A delação premiada de Delcídio do Amaral é a primeira confissão de malfeitos por alguém da cúpula do Partido dos Trabalhadores e que era íntimo das esferas do poder tanto de Lula quanto de Dilma. O repórter Vladimir Netto traz os principais pontos do fogo que Delcídio ateou no PT e em vários partidos, inclusive da oposição.
Os 21 depoimentos do senador Delcidio do Amaral foram prestados em um prédio fora da Procuradoria-Geral da República, entre os dias 11 e 14 de fevereiro. O ex-líder do governo Dilma fez revelações que atingem senadores, ministros, empresários e até o ex-presidente Lula e a presidente Dilma. Os depoimentos eram sigilosos, mas, ao homologar o acordo, o ministro Teori Zavascki permitiu que eles viessem à público, na íntegra, na terça(15).
Na decisão, o ministro Teori Zavascki afirma que a delação de Delcidio está diretamente ligada à investigação sobre o plano montado para evitar que o ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró, firmasse um acordo de delação premiada na Lava Jato.
Delcidio do Amaral participou da trama, tanto que chegou a ser preso por isso, mas, nos depoimentos, disse que outras pessoas estão envolvidas, entre elas a família do pecuarista José Carlos Bumlai e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
De acordo com Delcidio, Lula pediu "expressamente para que ele ajudasse o amigo José Carlos Bumlai porque supostamente ele estaria implicado nas delaçôes de Fernando Baiano e Nestor Cerveró". A defesa de José Carlos Bumlai informou que ele sempre negou enfaticamente essas acusações.
Delcídio disse ainda que Lula "teve participação em todas as decisões relativas às diretorias das grandes empresas estatais, especialmente a Petrobras". Segundo o senador, a indicação de Nestor Cerveró para a área internacional foi discutida com Lula e a bancada do PT de Mato Grosso do Sul, no Palácio do Planalto, em 2003.
O Instituto Lula disse que não comenta falatórios e quem quiser levantar suspeitas em relação ao ex-presidente Lula que o faça diretamente e apresente provas ou não merecerá resposta. Procurados pela TV Globo, os advogados de Lula não se manifestaram.
Delcídio afirmou que Dilma Rousseff também acompanhava nomeações. Segundo ele, a presidente teve, por exemplo, conhecimento e participação na nomeação de Nestor Cerveró para a BR Distribuidora em 2008, ao contrário do que ela declarou.
Delcídio revelou ainda que foi montado um esquema de corrupção na usina de Belo Monte e que "a propina de Belo Monte serviu como contribuição decisiva para as campanhas eleitorais do PT e do PMDB de 2010 e 2014". Delcídio disse estimar que as contribuições para campanhas dos dois partidos giraram em torno de R$ 45 milhões. O PT e o PMDB vêm afirmando que todas as doações recebidas estavam dentro da legalidade.
Delcídio também afirmou que o vice-presidente Michel Temer foi o padrinho da indicação de João Henriques, preso na Lava Jato, para a diretoria da BR Distribuidora, durante o governo FHC, e que Henriques era o "principal operador" de um esquema de aquisição ilícita de etanol de 1997 a 2001.
Delcídio contou que, em 2008, Michel Temer "teve grande influência na substituição de Nestor Cerveró por Jorge Zelada", outro ex-diretor da Petrobras preso na Lava Jato. Em resposta, Michel Temer declarou que nunca foi padrinho de João Augusto Henriques.
Delcidio também falou sobre vários parlamentares, como o senador Renan Calheiros, que apoiaram a permanência no cargo do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa, o primeiro delator da Lava Jato. Esse time da bancada do PMDB no Senado, segundo Delcidio, também atuou em obras como a usina de Jirau e Belo Monte, e buscava indicar nomes para cargos no governo. Renan Calheiros disse que as citações não são procedentes.
Delcídio falou ainda do senador Aécio Neves, presidente do PSDB. Disse que teve conhecimento de um grande esquema de corrupção que ocorria em Furnas e que confirma a participação do tucano nesse esquema.
Delcídio disse que, em uma conversa com Lula durante uma viagem a Campinas (SP), o então presidente perguntou-lhe quem era Dimas Toledo. "Um companheiro do setor elétrico, muito competente", respondeu Delcídio. Ao que Lula teria explicado: "Eu assumi e o Janene veio me pedir pelo Dimas, depois veio o Aécio e pediu por ele. Agora o PT, que era contra, está a favor. Pelo jeito ele está roubando muito", teria dito Lula, segundo Delcídio.
O senador contou que, quando presidia a CPI dos Correios e a comissão decidiu quebrar o sigilo do Banco Rural, Aécio Neves era uma das pessoas que ficou incomodada com essa quebra. Delcídio disse que Aécio enviou emissários para pedir que o prazo da entrega das informações fosse ampliado.
Delcídio afirmou que foi convencido e concordou em dar mais prazo para o banco apresentar os dados, mas, ao receber as respostas, percebeu, com surpresa, que o tempo fôra utilizado para maquiar os dados do Banco Rural e que eles atingiriam em cheio as pessoas de Aécio Neves e Clésio Andrade, então governador e vice-governador de Minas Gerais.
O senador Aécio Neves disse que Delcídio faz acusações falsas.
"A lista de Furnas já teve seu autor condenado a mais de sete anos, cumpriu pena em Minas, ainda é investigado e processado por inúmeros crimes e essa lista de Furnas, na verdade, não é uma, mas várias listas para todos os gostos, constituída para chantagar determinados agentes políticos, inclusive do PT", diz o senador Aécio Neves (PSDB/MG).
Pelo acordo assinado com o Ministério Público Federal, Delcidio ficará dois anos e meio em prisão domiciliar e depois terá que prestar mais seis meses de serviços à comunidade, além de ficar à disposição das autoridades para novos esclarecimentos. Esses depoimentos que ele já prestou vão ser usados pelos investigadores para abrir várias frentes de trabalho.
Na avaliação de alguns procuradores e delegados da Polícia Federal, diante das informações de Delcídio, o ex-presidente Lula pode acabar sendo investigado no mais importante inquérito da Lava Jato no Supremo: o que apura se foi montado uma organização criminosa, com ajuda de políticos, na Petrobras.
A defesa do ex-diretor de Furnas, Dimas Toledo, afirmou que as declarações de Delcídio do Amaral são despropositadas e fruto de especulações de quem busca benefícios em troca de colaboração.
Michel Temer declarou que a indicação de João Augusto Henriques foi feita pela bancada do PMDB na Câmara, assim como a indicação de Jorge Zelada.
João Henriques só vai se manifestar no momento oportuno.
A defesa de Clésio Andrade disse que desconhece o teor da delação e, por isso, não comenta.
A defesa do ex-diretor de Furnas, Dimas Toledo, afirmou que as declarações de Delcídio do Amaral são despropositadas e fruto de especulações de quem busca benefícios em troca de colaboração.
Nenhum comentário:
Postar um comentário