grosseiro, injustificável (equiparado ao dolo e a culpa consciente); como modalidade leve, por sua vez, tem-se aquele erro evitável com atenção ordinária; por último, como modalidade levíssima, tem-se o erro ocasionado pela falta de atenção extraordinária, com especial habilidade.
A segunda tendência se relaciona com a prática de admitir a inversão ao ônus da prova, em casos em que se entende que seria muito difícil a vítima obter reparação se tivesse que provar o nexo causal. Dessa forma, em face da possibilidade da vítima ter que fazer uma prova diabólica, presume-se a culpa do agente causador do dano. Arrematando o assunto, forçoso destacar ainda o pensamento de Aguiar Dias e Washington de Barros Monteiro acerca do tema, respectivamente:
A teoria da culpa, resumida, com alguma arrogância, por VON IHERING, na fórmula ‘sem culpa, nenhuma reparação’, satisfez por dilatados anos à consciência jurídica, e é, ainda hoje, tão influente que inspira a extrema resistência oposta por autores insignes aos que ousam proclamar a sua insuficiência em face das necessidades criadas pela vida moderna, sem aludir ao defeito da concepção em si mesma.[9]
[...] a teoria clássica e tradicional da culpa, também chamada teoria da responsabilidade subjetiva, que pressupõe sempre a existência de culpa (latu sensu), abrangendo o dolo (pleno conhecimento do mal e direta intenção de o praticar) e a culpa (stricto sensu), violação de um dever que o agente podia conhecer e acatar, mas que descumpre por negligência, imprudência ou imperícia.[10]
A Responsabilidade Civil Objetiva, por sua vez, é aquela não necessita da culpa como elemento caracterizador da reparação do dano. Para esta divisão, a relação de causa entre o ato do transgressor e o dano perpetrado surge automaticamente o dever de indenizar. Carlos Roberto Gonçalves escreveu sobre o tema quando defendeu:
Quando a culpa é presumida, inverte-se o ônus da prova. O autor da ação só precisa provar a ação ou omissão e o dano resultante da conduta do réu, porque sua culpa já é presumida. Trata-se, portanto de classificação baseada no ônus da prova. É objetiva porque dispensa a vitima do referido ônus. Mas, como se baseia em culpa presumida, denomina-se objetiva imprópria ou impura. É o caso, por exemplo, previsto no art. 936 do Código Civil, que presume a culpa do dono do animal que venha a causar dano a outrem. Mas faculta-lhe a prova das excludentes ali mencionadas, com inversão do ônus probandi. Se o réu não provar a existência de alguma excludente, será considerado culpado, pois sua culpa é presumida.[11]
A lei impõe a certas pessoas em determinadas situações a reparação de um dano cometido sem culpa. Quando isto acontece, diz-se que a responsabilidade é legal ou objetiva, porque prescinde da culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade. Esta teoria tem como postulado que todo dano é indenizável, e deve ser reparado por quem a ele se liga por um nexo de causalidade, independentemente de culpa. Nos casos de responsabilidade objetiva, não se exige prova de culpa do agente para que seja obrigado a reparar o dano. Em alguns, ela é presumida pela lei. Em outros, é de todo prescindível, porque a responsabilidade se funda no risco.
Quando a culpa é presumida, inverte-se o ônus da prova. O autor da ação só precisa provar a ação ou omissão e o dano resultante da conduta do réu, porque sua culpa é presumida. É uma classificação baseada na prova. É objetiva porque dispensa a vítima do referido ônus. Por basear-se em culpa presumida, denomina-se objetiva imprópria ou impura. É o que se vê, por exemplo, no artigo 936 do Código Civil, que presume a culpa do dono do animal que venha a causar dano a outrem, conforme estipulação expressa do mencionado artigo: “O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.”
Uma das teorias que procuram justificar a responsabilidade objetiva é a teoria do risco. Para esta teoria, toda pessoa que exercer alguma atividade cria um risco de dano para terceiros. E deve ser obrigada a repara-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa. Outrossim, superados os argumentos acima expostos, que bem delineiam a concepção acerca da responsabilidade civil subjetiva e objetiva, necessário faz-se tecer considerações acerca da Responsabilidade Civil Contratual e a Extracontratual.
Com efeito, entende-se por responsabilidade contratual aquela presente em um contrato existente entre as partes envolvidas, agente transgressor e vítima. Assim, o contratado ao unir os quatro elementos da responsabilidade civil, ação ou omissão, culpa ou dolo, nexo e dano, em relação ao contratante, em razão do vínculo jurídico que lhes cerca, incorrerá na chamada Responsabilidade Civil Contratual.
Em outras palavras, a responsabilidade contratual resulta de um contrato entre as partes, onde o descumpridor do acordado indenizará a vítima pelo dano ou prejuízo, conforme determina o artigo 389 do Código Civil: “Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.”
Na responsabilidade contratual, não se faz necessário o contratante provar a culpa do inadimplente para obter reparação das perdas e danos, já que neste tipo basta provar o inadimplemento. O ônus da prova, na responsabilidade contratual, competirá ao devedor, que deverá provar, ante o inadimplemento, a inexistência de sua culpa ou presença de qualquer excludente do dever de indenizar. Assim, para que o devedor não seja obrigado a indenizar, o mesmo deverá provar que o fato ocorreu devido a caso fortuito ou força maior.
Já a responsabilidade extracontratual se resulta do inadimplemento normativo, ou seja, da prática de um ato ilícito por pessoa capaz ou incapaz, da violação de um dever fundado em algum princípio geral de direito, e não do inadimplemento contratual, visto que não há vínculo anterior entre as partes, por não estarem ligadas por uma relação obrigacional. A fonte desta inobservância é a lei; é a lesão a um direito sem que entre o ofensor e o ofendido preexista qualquer relação jurídica. Aqui, ao contrário da contratual, caberá à vítima provar a culpa do agente.
A responsabilidade extracontratual deriva, portanto, de um ilícito extracontratual, por não estar albergado em nenhum instrumento previamente acordado e sim nas regras gerais normatizadas pelo direito positivo. Deriva da transgressão à lei normatizada e positivada  no espaço e tempo. Segundo leciona Sílvio de Salvo Venosa, a responsabilidade extracontratual, ou Lex Aquilia, é o divisor de águas da responsabilidade civil, pelos motivos abaixo esposados:
Esse diploma, de uso restrito a princípio, atinge dimensão ampla na época de Justiniano, como remédio jurídico de caráter geral; como considera o ato ilícito uma figura autônoma, surge, desse modo, a moderna concepção da responsabilidade extracontratual. O sistema romano de responsabilidade extrai da interpretação da Lex Aquilia o princípio pelo qual se pune a culpa por danos injustamente provocados, independentemente de relação obrigacional preexistente. Funda-se aí a origem da responsabilidade extracontratual. Por essa razão, denomina-se também responsabilidade aquiliana essa modalidade. A Lex Aquilia foi um plebiscito aprovado provavelmente em fins do século III ou início do século II a.C., que possibilitou atribuir ao titular de bens o direito de obter o pagamento de uma penalidade em dinheiro de quem tivesse destruído ou deteriorado seus bens. Como os escravos eram considerados coisas, a lei também se aplicava na hipótese de danos ou morte deles. Punia-se por uma conduta que viesse a ocasionar danos.[12]
A fonte da responsabilidade extracontratual, conforme já defendido, é a inobservância da lei. É a lesão a um direito sem que entre o ofensor e o ofendido preexista qualquer relação jurídica. Como exemplifica Sílvio Rodrigues, se alguém atropela um homem que, no desastre, perde um braço, o agente causador desse dano fica obrigado a repará-lo, por responsabilidade extracontratual. A indenização, no caso, consistirá no pagamento do correspondente às despesas de tratamento da vítima, lucros cessantes até o fim da convalescença e ainda uma pensão correspondente à diminuição de sua capacidade laborativa, além de indenização por danos morais, objeto principal de estudo no presente trabalho.
Dano é toda lesão a um bem juridicamente protegido, causando prejuízo de ordem patrimonial ou extrapatrimonial. Sem que tenha ocorrido dano a alguém, não há que se cogitar em responsabilidade civil, por ser requisito indispensável à reparação em face do ato ilícito cometido. Ao contrário do que ocorre na esfera penal, o dano, na esfera civil, sempre será elemento essencial na configuração da responsabilidade civil; não há responsabilidade civil por ‘tentativa’, ainda que a conduta tenha sido dolosa.
Segundo Cavalieri Filho, a Responsabilidade Civil tem por finalidade principal o restabelecimento do status anterior ao dano, como forma de distribuição do infortúnio, alguns aspectos lhe são característicos: este restabelecimento pode se dar, a princípio, de duas formas diversas, quais sejam a reintegração específica e a indenização. A reintegração específica se dá pela reparação dos danos in natura. Na hipótese de não se poder restituir in natura, tem cabimento a conversão desta por uma indenização.
