Carlos
Roberto Almeida da Silva
Quando se pensa em
transparência administrativa, a ideia primeira que nos vêm é a de publicidade
das ações dos governos, no entanto, são necessárias outras medidas que vão além
da simples divulgação dos serviços públicos realizados ou prestados à
sociedade. Transparência não é apenas disponibilizar dados, mas fazê-lo em
linguagem clara e acessível a toda a sociedade interessada. Dessa forma, dar
transparência é chamar a sociedade para participar dos rumos do Estado, é
motivar a decisão tomada e também divulgar todos os atos, salvo as exceções
normativas.
Neste artigo vamos enfocar o
princípio da transparência na Administração Pública e para atingir o objetivo
proposto, deslocamos o princípio da publicidade e o colocamos como um subitem deste
tema, por entendermos que este é um subprincípio, do princípio da
transparência, assim como da motivação e o da participação popular.
A transparência é um princípio
basilar da ideia de democracia, esta, surgida no curso da modernidade como meio
de superar os obstáculos impostos pelo então Estado absolutista, nos moldes
idealizados na Grécia clássica, quando os cidadãos reunidos em lugar público,
apresentavam proposta, votavam orçamento e determinavam o quanto de tributos
deveriam pagar para financiar as despesas públicas.
Na
Administração Pública brasileira, a transparência, que é decorrência do Estado
Democrático de Direito, este concebido pela Constituição Federal de 1988, visa
objetivar e legitimar as ações praticadas pela Administração Pública por meio
da redução do distanciamento que a separa dos administrados; se concretiza
segundo Martins Júnior (2010, p. 40) “pela publicidade, pela motivação, e pela
participação popular nas quais os direitos de acesso, de informação, de um
devido processo legal articulam-se como formas de atuação”.
Nos dias atuais, podemos
afirmar, com certa segurança, que não existe plena democracia, sem que haja o
rompimento da opacidade administrativa, pois não há como a primeira ser
realizada, pelo menos em sua plenitude, sem que a segunda seja superada. A opacidade
proporciona a corrupção[2], compromete a eficiência e a moralidade, das
decisões tomadas pela administração, segundo Martins Júnior (2010, p. 25) “o
caráter público da gestão administrativa leva em consideração, além da
supremacia do público sobre o privado, a visibilidade e as perspectivas
informativas e participativas, na medida em que o destinatário final é o
público”.
O público não deve ser visto
apenas como um contra ponto ao privado, mas sobre tudo, deve ser visto como
oposição ao reservado e ao secreto, nos limites legais.
O texto constitucional não promoveu a
explicitação da transparência no rol dos princípios constitucionais, o que,
segundo Maffini (2006, p. 9-10) “não lhe retira o status aqui
pugnado, como já sustentado por Jesús Gonzáles Pérez ‘os princípios gerais do
direito, por sua própria natureza, existem com independência de sua consagração
em uma norma jurídica positiva’”.
A
transparência administrativa tem como um de seus maiores expoentes e núcleo
jurídico, o princípio da publicidade, estampado no caput art. 37 da Constituição Federal, reforçado pelo
art. 5º,
incisos XXXIII[3], e XXXIV, b)[4], LXXII[5] restringindo-se a
intimidade e o interesse social, tal como estabelecido no inciso LX[6] do art. 5º da
nossa Carta Maior.
A
participação popular (interligada com o princípio da publicidade) é outro
importante princípio ou instrumento para forçar que se dê transparência aos
atos administrativos. Os incisos de I a IIIdo § 3º do art. 37,
da Constituição Federal, estabelece que a lei
disciplinará a participação do usuário na Administração Pública direta e
indireta, para regular o direito de representação quanto à qualidade do serviço
e a negligência e o abuso no exercício de função pública, bem como o acesso a
registros administrativos e a informações sobre atos de governo.
Na
esfera infraconstitucional, a lei nº 9.784, de
29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da
Administração Pública Federal, em seu art. 9º, abre a possibilidade de intervir no
processo administrativo os portadores de interesses indiretos e aos titulares
de interesses difusos e coletivos; prevê também a convocação facultativa de
audiências e consultas públicas (arts. 31 e 32), bem como outros meios de
participação dos administrados (art. 33). Por seu turno, a Lei Complementar
nº 101, de
04 de maio de 2000, veio estabelecer instrumento de transparência da gestão
fiscal, determinando ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos
(internet) de acesso público. Tal lei acrescenta que a transparência será
assegurada também mediante incentivo à participação popular e a realização de
audiências públicas, durante os processos de elaboração e de discussão dos
planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos (art. 48, parágrafo
único).
Na
mesma senda, a Lei nº 10.257, de
10 de julho de 2001 (art. 2º, II e XIII, 4º, III, f, e
V, s, 40, § 4º, 43 e 44), descreve entre os meios de gestão
democrática das cidades o referendo popular e o plebiscito, os órgãos
colegiados, a iniciativa popular de projeto de lei de desenvolvimento urbano, a
audiência e a consulta públicas, a publicidade e o acesso de qualquer
interessado aos documentos e informações no processo de elaboração do plano
diretor e sua fiscalização e na gestão orçamentária participativa. Segundo
Martins Júnior (2010, p. 42) “a transparência, então, se instrumentaliza pelo
subprincípio da participação popular”, e segundo o mesmo autor “o Estado e seus
Poderes só são realmente democráticos se visíveis e abertos ao povo forem suas
ações e o processo de tomada de decisões”.
Outra contribuição para a
formação do conteúdo jurídico do princípio da transparência é o princípio da
motivação, pela qual se impõe que toda a atividade da Administração Pública
deva vir acompanhada dos fundamentos que ensejaram a decisão, não bastando à
divulgação apenas do ato em si, mas as razões que determinaram a sua prática,
segundo Furtado (2010, p. 125) “ao motivar seus atos, deve o administrador
explicitar as razões que o levam a decidir, os fins buscados por meio daquela
solução administrativa e a fundamentação legal adotada”.
A motivação, além de garantir
a validade do ato, externa as razões da atuação da administração proporcionando
aos administrados conhecer, de forma transparente, os fins que a administração
deseja alcançar, como bem coloca Martins Júnior (2010, p. 43-44):
Como meio de externação dos
motivos condutores do ato e requisito de validade do ato, a motivação garante
aos administrados o conhecimento da razões e fundamentos e serve como parâmetro
para o diagnóstico da fidelidade aos princípios da Administração Pública e para
mensuração da materialidade, qualificação jurídica e adequação dos fato e da
decisão tomada, considerados o objeto e a finalidade.
O
princípio da transparência, embora não explicito entre os princípios do
artigo 37 da Constituição Federal, é uma norma de normas
jurídicas, pois assim são os princípios, norma de normas, e que por seu turno
tem caráter vinculante, constituindo um dever de quem esteja à frente da
Administração Pública e, concomitantemente, um direito subjetivo público do
indivíduo e da comunidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário