GACC - Grupo de Assistência à Criança com Câncer

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Desde o início de suas atividades, em 1996, o GACC - então Grupo de Apoio à Criança com Câncer - existe para aumentar a expectativa de vida e garantir a oferta e a qualidade global do tratamento oferecido integral e indistintamente a crianças e jovens com câncer, diagnosticados com idades entre 0 e 19 anos incompletos, independente de sexo, cor, religião ou posição socioeconômica.

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Bizz: A revista que mudou sua vida voltou

O período entre 2002 e 2004 foi muito esquisito. O cenário musical não se renovara, a maior parte das bandas dos anos 90 havia implodido, o circuito independente não se estabelecera, o mainstream estava em ruínas e eu havia sido ejetado do mundo da carteira assinada. ABizz, a revista pela qual eu comecei a escrever, havia acabado no ano 2000. O Zap!, o caderno que havia me dado a primeira chance, havia sido encerrado em 2001, a General muito antes disso. Meu livro, Dias de luta, com o qual eu imaginava adentrar no clube dos escritores milionários, teve sua primeira tiragem esgotada em dois tempos e a editora não se interessou em relançá-lo. Lá em casa as contas eram mantidas com o salário de fonoaudióloga da minha linda esposa e com eventuais free-lances de texto que apareciam numa Carta Capital aqui, uma Vida simples acolá, e em press-releases para duplas sertanejas e cantores de forró universitário que eu fazia sem assinar.

Vivia um dilema de função, que progrediu para um dilema de vocação. Um pouco mais, eu reformava Os Cleggs para uma turnê mundial caça-níqueis que, como se sabe, é o ponto seguinte à obsolescência completa. Decidi voltar a morar em Jundiaí, num passo consciente para fora do showbiz. Foi nessa fase que o jornalista José Ruy Gandra me ligou para integrar a equipe responsável por edições especiais que a Editora Abril havia criado sob o comando de Paulo Nogueira.

Eu já havia moralmente desistido do jornalismo, especialmente do musical, então usava o que sabia sobre edição a serviço das experiências editoriais da Abril, de especiais sobre plantas, carros ou viagens, que poderiam ou não (normalmente não) se transformar em títulos fixos da casa. Num redemoinho muito louco da vida, de tudo o que eu coloquei a minha mão pouco convicta, o único título que germinou foi justamente a Bizz.





A série "A história do rock brasileiro" foi a semente para a volta da Bizz 

Começou no início de 2004, quando adentrei na sala do Paulo Nogueira com o primeiro volume da Q Special Edition: 50 Years of Rock’n’roll 1954-2004, um ótimo modelo a copiar. Sugeri que fizéssemos uma versão brasileira, misturando o arquivo da Abril (RealidadePop,Bizz e outras) a material inédito, numa série de revistas com acabamento “premium” e preço mais alto, que depois fossem reunidas numa caixa dura e ficassem com cara de objeto de arte. Paulo, beatlemaníaco praticante, adorou a idéia. E recomendou que eu tratasse dos detalhes com Adriano Silva, diretor de redação da Superinteressante, que emprestaria a “marca” sob a qual a série seria lançada.

Adriano era estrela em ascensão vertiginosa na editora, justamente por seu destemor em apostar e rentabilizar suas apostas e também por conciliar como poucos os aspectos publicitários e editoriais do jornalismo. Gaúcho, levemente mais velho que eu, igualmente órfão da Bizz, havia vivido tanto o rock brasileiro dos anos 80 quanto o dos anos 90 e lido oDias de luta. A sintonia foi imediata. Montei uma pequena equipe, liderada pelo grande Luciano Marsiglia e, depois de A história do rock brasileiro, começamos a trabalhar em edições para as bancas de DVDs musicais e em uma nova série de luxo, desta vez sobre o rock internacional.

No meio do caminho, nas tradicionais reorganizações anuais da editora Abril, Adriano foi promovido para diretor de núcleo – o Núcleo Jovem, que congregava todas as marcas da casa direcionados ao público de 12 a 29 anos, entre ativas e inativas. E entre elas, senhoras e senhores, estava a da revista Bizz.

(Paulo Nogueira foi convidado a assumir a direção editorial da Editora Globo, numa revolução de qualidade e processos que nunca havia visto no meio impresso – e desconfio que nunca mais verei.)

