A palavra nepotismo possui sua origem no
latim - nepos, que significa neto ou descendente. Assim,
conceitua-se como o favorecimento de parentes nas relações de trabalho ou
emprego.
Na área pública, sua prática é
totalmente vedada pelo ordenamento jurídico pátrio. A República é a forma de
governo do Brasil, conforme a denominação da Constituição da República
Federativa do Brasil e diversos de seus dispositivos (v.g., artigo
1º, caput). O interesse público, desse modo, prevalece sobre os
interesses meramente pessoais daqueles que dirigem a Administração Pública,
pois os bens e entes estatais pertencem ao povo, e não aos governantes.
Portanto, para o preenchimento de funções de confiança e cargos
em comissão, declarados em lei de livre nomeação e exoneração, a autoridade
nomeante não deve possuir relações de parentesco com a pessoa a ser nomeada.
É importante analisar, nesse quadro, algumas das vertentes do
nepotismo, com o objetivo de coibi-lo em todas as suas formas, ainda que sejam
bastante veladas.
O nepotismo direto é
o mais evidente e fácil de ser constatado, consistente na reprovável conduta da
autoridade nomeante que designa seu parente para cargo comissionado em
estrutura administrativa sob sua gestão. Trata-se da modalidade clássica,
proscrita pelo artigo 37, caput, da Constituição Federal:
A administração pública direta e
indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência (...).
Também existe o nepotismo indireto, que possui outras vertentes,
todas engendradas para burlar a regra sob comento. Uma delas é o nepotismo
cruzado, em que duas ou mais autoridades realizam nomeações recíprocas de
parentes, com a finalidade de furtar a aplicação da lei. Por exemplo: prefeito
do município A nomeia parente do prefeito do município B, e vice-versa.
Além dessa, ainda existem outras subespécies de nepotismo indireto.
Cita-se, nesse sentido, aquela em que a autoridade nomeante designa parente de
outra autoridade do mesmo ente público, subentendendo-se o objetivo de auferir
vantagens políticas. Um exemplo recorrente dessa última subespécie de nepotismo
indireto ocorre quando o Prefeito nomeia parente de vereador para cargo
comissionado da prefeitura, mesmo não havendo nomeação na Câmara de parente do
chefe do Poder Executivo.
Como qualquer modalidade de nepotismo, tal prática é proibida
pelo ordenamento jurídico pátrio, porque, com tal conduta, são desrespeitados
os princípios da moralidade e impessoalidade, dentre outros basilares
postulados do Direito.
A doutrina encampa o entendimento
esposado acima, inclusive mencionando de forma específica a censurável nomeação
em questão (grifos nossos):
(...) será evidente a violação à moralidade e
à impessoalidade, princípios que vedam a prática de nepotismo quando a
autoridade cujos parentes foram nomeados, ainda que não retribua o favor, possa
influenciar a atuação funcional da autoridade nomeante. É o que ocorre, por exemplo, em relação
(1) ao Prefeito e aos Vereadores, reciprocamente, já que a atuação funcional de
qualquer dos dois influi na atuação do outro (...). Em síntese, sempre que
houver a interação funcional recíproca, de modo que uma autoridade tenha
interesse direto na atuação da outra, ter-se-á a violação à moralidade e à impessoalidade
quando um dos agentes nomear os parentes do outro. Essa figura, à evidência,
não é abrangida pela Súmula Vinculante nº 13, que somente faz referência às
“designações recíprocas”, mas isso em nada compromete a sua injuridicidade,
isso em razão da presumida troca de favores, que decorre não propriamente do imaginário
do operador do direito, mas, sim, das regras de experiência que caracterizam a
espécie humana e, em particular, o homem público brasileiro. A única peculiaridade é que os órgãos
competentes não poderão se valer da reclamação endereçada ao Supremo Tribunal
Federal, devendo percorrer as vias ordinárias.
É inegável a influência que a mencionada nomeação não recíproca
pode causar, colocando em cheque as necessárias separação e independência dos
Poderes - no caso, Executivo e Legislativo. Por isso, é imprescindível haver,
nessas situações, uma atuação firme da Justiça, visando a impedir tal prática.
Dessa forma, infringem-se os princípios norteadores da
Administração Pública ao se nomear, designar ou manter em cargo, emprego ou
função comissionados ou de confiança pessoa que possui parentesco com agente
político do mesmo ente público - União, estado, Distrito Federal ou município.
A proibição de nomear ou designar parentes para cargos comissionados
ou de confiança, assim como a respectiva manutenção, nasce diretamente da
Constituição Federal, notadamente dos princípios constitucionais da moralidade
e impessoalidade.
É desnecessária, por conseguinte, a
existência de lei infraconstitucional proibindo a nomeação, designação ou
manutenção de parente de agente político para cargo público comissionado ou de
confiança no mesmo ente público, conforme a jurisprudência consolidada do
Supremo Tribunal Federal, in verbis (grifos nossos):
Administração Pública. Vedação
nepotismo. Necessidade de lei formal. Inexigibilidade. proibição que decorre do
art. 37, caput, da CF. RE provido em parte. I - Embora restrita ao âmbito do
Judiciário, a Resolução 7/2005 do Conselho Nacional da Justiça, a prática do
nepotismo nos demais Poderes é ilícita. II - A vedação do nepotismo não exige a
edição de lei formal para coibir a prática. III - Proibição que decorre diretamente dos
princípios contidos no art. 37, caput, da Constituição Federal.
Ademais, é importante frisar que a
Súmula Vinculante 13 e a legislação federal, estadual e municipal não esgotam
as hipóteses de nepotismo, em razão de ser impossível antever todos os
expedientes e subterfúgios perpetrados para burlar os princípios e as normas em
apreço. Nesse sentido, encontra-se a recente jurisprudência do STF acerca do
tema (grifos nossos):
(...) A redação do enunciado da Súmula
Vinculante nº 13 não pretendeu esgotar todas as possibilidades de configuração
de nepotismo na Administração Pública, uma vez que a tese
constitucional nele consagrada consiste na proposição de que essa
irregularidade decorre diretamente do caput do art. 37 da Constituição Federal,
independentemente da edição de lei formal sobre o tema (...).
Ao editar a Súmula Vinculante nº 13, a
Corte não pretendeu esgotar todas as possibilidades de configuração de nepotismo na Administração Pública, dada a impossibilidade de se preverem e
de se inserirem, na redação do enunciado, todas as molduras fático-jurídicas
reveladas na
pluralidade de entes da Federação (União, estados, Distrito Federal,
territórios e municípios) e das esferas de Poder (Executivo, Legislativo e
Judiciário), com as peculiaridades de organização em cada caso. Dessa
perspectiva, é certo que a edição de atos regulamentares ou vinculantes por
autoridade competente para orientar a atuação dos demais órgãos ou entidades a
ela vinculados quanto à configuração do nepotismo não retira a possibilidade
de, em cada caso concreto, proceder-se à avaliação das circunstâncias à luz do
art. 37, caput, da CF/88.
De acordo com a Suprema Corte, configura
nepotismo a manutenção em cargo, emprego ou função comissionados ou de
confiança de pessoa que possui parentesco com agente político do mesmo ente
público:
(...) O reclamante, servidor efetivo do
Tribunal de Justiça, narra que foi indicado para exercer o cargo em comissão de
Assessor de Gabinete de Juízo de 1º Grau (...). Aduz que “o referido servidor
(ora reclamante) (...) se viu impedido de tomar posse no referido cargo em
comissão, por motivo de nepotismo, em virtude de que declarou, ao preencher um
formulário-declaração, um parentesco (3º grau) com (...) servidor não efetivo
do Tribunal de Justiça da Paraíba, que exerce o cargo em comissão de (...)”. Na
decisão do Conselho Nacional de Justiça, em Procedimento de Controle
Administrativo instaurado pelo reclamante, foi mantido o mesmo entendimento
pela conclusão de configuração de nepotismo conforme as regras estabelecidas na
Resolução CNJ nº 7 e na Súmula Vinculante nº 13 deste Tribunal. (...) In casu, o reclamado, ao
indeferir o pleito do reclamante, nada mais fez do que aplicar o enunciado da
Súmula Vinculante 13 ao caso concreto. Tendo a Reclamação constitucional,
dentre seus objetivos, o de preservar a autoridade das Súmulas Vinculantes
editadas pelo Supremo Tribunal Federal, verifica-se que, na hipótese dos autos,
não restou caracterizada qualquer desobediência ao conteúdo do verbete em
questão.
Conclui-se, dessa forma, que o nepotismo, na vertente direta ou
indireta, traduz-se em flagrante negação dos princípios mais basilares do
Direito Público, uma vez que demonstra indevida confusão entre interesses
público e privado. Trata-se de tema de extrema importância para a imagem
interna e externa dos entes estatais, devendo todo e qualquer agente público
obedecer às normas postas, em respeito ao povo brasileiro, verdadeiro detentor
do poder soberano e quem as autoridades constituídas efetivamente representam.
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