GACC - Grupo de Assistência à Criança com Câncer

GACC - Grupo de Assistência à Criança com Câncer
Desde o início de suas atividades, em 1996, o GACC - então Grupo de Apoio à Criança com Câncer - existe para aumentar a expectativa de vida e garantir a oferta e a qualidade global do tratamento oferecido integral e indistintamente a crianças e jovens com câncer, diagnosticados com idades entre 0 e 19 anos incompletos, independente de sexo, cor, religião ou posição socioeconômica.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

JUBILEU DE PRATA Em 25 anos de STF, Marco Aurélio capitaneou a modernização da corte

“Dê meia volta”, ordenou o presidente do Supremo Tribunal Federal ao motorista. O carro estava a caminho de uma posse no Tribunal Superior do Trabalho e o ministro Marco Aurélio, então presidente do STF, acabara de ser informado que os cerimoniais da corte e da Vice-Presidência da República estavam brigando.
O presidente da República não poderia comparecer ao evento e mandara o vice em seu lugar. Aí que começou a briga entre cerimoniais: ditam as regras de costume que o presidente da República sempre fica com a cadeira mais importante. Se ele não está, o lugar de destaque fica com os chefes dos demais poderes, primeiro Legislativo e depois Judiciário. O vice-presidente só herda a honraria do colega de chapa se estiver no exercício da Presidência. Do contrário, a cadeira central deve ir para outro chefe de Poder.
Só que o cerimonial da Vice-Presidência parecia desconhecer os detalhes da norma. E de tanta intransigência a briga chegou aos ouvidos de Marco Aurélio. Ele não pensou duas vezes antes de dar a ordem ao motorista. Para o ministro, uma desfeita ao presidente do Supremo Tribunal Federal é uma desfeita ao Poder Judiciário – justamente o pedaço do Estado cuja principal função é garantir os direitos de todos os cidadãos. Em última instância, era uma afronta à forma com que a sociedade escolheu se organizar.
Eventualmente o vice-presidente também soube da discórdia e mandou avisar o cerimonial do Supremo que a cadeira central pertencia ao ministro Marco Aurélio.
O episódio, à primeira vista prosaico, até folclórico, é também preciso. A partir dele se conclui de que forma o ministro usa a toga que veste. “A importância, como julgador de uma cadeira no Supremo, não tem igual. Somos 11 em 205 milhões.”
No último sábado (13/6), o ministro Marco Aurélio Mendes de Farias Mellocompletou 25 anos como integrante do Supremo Tribunal Federal. Um mês depois, no dia 12 de julho, completa 69 anos. “Estava de saída, pois completo 70 anos em 2016, mas veio essa PEC. Agora saio em 2021, aos 75. Mas espero não precisar de uma bengala tão cedo”, brinca, ao comentar a Emenda Constitucional que mudou a idade da aposentadoria compulsória para 75 anos, a PEC da Bengala.
Na telinha
Foi com o Supremo em mente que o ministro criou a TV Justiça. E é ela quem torna o STF a suprema corte mais transparente do mundo.
Inicialmente uma ideia para, à semelhança do que já acontecia com a TV Senado e com a TV Câmara, divulgar o Poder Judiciário, o canal de televisão hoje é uma instituição que praticamente faz parte do sistema de Justiça brasileiro.
Marco Aurélio esteve em todas as etapas. Da concepção da ideia à sanção da lei que instalou o canal e o tornou obrigatório em todos os serviços de TV a cabo. O canal fundou-se num tripé: transmissão dos julgamentos, produção jornalística e produção de conteúdo educativo.
Nem por isso se tratou de tarefa fácil, embora convencer o país de que era uma boa medida não tenha sido difícil. O anteprojeto de criação da TV saiu do gabinete do ministro, e entre negociar com o Ministério das Comunicações e com o Congresso e a lei ser efetivamente aprovada foram oito meses. Inegavelmente um tempo recorde.
Marco Aurélio sancionou a lei como presidente da República em exercício. Depois que o projeto já estava pronto para ser aprovado, o então presidente do STF pediu ao senador Ramez Tebet que segurasse o texto.
O ministro sabia que dali a alguns dias assumiria a Presidência da República, já que todos os demais aptos a fazê-lo estariam impossibilitados. Num jantar, encontrou o presidente Fernando Henrique Cardoso e pediu que ele adiantasse o que faria com a TV Justiça. Se fosse para sancionar, pediu Marco Aurélio, gostaria de fazê-lo, no exercício da Presidência. Se fosse para vetar, que o próprio FHC cuidasse do assunto.
“Sanção e veto são seus”, respondeu Fernando Henrique. E assim, para júbilo do então presidente do STF e desgosto de boa parte dos colegas de corte, foi criada a TV Justiça.
Pela segurança
A resistência interna foi capitaneada pelo então decano, ministro Moreira Alves. Em entrevista à ConJur publicada em agosto de 2012 ele explicou sua posição. Disse que a transmissão dos julgamentos poderia passar a ideia de que o Plenário “é uma arena de discussões”. E segundo ele, depois da TV, as sessões passaram a ficar longas demais, pois os ministros “hoje falam para aparecer na televisão”.
Às vésperas da entrada no ar da TV Justiça, em 2002, um ministro procurou Marco Aurélio para se opor à transmissão. “Deveríamos repensar esse projeto de transmitir ao vivo as sessões do Supremo. A exposição será muito grande. Há o risco de levarmos tomates nas ruas”, disse o juiz. E Marco Aurélio de pronto rebateu:
Não posso responder por Vossa Excelência, mas o que eu faço em Plenário certamente não merecerá tomates.
