A Constituição Federal brasileira foi formulada para "assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus (...)". Como se vê, a Carta Magna assegura a igualdade e a liberdade, e ainda faz referência ao nome de Deus. Na verdade, a citação de Deus no texto é apenas a formalização de algo histórico. O cristianismo e o seu livro, a bíblia, estiveram presentes em toda a colonização e ainda é parte integrante de nossa cultura. A Fundação Getúlio Vargas divulgou, neste mês, um novo mapa das religiões no Brasil, traçado com base na última pesquisa de orçamentos familiares do IBGE. Em 2009, 68,4% dos brasileiros se declararam católicos e 20,2% evangélicos. Sendo assim, 88,6% da população tem a bíblia como referência religiosa.
É exatamente por isso que estranho a recente decisão da justiça ao retirar, em Ribeirão Preto, um outdoor que continha frases bíblicas, alegando conteúdo homofóbico, pois o texto fazia alusão às práticas homossexuais. A retirada do texto ocorreu um dia antes da realização da Parada Gay na cidade. A decisão foi da 6ª Vara Cível da cidade, após uma ação civil pública da Defensoria Pública de São Paulo contra a Casa de Oração de Ribeirão Preto e empresa Nóbile Painéis.
Todos nós devemos combater qualquer tipo de violência, sendo ela contra a mulher, o homossexual, o idoso ou a criança. A Constituição assegura que todos sejam tratados de igual modo. Mas eu repudio a ação da justiça ao retirar o outdoor, pois a decisão foi exagerada e feriu outro direito assegurado pela CF, que no Art. 220 afirma "A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição (...)".
Segundo Ives Gandra Martins, um dos mais renomados juristas brasileiros, a ordem da Justiça fere o direito à liberdade de expressão. Ele chega a falar até em "discriminação às avessas".
Os livros citados no outdoor foram: "Se também um homem se deitar com outro homem, como se fosse mulher, ambos praticaram coisa abominável", Levítico 20;13; "Por causa das coisas que estas pessoas fazem, Deus as entregou a paixões vergonhosas. Pois até as mulheres trocam as relações naturais pelas que são contra a natureza. E também os homens deixam as relações naturais com as mulheres e se queimam de paixão uns pelos outros. Homens têm relações vergonhosas uns com os outros e por isso recebem em si mesmos o castigo que merecem por causa dos seus erros. (Romanos 1: 26-27); "Portanto, arrependam-se e voltem para Deus, a fim de que Ele perdoe os pecados de vocês.", Atos 3:19.
As palavras contidas na bíblia não são novidade para ninguém, suas afirmações são conhecidas há séculos e chega a ser criminoso não poder torná-las públicas.
Em maio deste ano, escrevi um artigo intitulado "Discriminação às avessas", onde afirmava que era importante respeitar o direito de se expressar, pois se isso não fosse resguardado estaríamos fadados a uma prisão, uma ditadura travestida de justiça, onde nada poderá ser dito se não contemplar a opinião de um grupo que conquistou privilégios, e não a igualdade. Essa frase foi dita em outro momento, mas torna-se oportuno repeti-la, já que hoje tenho a impressão de que qualquer comentário ou mesmo crítica possa ser interpretado como crime. A liberdade de expressão está passando por um momento muito delicado, ficando, muitas vezes, condicionada ao que as autoridades dizem que pode se dizer.
Proibir a livre expressão de pensamento não será o melhor caminho para combater a violência contra os homossexuais. Este tipo de censura me remete a outra que dá até calafrios de relembrar "a da ditadura militar. Só que na outra, os meios de comunicação foram tomados por censores, uma minoria frente a grande maioria da população, que escolhia o que podia ser dito ou não. É preciso ter cautela quando certas decisões do judiciário esbarram com as liberdades fundamentais, não podemos permitir que apenas algumas pessoas tenham o direito de dizer o que pensam, pois a liberdade de expressão é um direito de todos.
*Gilmaci Santos é deputado estadual pelo PRB
e presidente estadual do partido.