Assim, além de mudarmos de andar, também readaptamos todos os projetos especiais em que trabalhávamos, para que saíssem com a marca da Bizz. Anunciamos ao mercado publicitário que aquela era a nova encarnação da revista, mais adequada aos novos tempos: edições especiais, colecionáveis, chiques, direcionadas ao público jovem levemente mais velho. Publicamos a série com a história do rock internacional, os DVDs e duas edições caprichadíssimas baseadas em listas: As 100 maiores capas de discos de todos os temposOs 100 maiores shows no Brasil de todos os tempos. Eu havia montado uma equipe de apaixonados movidos pela alegria de trazer a Bizz de volta (“tudo o que a gente queria, embora não do jeito que a gente queria”, disse o Marsiglia), trabalhávamos com o pequeno borderô dedicado aos especiais do Núcleo Jovem, vivíamos à margem de qualquer meta publicitária da editora e acreditávamos que poderíamos continuar assim por tempo indeterminado. Até chegarem os primeiros relatórios de venda.

Não existe revista de música grande em nenhum lugar no mundo. No Brasil, no ano de seu lançamento, a Bizz chegava a 70 mil, enquanto a Capricho esbarrava no milhão de exemplares.  Em dado momento, no início dos anos 90, na efervescência do Rock in Rio e da MTV, passou dos cem mil leitores. Acabou no meio de uma trapalhada corporativa entre a Abril e a editora Símbolo, dizem, vendendo ali seus 18 mil. Quatro anos depois, o mundo havia rodado muitas vezes, e se chegássemos a esse número estaríamos vivendo um sonho dourado.

Os novos relatórios dos nossos especiais diziam que entre 5 e 7 mil pessoas compravam nossos especiais com a marca Bizz. Já vi shows no Ginásio da Esportiva em Jundiaí com mais gente que isso. Meus livros venderam mais do que isso. Mas tínhamos um fato ali: nossas revistas com o Bono e o Renato Russo na capa vendiam menos do que os especiais de inteligência emocional ou sobre animais do triássico.
Hoje vejo que estávamos sentados em uma montanha de cacos: o negócio da música, algo que ia muito além do music business. Àquele ponto, já era claro que a indústria fonográfica era um bicho morto e enterrado, mas, por miopia, nos parecia que tudo não passava de uma mudança de plataforma. Algo que Frank Zappa já predissera nos anos 80: que, uma vez digitalizada a música, não fazia sentido recolocá-la em um suporte físico de volta. Sobre isso estávamos todos de acordo – gravadoras à parte. De resto, imaginávamos, todo o nosso mundo continuaria igual.

Bem, caro leitor, não era apenas uma questão de plataforma. O mp3 só acelerou um processo que já galopava, o de barateamento, de banalização da nossa relação pessoal com a música. Entrávamos em um mundo inundado por música por toda parte – e, qualquer noção básica de economia alerta para a desvalorização de qualquer bem tão fartamente disponível. O fato de não pagarmos mais por ela, seja em downloads ilegais ou cópias falsificadas de CDs, não era a causa, mas o efeito de anos e anos de miniaturização, da praticidade vencendo a qualidade, de artistas descartáveis e do fim de qualquer sentido estético para a música pop. Tente se lembrar entre seus amigos de escola, se alguém ousava se apresentar como fã de música sertaneja ou, como dizíamos, “música brega”. Nada disso. Havia pudores, porque havia um senso estético cobrindo todos nós – chame de “preconceito” ou como quiser, o fato é que foi esse senso estético que criou o rock brasileiro dos anos 80, o melhor dos anos 90 e tudo o que lembramos além da era do descartável.

E, num mundo sem julgamento estético, “sem medo de ser feliz”, sem pudores artísticos, que diferença uma revista de música pode fazer? Não sei, e sabia muito menos em 2005. Lembro das reações a cada nova revista que lançávamos na aurora das redes sociais: “Who cares?” diziam sempre. Quem se importa? Ninguém se importa, de fato.

Diante das números magrinhos, à margem da operação “oficial” da editora Abril, sem nenhum respaldo mais científico, acreditamos naquilo que queríamos acreditar: que o Brasil não desejava a Bizz assinando edições especiais, mas em seu velho e bom formato mensal, com os jornalistas de antigamente e as colunas e seções de antigamente, com a “Discoteca básica” e a “Cabra-cega”. Arrumamos uma brecha jurídica que nos permitiu retomar a numeração interrompida cinco anos antes e, embora continuássemos tecnicamente como um especial da editora, agora teríamos especiais mensalmente nas bancas. Assim, num triunfo da esperança sobre o bom-senso, em agosto de 2005, a Bizzvoltou.

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