Mas o fato é que, à cerimônia de sanção da lei, só compareceram os ministros Sepúlveda Pertence e Ellen Gracie. Também estava lá o hoje ministro Gilmar Mendes, que ainda ocupava a cadeira de Advogado Geral da União. Durante alguns anos, a transmissão das sessões do Pleno eram gravadas e transmitidas depois. Foi o ministro Maurício Corrêa, quando presidente do STF, quem autorizou a transmissão ao vivo. Nunca houve qualquer edição, mas confortava os mais antigos saber que, se quisessem, poderiam mandar cortar algumas falas.
O acidente
Marco Aurélio chegou à magistratura em 1978, quando ingressou no Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região. Ele era membro do Ministério Público do Trabalho, mas foi nomeado juiz do Trabalho em uma vaga destinada ao quinto constitucional da advocacia.
Na época, a Constituição estabelecia que o Ministério Público Federal acumulasse a representação da sociedade e a defesa do Estado. E também era permitido aos procuradores advogar. O mesmo acontecia com os integrantes do MPT: representavam os interesses do trabalhador, mas podiam advogar. E Marco Aurélio advogava.
Chegou à comunidade jurídica quase que por chamado. Seu pai, Plínio Affonso de Farias Mello, era advogado do Banco do Brasil e dono de uma imobiliária. O jovem Marco Aurélio ajudava na empresa do pai e por isso decidiu cursar o científico, já de olho na faculdade de Engenharia. Até 1967, o ensino médio era dividido entre científico, normal e clássico. Quem pretendia estudar Direito optava pelo clássico, que tinha ênfase nas ciências humanas. O científico era para os mais ligados às ciências exatas.
Mas aos 20 anos, em 1966, o hoje ministro sofreu um acidente. Morava “num casarão” na Tijuca, Zona Norte do Rio de Janeiro. Uma noite, sonâmbulo, atravessou uma porta de vidro e sofreu diversos cortes profundos. Mudou-se para uma chácara da família, perto de Cabo Frio, para se recuperar. Quando voltou ao Rio, desistiu da Engenharia e seguiu o sonho de estudar Direito. Formou-se em 1973, na Faculdade Nacional de Direito, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Questão de hábito
Foi em 1977 que Marco Aurélio começou a desenvolver seu estilo de falar. Quem já conversou com ele certamente se espantou com a precisão ortográfica do discurso. Jornalistas que já tiveram a oportunidade de entrevistá-lo sabem que raramente é preciso revisar a transcrição. O ritmo da fala do ministro é o da gramática: ele fala por escrito.
Não é proposital. Desde que estava na Procuradoria do Trabalho se manifesta sem escrever. Fala a um gravador para que depois a manifestação seja transcrita por assessores. E como o parecer tinha de sair pronto para a revisão jurídica, o português tinha de ser correto e de fácil compreensão. E quem convive com ele brinca que, de tanto falar em português correto, o ministro se esqueceu de “virar a chave”. Conversa com amigos em situações reservadas como se estivesse num pronunciamento público.
Até hoje o ministro vota num gravador. A diferença é que em 77 ele usava um Ditafone. Era um avanço tecnológico dos anos 70 que se tornou um trambolho: um gravador de fita magnética de dois rolos com um microfone. Hoje, um gravador digital que cabe na palma da mão é quem faz o trabalho. Depois o voto é degravado “por uma moça que é a pessoa que mais me ouve na vida”. Já no papel, o texto passa por uma revisão de estilo feita por um setor do gabinete chefiado por uma profissional graduada em Letras. E só então vai para a revisão jurídica.
Por isso é que Marco Aurélio faz cinco votos no mesmo tempo que um colega faz um ou dois, conta feita pelo próprio vice-decano. “O segredo de gravar é não querer ver o que você já gravou. Se ficar retroagindo a fita, você se perde, e, ao invés de ganhar tempo, perde tempo. A gravação é uma marcha.”
Em Brasília
Marco Aurélio ficou pouco no TRT-1. Em 1981 foi nomeado ministro do Tribunal Superior do Trabalho, movimento que hoje já não poderia mais fazer. A legislação atual estabelece que, para ingressar no TST por meio de uma vaga da carreira, é preciso que se tenha chegado ao tribunal de origem por meio de promoção, e não pelo quinto constitucional.
E é à passagem pela Justiça do Trabalho que o ministro atribui “essa sensibilidade maior no proceder e na arte de julgar conflitos de interesses”. Já o TST foi a escola definitiva para “saber julgar entre pares”.
O Supremo, ensina, é um colegiado de pares. Todos são iguais a despeito das diferenças de formação. O presidente, diz o ministro, é um coordenador de trabalhos, jamais um chefe.
Mas se hoje é uma espécie de ministro-modelo, Marco Aurélio garante que jamais cogitou de ingressar no STF. “Estava muito feliz no TST. Na época em que fui nomeado estava na Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho. Em breve seria eleito vice-presidente do tribunal e, depois, presidente”, lembra.
O nome dele passou a ser cogitado para o Supremo ainda durante a presidência de José Sarney, que durou de 1985 a 1989. O tribunal começava a receber importantes recursos tratando de matéria trabalhista e esse ramo da Justiça, prestes a completar 50 anos, nunca tivera um representante na mais alta corte do país.
Só que quando Marco Aurélio se tornou o candidato da Justiça do Trabalho ao Supremo, Fernando Collor, seu primo, já havia aparecido no cenário nacional como presidenciável. Uma das bandeiras do jovem candidato era a de “caçador de marajás”, e Sarney era apontado por ele como um representante da “velha política”.
