O Título XI do Código Penal trata dos crimes funcionais, praticados por determinado grupo de pessoas no exercício de sua função, associado ou não com pessoa alheia aos quadros administrativos, impregnando o correto funcionamento dos órgãos do Estado.
A reminiscência da prevaricação
iniciou-se com o surgimento do fenômeno jurídico na antiguidade e a origem de
uma compilação de 282 leis da antiga Babilônia (atual Iraque), reconhecida como
Código de Hamurabi, composto por volta de 1772 a.C. O código se fundamentou na
casuística. Estruturava-se em um rol oriundo do cotidiano, ou seja, fatos e
situações do cotidiano instituindo-lhes correspondentes sanções. No conteúdo da
compilação o capítulo II, Art. 5º, notabiliza-se pela aplicação da
imparcialidade do juiz, quando prevê penalidades para o que já chamavam de
prevaricação:
“Se um juiz julgou uma causa, deu uma sentença e exarou um documento
selado e depois alterou seu julgamento, comprovarão contra esse juiz a
alteração feita e ele pagará até doze vezes a quantia que estava em questão.
Além disso, fá-lo-ão levantar-se do seu trono de juiz da assembléia e não
tornará a sentar-se com os juízes em um processo." (VIEIRA, 2002, p. 11).
O termo prevaricação vem do latim
"praevaricare" e significa faltar com os deveres do cargo, torcer a
justiça. Paulo José da Costa Jr. ensina que é o ato de andar tortuosamente,
desviando do caminho certo. Para os romanos, prevaricação era conhecida por
patrocínio infiel. No Código Criminal do Império (1830) a conduta era prevista
no artigo 129 e o Código Penal Republicano, a conduta era prevista no artigo
207, mas sempre presente o elemento normativo do tipo, consubstanciado pelo
interesse ou sentimento pessoal, estudado na doutrina no campo do elemento subjetivo
especial do tipo.
O conceito da prevaricação no âmbito
da Administração Pública consiste no fato de o funcionário público
"retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou
praticá-lo contra disposição expressa de lei para satisfazer interesse ou
sentimento pessoal, conforme é descrito no CP:
Art. 319 - Retardar ou deixar de
praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição
expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:
Pena - detenção, de três meses a um
ano, e multa.
Art. 319-A. Deixar o Diretor de
Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o
acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação
com outros presos ou com o ambiente externo: (Incluído pela Lei nº 11.466, de
2007).
Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.
É importante evidenciar a necessidade
de o sujeito ativo ser funcionário público, e de compor o tipo subjetivo, além
do dolo, o elemento subjetivo do tipo, expresso no especial fim de agir “para
satisfazer interesse ou sentimento pessoal”, o chamado dolo específico na
doutrina tradicional. Na prática do fato o funcionário se abstém da realização
da conduta ; que está obrigado no exercicio de suas funções, ou a retarda ou a
concretiza contra a lei, com a destinação específica de atender a sentimento ou
interesse próprios. Trata-se diretamente de um crime próprio, que consiste em
um delito que ofende a Administração Pública, causando dano ou perturbando o
normal desenvolvimento de sua atividade. O funcionário não mercadeja sua
função, o que ocorre na corrupção passiva, mas a degrada ao violar dever de
ofício para satisfazer objetivos pessoais.
Prevaricação é um crime funcional, ou
seja, praticado por funcionário público contra a Administração Pública, onde o
Sujeito Ativo: É o funcionário público, na acepção do art. 327 do CP. Admite a
participação de particular. E o Sujeito Passivo: É o Estado, embora o
particular também possa ser lesado pela conduta típica.
A primeira conduta é a de retardar,
atrasar, adiar, protelar, protrair, procrastinar o ato de ofício que deve ser
executado em prazo prescrito, se existe, ou em tempo útil para que produza seus
efeitos normais. A segunda conduta típica é a de deixar de praticar o ato, a
omissão de quem não tem intenção de executa-lo. Por fim, a terceira é praticar
o ato de forma ilegal. Em qualquer caso, porém, é necessário que o agente
infrinja disposição expressa de lei, não bastando a violação do princípio da
moralidade. Não se pode falar em ato ilegítimo quando o funcionário tem certa
disposição na escolha da conduta a tomar, uma certa discricionariedade que lhe
é atribuída no exercício de suas funções.
O objeto de delito é o ato de ofício.
É necessário que o funcionário seja responsável pela função relacionada ao
fato, que esteja em suas atribuições ou competência. Se o ato foge ao âmbito da
competência funcional do servidor não se caracteriza o ilícito. É também
irrelevante para a lei penal que o ato deva merecer confirmação ou dele caiba
recurso.