Para o autor, a função reparatória parece evidente na reintegração em espécie do bem lesado, porém é na categoria mais ampla de indenização que pode surgir a possibilidade de acrescentar outras funções para além daquelas ressarcitória e compensatória. Tudo isso justamente porque são reduzidas as hipóteses de bem juridicamente tutelado que podem ser ressarcidos em espécie. Importante colacionar as oportunas lições do doutrinador Cavalieri Filho a respeito do tema, para, após tecer considerações acerca de seus ensinamentos:
Indenização sem dano importaria enriquecimento ilícito; enriquecimento sem causa para quem a recebesse e pena para quem a pagasse, porquanto o objetivo da indenização, sabemos todos, é reparar o prejuízo sofrido pela vítima, reintegrá-la ao estado em que se encontrava antes da prática do ato ilícito. E, se a vítima não sofreu nenhum prejuízo, a toda evidência, não haverá o que ressarcir. Daí a afirmação, comum praticamente a todos os autores, de que o dano é não somente o fato constitutivo mas, também, determinadamente do dever de indenizar. [...] Conceitua-se, então, o dano como sendo a subtração ou diminuição de um bem jurídico, qualquer que seja a sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial, quer se trate de um bem integrante da própria personalidade da vítima, como a sua honra, a imagem, a liberdade etc. Em suma, dano é lesão de um bem jurídico, tanto patrimonial como moral, vindo daí a conhecida divisão do dano em patrimonial e moral.[13]
Com efeito, a necessidade de ressarcimento do dano advém da ideia de que o lesionado não pode, em hipótese alguma, ter seu patrimônio, mesmo que seja moral, diminuído sem que o infrator não devolva o status quo do início. O abalroamento de dois veículos sempre pressupõe a culpa de um dos motoristas, sendo necessário, primeiro, a percepção de qual dos dois infringiu as normas de trânsito e cometeu o ilícito. Após esse consenso, a vítima terá direito líquido e certo em reaver seu veículo sem arranhões, amassados ou qualquer tipo de avaria.
Neste exemplo, percebe-se que o ressarcimento pelo dano causado nasceu no momento da colisão, surgindo a pretensão ao detentor do veículo lesionado de buscar de todos os meios legais para reaver o montante devido para consertar o veículo, isto se chama dano material. De outro lado, se dois indivíduos discutem e um profere xingamentos e acusações levianas, nasce, neste intervalo de segundo, o direito do lesionado ser ressarcido, geralmente pecuniariamente, pelo amargo, dor, abalo sofrido com sua honra, isto se chama dano moral.
Com esses dois exemplos, assevera-se que inúmeras serão as situações que um indivíduo terá direito de ser ressarcido e outro o dever de ressarcir o abalo sofrido no patrimônio material ou moral do outro. E, ainda, que existem diversos tipos de dano, podendo ser moral, material, estético, emergente etc. Ademais, ainda em análise perfunctória acerca do dano, para Pessoa Jorge, o dano corresponde à lesão de certo bem, que conduz ao dano concreto, ou real:
[...], discute-se em que aspecto das situações jurídicas ele se insere: se consiste na violação do direito subjetivo, ou na ofensa ao bem, ou na lesão à disponibilidade deste, ou na ofensa ao interesse do titular.
Parece-nos, dentro desta concepção, que o prejuízo deve ser entendido como frustração efetiva das utilidades do bem.
Referimos acima o mecanismo da ofensa-lesão a situações vantajosas; ora, o prejuízo só existe quando, havendo essa lesão, o respectivo titular não consegue, na realidade, usufruir as utilidades do bem, ou só o consegue com maior esforço, hipótese em que o prejuízo consiste nesse maior esforço.
O dano surge, assim, em relação a qualquer situação vantajosa, mesmo de fato, e não se reporta necessariamente à lesão de um direito subjetivo; mas só é relevante para efeitos de responsabilidade civil, quando resulta da lesão de uma situação vantajosa tutelada pelo direito, nos termos que vimos acima.
Deste modo, o prejuízo não se confunde com a lesão do direito ou, em geral, da situação vantajosa. Se o empreiteiro, obrigado a entregar a casa dentro de determinado prazo, só vem a fazê-lo quinze dias mais tarde, houve ofensa do direito de crédito, mas pode não ter havido prejuízos, v. g. se o dono da casa, que a destinava a sua habitação, não a utilizaria nesse período por se encontrar ausente no estrangeiro. Se alguém danifica ou se apropria de coisa alheia, lesa o direito de propriedade; mas, se a conserta ou restitui antes que dela necessite o dono, não provoca prejuízos a este, pelo que não haverá responsabilidade civil.[14]
Conclui-se, portanto, que existente o dano nasce o dever de reparar o lesionado, sendo imperioso que qualquer que seja a espécie do dano é necessário a devida compensação pelo perdimento material ou moral do agente, necessitando este voltar ao status originário, sob pena de enriquecimento ilícito do transgressor, atitude rechaçada com veemência em todo o ordenamento jurídico pátrio.