Àquela altura, Marco Aurélio era um favorito absoluto à cadeira. O ministro Carlos Madeira havia chegado aos 70 anos e teve de sair pela aposentadoria compulsória. O problema era que outra bandeira da campanha de Collor era acabar com o nepotismo na política.
Como fazer para indicar um primo ao STF? Em retrospecto, a resposta foi simples. Collor pretendia nomear um membro de tribunal superior e sabia que o recém-criado Superior Tribunal de Justiça estava tomado por disputas internas por poder. Consultou o STJ e o TST sobre quem seriam os candidatos de cada tribunal. O STJ respondeu que todos os ministros eram candidatos. O TST, que Marco Aurélio era o nome da Justiça do Trabalho brasileira. “O presidente pôde, então, ficar bastante à vontade para me indicar”, lembra o ministro.
Velha guarda
O ministro Marco Aurélio costuma comparar a composição atual do Supremo com a “velha guarda” do tribunal. É como ele se refere à composição que encontrou quando chegou ao STF: Moreira Alves; Ilmar Galvão; Néri da Silveira; Aldir Passarinho; Sydney Sanches; Octavio Gallotti; Célio Borja; Paulo Brossard; Sepúlveda Pertence; e Celso de Mello.
Normalmente, a comparação é para criticar alguma prática que nasceu com a composição atual. Exemplo já clássico é, nas votações em lista, a transformação de embargos de declaração em agravo de instrumento. É um dos famosos votos vencidos do ministro.
O que o Plenário costuma fazer é, ao se deparar com um embargo de declaração, instrumento usado para apontar omissão, contradição ou obscuridade no acórdão, transformar o recurso em agravo de instrumento, usado para recorrer de decisão inapelável. Fazem isso porque é comum a interposição de embargos para questionar o mérito das decisões, o que seria inadequado.
Marco Aurélio explica que esse movimento decorre do princípio da fungibilidade. “Toma-se o recurso pelo que seria adequado, na contramão”, critica. A reclamação do ministro é que, transformado o embargo em agravo, o Pleno desprovê o recurso afirmando que a parte não atacou todos os fundamentos da decisão. “Mas calma, ela não interpôs agravo! O que ela interpôs foram embargos de declaração para, decidido esse recurso, posteriormente, poder manusear ou não um agravo”, comenta. “Discordo, e me convençam.”
Corte Moreira Alves
Só que também foi a mesma velha guarda que tornou a vida do ministro bastante difícil no Supremo. Marco Aurélio aponta sempre para o ministro Moreira Alves, o eterno decano. Ele chegou ao Supremo em 1975, aos 42 anos, nomeado pelo presidente Ernesto Geisel depois de ter sido o procurador-geral da República do presidente Emílio Médici. Entrou para a história como um dos mais jovens a ser nomeado à cadeira e também como um dos que ficou nela por mais tempo.
Moreira Alves foi ministro durante quase 28 anos e por mais de dez foi o decano. Era tido como um conservador, embora, como já escreveu o ministro Gilmar Mendes, “o desenvolvimento e significativas conquistas relacionados com a jurisdição constitucional no Brasil estejam indelevelmente associados” ao ministro.
Como decano, Moreira Alves forçava seus entendimentos. Logo depois do voto do relator, começava a discutir a questão e a tentar desconstruir, sem a mesma elegância ou ironia do ministro Marco Aurélio, os argumentos dos colegas. Essas duas características fazem com que alguns estudiosos se refiram ao Supremo da época em que Moreira Alves foi decano como “Corte Moreira Alves”.
E foi a Corte Moreira Alves que viu na nomeação de Marco Aurélio algo menor: era oriundo da Justiça do Trabalho e primo do presidente que o indicou. Foi aquela composição, por exemplo, que criticou o novato por ousar divergir de um agravo apresentado pelo presidente da corte, o ministro Néri da Silveira. Marco Aurélio conta se tratar de um tabu vigente à época. Não era permitido divergir do presidente quando ele votasse em agravo.
Mas o ministro garante que nunca tentou se provar digno do cargo.
Sempre atuei com muita espontaneidade, e creio que o colegiado é um somatório de forças distintas. Nós nos completamos mutuamente e eu sempre busquei atuar adotando minhas posições, sem perceber essa cobrança implícita para saber qual seria o meu conhecimento em outras áreas do Direito.
Marco Aurélio se vê como um conciliador. Certa vez, recém-chegado ao STF, ofereceu um churrasco na casa dele e convidou todos os ministros. Néri da Silveira ainda era o presidente. Era um ministro singular. Extremamente formal no trato, de fala mansa, quase inaudível, e católico devoto, não era o tipo de pessoa que parecia confortável em eventos sociais. Dizia-se até que em seu gabinete não trabalhavam mulheres. O ministro se dizia sem jeito para despachar com funcionárias.
Quando fez o convite para o churrasco, Marco Aurélio avisou que estaria de bermudas, pois o evento era informal, apenas uma confraternização. Néri da Silveira obedeceu: chegou à casa de Marco Aurélio de sapato, calça social, camisa abotoada até o pescoço e paletó. Deixara a grava em casa, pois era só um churrasco.
Entre colegas
O ministro também garante que nunca teve problemas com o colegiado durante a presidência. O único desentendimento foi o episódio dos servidores.
O início do problema se deu entre a eleição de Marco Aurélio e sua posse do cargo. Ele avisou ao diretor-geral do tribunal que não trabalharia com servidores aposentados. As secretarias da Presidência eram tradicionalmente ocupadas por servidores que acumulavam as aposentadorias com os cargos. Não existia ainda o teto da remuneração do serviço público, e, por isso, esses funcionários recebiam contracheques bem maiores que os próprios ministros.
Ninguém gostou da medida. Como troco, o tribunal aprovou uma emenda regimental para obrigar o presidente a submeter todos os servidores que nomearia ao Plenário. “Foi uma atitude absurda, inaceitável, inadmissível e desrespeitosa”, afirmou Celso de Mello, hoje decano do tribunal.
O resultado se viu nas urnas. A regra de sucessão na Presidência do STF é que sempre é eleito o ministro mais antigo que nunca presidiu a corte. Tradicionalmente as eleições se dão por 10 votos a um: o candidato jamais vota nele mesmo. Marco Aurélio foi eleito com 9 votos. Moreira Alves também não votou nele.
O decano estava insatisfeito com a demissão do médico do tribunal, Célio Menicucci. Ele trabalhava no Supremo há mais tempo que a maioria dos ministros e é uma figura folclórica de Brasília – foi médico do presidente Juscelino Kubistchek, por exemplo.
A participação do ministro Carlos Velloso, presidente que antecedeu Marco Aurélio,  na movimentação contra o presidente do STF recém-eleito também foi sentida. Conta-se que ele, propositalmente, demorou para marcar a cerimônia de posse do colega. Até hoje os dois não mantêm boa relação.
Questão de opinião
Isso não quer dizer que o ministro seja uma vítima. Não são raros os exemplos de embates, alguns históricos, que teve com colegas em Plenário. A diferença, garante, é que essas disputas jamais saem do Plenário.
O embate mais sério que teve foi com o ministro Joaquim Barbosa. Foi em um dos casos mais importantes da história recente do Supremo: a permissão da interrupção da gravidez no caso de feto anencefálico. Marco Aurélio, relator, concedera liminar para permitir o aborto e depois levou o caso para o Plenário.
Barbosa reclamou. Disse que a questão era muito complexa para uma decisão monocrática. Marco Aurélio se irritou:
Ministro, vamos parar com as agressões, porque o local não é este. Mas se Vossa Excelência quiser, lá fora, eu estou à sua disposição.
Anos depois, já em 2015, o ministro Marco Aurélio disse à ConJur que não guarda qualquer rancor de Joaquim Barbosa. “Ele tinha algo interessante. Era uma coisa na sala do lanche, nas conversas com os colegas, fora do ambiente de julgamento. Mas com a capa, para tornar prevalecentes suas ideias, ele às vezes atropelava, partindo para uma postura mais agressiva.”
Embora protagonize algumas discussões, o perfil do ministro é apaziguador. Ele teve, por exemplo, uma rusga com o ministro Luis Roberto Barroso durante o julgamento da Ação Penal 470. Marco Aurélio votava pelo não recebimento de embargos de declaração, e fez ponderações: “Os olhos da nação estão voltados para o Supremo. Considero em termos institucionais uma assentada de simbolismo maior. Para aqueles que o acompanham as emoções do julgamento devem estar sendo intensas”.
Barroso respondeu: “Eu nesta vida, neste caso e em outros, faço o que acho certo, independentemente da repercussão. Não sou um juiz que me considero pautado pela repercussão”. “Não me considero um juiz pautado pelo o que vai dizer o jornal do dia seguinte, que aguarda uma manchete favorável”, continuou. 
E ouviu a tréplica: “Veja que o novato parte para uma crítica ao próprio colegiado, como partiu em votos anteriores. Disse, inclusive, que se estivesse a julgar não decidiria da forma com que decidimos. Não respondi à crítica porque foi para mim. Não foi velada, mas crítica direta. [Não respondi] porque achei que não era bom”. 
História e futuro
Durante os últimos 25 anos, ficou patente que o envolvimento de Marco Aurélio nas discussões do Supremo Tribunal Federal fizeram a corte se modernizar e se moldar à Constituição Federal de 1988 — "a lei que a sociedade fez para o Estado, jamais o contrário", como define o ministro Ayres Britto.
E é em outra característica do ministro que o impulso por modernização é mais notório: o voto vencido. Quando Marco Aurélio tomou posse da Presidência do Supremo, o discurso de homenagem ficou a cargo do ministro Celso de Mello. E ele ressaltou que os pronunciamentos do STF devem ser "paradigma de reflexão no esforço da construção da cidadania". E nisso, declarou o hoje decano, os votos vencidos sáo fundamentais, pois "iluminam os nossos caminhos, ajudando-nos a forjar, em nossos espíritos, a consciência superior da liberdade e da cidadania".
Dificilmente alguém analisou a questão com mais precisão e profundidade que Celso de Mello, quando se referiu ao colega que agora faz 25 anos de corte: "A história tem registrado que, nos votos vencidos, reside, muitas vezes, a semente das grandes transformações".
Hoje o ministro Marco Aurélio brinca com isso. Diz que o colega exagerou, e lembra da analogia do ministro Nelson Jobim: "Ele dizia que sou como o ferrinho do dentista, que fica ali no nervo exposto, cutucando".
Mas não há como negar que Marco Aurélio plantou algumas sementes de transformação na história do Supremo. E como ele mesmo já adiantou que pretende ficar mais cinco anos no tribunal, será mais meia década que o Brasil assistirá o Supremo tomar as rédeas do avanço social e cultural por meio do voto vencido. É como ele diz:

FALTA DE CONTINUIDADE Trabalho doméstico prestado por até três dias não configura vínculo empregatício

O trabalho doméstico prestado por até três dias na semana não é suficiente para configurar o vínculo empregatício em razão da ausência de continuidade. Foi o que decidiu a 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) ao julgar uma ação movida por uma cuidadora que prestava serviço duas vezes por semana em uma residência e por isso reivindicava o reconhecimento da relação empregatícia.
A decisão é anterior a Lei Complementar 150, de 1º de junho de 2015, que definiu como empregado doméstico aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de dois dias por semana.
Na ação, a trabalhadora alegou ter sido admitida em junho de 2010 para cuidar de uma senhora idosa, como técnica de enfermagem. Ela exerceu a atividade até março de 2013, quando foi dispensada. A cuidadora explicou que cumpria jornada em regime de plantão de 24X48 horas e trabalhava das 8h às 8h do dia seguinte. Contudo, nunca teve a carteira de trabalho assinada nem recebeu as verbas rescisórias quando fora demitida.
Em sua defesa, a empregadora afirmou que a trabalhadora não era empregada doméstica, prestava serviços apenas duas vezes por semana e que o pagamento da diária, no valor de R$ 100,00, era feito mensalmente a pedido da cuidadora para o melhor controle dos seus gastos. Ela contou que foi a própria técnica de enfermagem que pediu para dormir no trabalho por morar longe, assim como teria tomado a iniciativa de terminar o contrato de trabalho.
O desembargador Paulo Marcelo de Miranda Serrano, que relatou o caso, afirmou que o diarista é um trabalhador que se dispõe a prestar serviços em algum dia ou outro da semana, conforme seu interesse ou disponibilidade.
"Seus compromissos pessoais ou mesmo familiares podem não lhe permitir a disponibilidade integral na semana ou ele pode preferir esse tipo de atividade, trabalhando em diversas residências, executando um tipo especial de serviço", disse o desembargador, que utilizou a súmula 19 do TRT-1 para fundamentar a decisão de negar o reconhecimento do vínculo da trabalhadora. Cabe recurso. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-1.