Tipo Subjetivo: O dolo é a vontade de
retardar, omitir ou praticar ilegalmente ato de ofício, mas se exige o elemento
subjetivo do tipo que é o intuito de satisfazer interesse ou sentimento
pessoal. O interesse pode ser patrimonial, material ou moral. O sentimento,
estado efetivo ou emocional, poder derivar de uma paixão ou emoção (amor, ódio,
piedade, avareza, cupidez, despeito, desejo de vingança, etc.) O crime
caracteriza-se ainda que se trate de sentimento social, moral ou nobre, embora
tais motivações possam influir na fixação da pena.
Consumação e Tentativa: Consuma-se o
crime com o retardamento, a omissão ou a prática do ato. Nas formas omissivas,
não há que se falar em tentativa.
Tipo Qualificado: Tratando-se de
funcionário público ocupante de cargo em comissão ou de função de direção ou
assessoramento, de aplicar-se a causa de aumento de pena prevista no art. 327,
§ 2º, do Código Penal.
A prevaricação é um crime funcional,
isto é, um dos crimes que o agente público pode praticar contra o funcionamento
regular da administração pública em geral. O ato de ofício é definido pela lei
como o decorrente de trabalho do agente público, isto é, ato que deve ser
praticado pela própria natureza do trabalho do agente, mesmo que não seja
provocado para isso de forma específica. Seu retardamento, omissão ou a prática
desvirtuada, ou seja uma prática em desconformidade com as normas legais, do
ato devem ocorrer para a satisfação de interesse ou sentimento pessoal do
agente público.
“Crime funcional é uma definição que existe no direito brasileiro, que a
define como a infração da lei penal cometida intencionalmente (com exceção do
peculato culposo) por quem se acha investido de um ofício ou função
pública,praticada contra a administração pública. Está previsto nos artigos 312
a 327 do código penal brasileiro. Todo o tipo de crime funcional equivale a um
ato de improbidade administrativa”.
Tal retardamento do trabalho para
prejudicar um desafeto ou para beneficiar alguém de seu interesse é a conduta
fundamental que caracteriza o delito de prevaricação. Podendo esta ser
deliberada, movida por dolo, isto é, por vontade livre e consciente de agir ou
omitir-se. Caso o agente retarde a decisão de um processo administrativo pela
razão de necessidade do documento relevante para sua análise, por exemplo, o
retardamento é justificado, e não há configuração do crime. Se o agente público
não pratica ato de sua função ou o atrasa por simples impossibilidade, também
não há crime de prevaricação, bem como a inação devido ao excesso de trabalho,
sem que o funcionário haja dado causa à situação.
Conclusão:
Destarte, é obrigação do Estado
manter a ordem interna estabelecendo normas que dizem respeito a sua própria
organização ou às relações que mantém com os indivíduos; fazendo com que essas
normas sejam tuteladas e executadas, promovendo o fim a que elas visam. Em
face disso como o Estado é uma Pessoa Jurídica de Direito Público e suas
atividades têm de ser desempenhadas pela Administração Pública, esta terá o
papel de governar a sociedade com o fito de obter resultado harmônico em face
aos princípios constitucionais que cerceiam a Administração Pública, quais
sejam, a legalidade, a impessoalmente, a moralidade, a publicidade e a
eficiência.
É cediço que vivemos num Estado, este
que é um governo político do povo constituído em nação. Os representantes do
povo, exercem suas funções com o propósito de alcançar o bem comum através da
Administração Pública e reprimir as anomalias que surgem em seu decorrer. No
âmbito da Administração Pública, o crime de prevaricação reflete e afeta
diretamente todos os cidadãos dependentes do serviço publico, colocando em
crédito e a prova a credibilidade das instituições públicas, para apenas
satisfazer o egoismo e egocentrismo de interesses individuais, ou seja, trata
da administração pública como viés de singuralidade, quando na realidade é
fundamentalmente essencial para a coletividade. Tais mecanismos de combate
devem ser aplicados com rigor e aperfeiçoados para que estes desviantes do
serviço publico, tenham suas praticas de errôneas coibidas e extintas, podem
assim fortalecer as instituições publica e valorizar os servidores probos.
Bibliografia:
CAPEZ, Fernando. Direito Penal Parte Especial. ed. Saraiva 2004, volume
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JESUS, Damásio E. de Direito Penal Anotado. 12 ed. Saraiva. 2002. São
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JESUS, Damásio E. de. Direito Penal Parte Especial. 8. ed. Saraiva.
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MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal: Parte Especial. 21.
ed. Atlas, 2006, São Paulo.
PAGLIARO, Antonio. Dos Crimes Contra a Administração Pública. ed.
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