Notas

[1] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 36. ed. Rio de Janeiro: Malheiros, 2013.
[2] TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. 2. ed. São Paulo: Método, 2012.
[3] TEPEDINO, Gustavo. A tutela da personalidade no ordenamento civil-constitucional brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.
[4]  SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na constituição federal de 1988. 4. ed. Porto Alegre: do Advogado, 2007.
[5] TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. 2. ed. São Paulo: Método, 2012.
[6] LEITE, Ravênia Márcia de Oliveira. A responsabilidade civil e os danos indenizáveis, 2009. Disponível em: . Acesso em: 24 jan. 2014.
[7] DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 31. ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2014.
[8]GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 12. ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2012.
[9] DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 12. ed. São Paulo: E Lumen Juris, 2012.
[10] MONTEIRO, Washington de Barros; PINTO, Ana Cristina de Barros Monteiro França. Curso de direito civil. 44. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
[11] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 12. ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2012.
[12] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2014.
[13] FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de direito do consumidor. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2011.
[14] JORGE, Fernando de Sandy Lopes Pessoa. Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil . 2. ed. São Paulo: Almedina, 1995.

Responsabilidades, competências do conselho fiscal de uma ONG

Toda instituição sem fins lucrativos para ter acesso a certificações e qualificações voltadas ao Terceiro Setor, bem como, para acessar recursos públicos diversos precisam ter em seus estatutos sociais a previsão da existência de um órgão chamado Conselho Fiscal.
O conselho é um órgão fiscalizador das ações da administração da ONG e da forma como esta utiliza os recursos financeiros captados.
Pelo fato de ser um órgão fiscalizador existem alguns requisitos que devem ser respeitados na composição do Conselho Fiscal e na forma como suas competências estão previstas no Estatuto Social.
Primeiramente, o conselho deve conter um número ímpar de conselheiros, devido à necessidade de voto de desempate, que sempre precisará ser dado por um conselheiro quando houver uma decisão que está “dividida” e este voto nunca poderá ser dado por alguém que ocupe um cargo da administração da ONG.
Outra peculiaridade é que Conselho Fiscal não faz parte dos órgãos de gestão ou administração da ONG, muito pelo contrário, irá fiscalizá-los. Portanto o Conselho Fiscal nunca deve estar disposto no estatuto social dentro do capítulo que fale sobre gestão da ONG. 
Uma obrigatoriedade que fica implícita na legislação, por pura lógica, é que os membros do Conselho Fiscal não sejam pessoas físicas que participem direta ou indiretamente das ações, projetos, programas ou do administrativo da ONG, pois tais membros precisam ter resguardados os sentimentos de imparcialidade para analisar e julgar as contas e relatórios da ONG que estará fiscalizando. Como alguém pode fiscalizar algo da qual faz parte? Isto fere a todos os princípios básicos do direito administrativo, seja público ou privado.
O Conselho fiscal precisa ser um órgão autônomo, independente e imparcial para analisar, julgar, aprovar ou não as contas da ONG e por isto não deve ter relação de parentesco e nenhuma subordinação à administração da entidade que irá fiscalizar, por questões óbvias e éticas.
Outro ponto importante, diante da responsabilidade civil e penal que têm este Conselho, em relação aos pareceres que emite para serem lidos durante a assembleia geral ordinária, é que conselheiros fiscais precisam ter conhecimento e noção básica sobre finanças, contabilidade e projetos, pois são exatamente estas atividades e relatórios que serão analisados pelos conselheiros.
A seriedade desta função, as responsabilidades e conseqüências que podem surgir, por atos de negligência ou imperícia, levam-nos a uma reflexão: para ser um conselheiro fiscal é preciso ter tempo mínimo disponível para dedicação à função e noção exata de suas responsabilidades e atribuições.

Ressalta a importância da escolha sensata e coerente dos membros do Conselho Fiscal de uma entidade sem fins lucrativos, face à parcialidade e inoperância deste órgão, que a autora identifica na maioria dos processos de auditoria que participa.