MESMO TETO Todo familiar beneficiado por trabalho de doméstica é empregador

O familiar que se beneficia do serviço prestado por trabalhador doméstico também é considerado empregador. Foi o que decidiu a 10ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) ao julgar recurso interposto por um homem que alegava que a mulher que trabalhava em sua casa havia sido contratada apenas pela mãe dele. A decisão o condenou a indenizar a trabalhadora por danos morais no valor R$ 15 mil por dispensa de forma abrupta, além de reconhecer o vínculo empregatício, obrigando o pagamento de verbas trabalhistas.
No recurso, o familiar alegou que a trabalhadora prestou serviços para ele como diarista e não como empregada doméstica, apenas em 2011, dois anos após a morte da sua mãe — razão pela qual ele não teria dado continuidade à relação de emprego que existia. Ele alegou que, durante o período em que a doméstica trabalhou para sua mãe (de 1993 a 2009), nunca dirigiu os serviços dela e apenas passou um tempo na casa da mãe para cuidar da saúde, não tendo feito parte do núcleo familiar. Dessa forma, argumentou que não poderia ser considerado empregador.
Para o desembargador Flávio Ernesto Rodrigues Silva, que relatou o caso, a parte não provou que contratara a doméstica apenas em 2011 e como diarista. O relator também destacou o artigo 1º da Lei 5.859/72, que considera a pessoa ou a família dentro do ambiente residencial como empregador do trabalhador doméstico.
“Nesse sentido, foi também o recorrente (familiar) empregador pelo tempo em que morou na casa de seus pais. Ainda que não dirigisse o serviço da autora (doméstica), dele por certo se beneficiava. Além disso, há provas nos autos no sentido de ter o reclamado (familiar) morado com a sua mãe por todo o tempo em que a reclamante exerceu a função de doméstica”, escreveu.
Segundo o relator, só pelo fato de o familiar ser sucessor da antiga empregadora, já deveria responder pelos débitos trabalhistas contraídos pela mãe. Com relação aos danos morais, o desembargador decidiu manter a condenação, porque ou autor não negou a existência dos fatos alegados pela empregada, que afirmou ter sido dispensada de forma inesperada quando pleiteou pelo recebimento das férias, as quais havia solicitado tirar, pela primeira vez, ao longo de 20 anos de serviços prestados. Cabe recurso. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-1. 

SEM DESCULPA Dificuldade não desobriga empresa de contratar aprendizes e deficientes

As leis que tratam da contratação de aprendizes e pessoas com deficiência é taxativa e não permite qualquer exceção, mesmo diante da dificuldade de se encontrar mão de obra. Com essa justificativa, a 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) negou provimento ao recurso de uma transportadora em ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho para obrigá-la a cumprir os percentuais de contratações previstos na legislação.
No recurso, a empresa contestava a decisão do juiz substituto Raphael Viga Castro, da 2ª Vara do Trabalho de Nova Iguaçu, que a condenou a pagar indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 100 mil.
A companhia argumentou que a maior parte das funções do seu quadro de pessoal não pode ser exercida por menores de 21 anos: como no caso dos motoristas (profissional e júnior) ou de cobrador, pois não são compatíveis com o desenvolvimento de um aprendiz, além de não poder ser exercida por menores, a quem é vedado o trabalho em horário noturno. Sobre as pessoas portadoras de deficiência, a empresa alegou falta de mão de obra no mercado.
Para a desembargadora Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da Silva, que relatou o processo, a lei é taxativa e não prevê qualquer exceção. Sobre os menores aprendizes, a relatora afirmou que a empresa vem descumprindo os artigos 428, 429 da CLT e o artigo 11 do Decreto 5.598/2005.
Em relação à cota de trabalhadores com deficiência, a empresa estaria descumprindo, entre outros dispositivos, o artigo 93 da Lei 8.213/1991. Ela citou ainda a Convenção Internacional 159 da Organização das Leis do Trabalho, ratificada pelo Brasil, e que tem status de norma constitucional.
Com relação aos aprendizes especificamente, a desembargadora destacou que a lei não restringe à contratação apenas de jovens menores de idade. De acordo com ela, os aprendizes podem ser maiores de 18 anos e chegar até os 24 anos nessa condição. “Garantir a dignidade do ser humano trabalhador, o valor social do trabalho, a redução das desigualdades, bem como a não discriminação são essenciais e inerentes a uma sociedade justa e fraternal”, afirmou.
No que se refere à contratação de pessoas com deficiência, a relatora ressaltou que dificuldade para obter interessados nas vagas de emprego oferecidas não desobriga a empresa de observar sua função social. Sayonara destacou que existem instituições de ensino especializadas, assim como inúmeras empresas de consultoria de recursos humanos que poderiam intermediar a contratação de pessoal.
Diante dos argumentos da relatora, a turma manteve a decisão de primeiro grau. Cabe recurso. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-1.

IMPRUDÊNCIA DA COMPANHIA Guarda municipal atropelado em serviço será indenizado

A Guarda Municipal do Rio de Janeiro terá que pagar R$ 45,3 mil por danos morais, além de pensão vitalícia, a um funcionário atropelado em serviço por um dos carros da própria companhia. O acidente aconteceu quando ele prestava auxílio a uma vítima de um AVC. Para a 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, a empregadora teve culpa. 
Segundo o desembargador Theocrito Borges dos Santos Filho, que relatou o caso, o acidente aconteceu porque o veículo que atingiu o guarda trafegava com as portas abertas, pois não havia espaço suficiente para a maca destinada ao socorro da vítima. "Não há dúvidas de que a conduta da ré permitiu a ocorrência do acidente, por inobservância do dever de fornecer os meios necessários e adequados para o desenvolvimento da atividade profissional", escreveu. 
Na ação, o guarda municipal contou que estava no exercício das suas funções quando se dirigiu à Praça Afonso Pena, no bairro da Tijuca, para atender a um chamado da Guarda Municipal feito por rádio. A ocorrência era para uma pessoa que passava mal e apresentava quadro de AVC. Enquanto ele prestava socorro, acabou atingido nas costas e no joelho por outra viatura que estava com uma das portas abertas. 
O guarda municipal foi hospitalizado. Os exames médicos comprovaram a existência de contusão no joelho direito e na coluna lombar, acarretando “hérnia de disco lombar pós-trauma”. Os danos sofridos ocasionaram perda da capacidade do trabalhador, que passou também a sentir dores intensas.
Após o acidente, ele entrou na Justiça do Trabalho para pedir reparação moral e material, além da pensão vitalícia. A primeira instância estipulou o dano moral em R$ 45,3 mil e concedeu a pensão vitalícia. A empresa e o empregado recorreram: o primeiro para contestar a decisão, o segundo para pedir uma indenização maior.
No recurso, a Guarda Municipal argumentou que o veículo estava com uma das portas abertas porque transportava uma maca que não cabia totalmente no seu espaço interno. E destacou que a atividade que normalmente desenvolve (proteção de bens, serviços e instalações municipais) não implicam em risco de atropelamento a seus empregados.
Mas para o relator do caso, o simples fato de a Guarda Municipal disponibilizar um veículo para atendimento a vítimas no qual não é possível colocar uma maca já é motivo suficiente para comprovar que não houve a prudência necessária. “A vida funcional do acidentado foi interrompida abruptamente por culpa da empregadora”, disse.
Por unanimidade, o colegiado decidiu manter o valor da indenização por dano moral fixado no primeiro grau. O colegiado também decidiu atender parcialmente outro pleito do trabalhador com relação ao reajuste do valor da pensão com base nos aumentos legais e normativos da categoria profissional. Cabe recurso. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-1.

PROTEÇÃO DA FAMÍLIA Falta de vaga não impede transferência para acompanhar cônjuge

A inexistência de vagas não impede a remoção do trabalhador. Foi o que entendeu a 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) ao julgar uma ação movida por uma funcionária da Caixa Econômica Federal para obter a transferência da agência que trabalha no Rio de Janeiro para outra na cidade de Juiz de Fora, em Minas Gerais. Ela queria acompanhar o marido, um oficial do Exército que havia sido transferido para aquela cidade.
A funcionária contou que pediu à Caixa que a transferisse para uma agência em Juiz de Fora ou em qualquer outro município de Minas Gerais, mas o banco alegou indisponibilidade de vagas e indeferiu o pedido. Ela entrou na Justiça, mas a primeira instância também negou a transferência.
A trabalhadora recorreu. No TRT-1, argumentou que ficou sozinha no Rio de Janeiro com o seu bebê. A desembargadora Tânia da Silva Garcia, que relatou o caso, decidiu pela procedência da transferência. Ela baseou sua decisão em uma norma interna da Caixa que assegura a transferência de empregado para acompanhar cônjuge que tenha sido removido de ofício — fato este comprovado nos autos.
Para a relatora, a inexistência de vagas não pode ser considerada óbice. “Deve-se sempre procurar manter a proteção do Estado à família”, afirmou Tânia, destacando o artigo 226 da Constituição Federal, que diz que “a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-1. 

VIOLAÇÃO DA IMAGEM Usar uniforme com propaganda gera dano moral, decide TRT-1

O empregado de uma transportadora que era obrigado a usar no trabalho um uniforme com logomarcas de diversas empresas conseguiu o direito, na Justiça do Trabalho, à indenização por dano moral no valor de R$ 2,5 mil. Para a 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ), que proferiu a decisão, houve violação à imagem do trabalhador.
Segundo o funcionário, ele era obrigado a usar o uniforme da empresa, que recebia dos fornecedores pela divulgação, mas não o compensava pelo uso indevido da imagem.
A empresa alegou que em momento algum o empregado apontou qualquer evento ou situação que lhe tenha causado constrangimento ou lesão à honra ou ao moral pelo fato de usar uniforme com logomarcas comerciais.
Na primeira instância, a juíza do Trabalho Gabriela Canellas Cavalcanti, da 67ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, reconheceu o uso indevido da imagem e determinou o pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 8 mil ao trabalhador. A empresa recorreu da decisão.
No segundo grau, a desembargadora Dalva Amélia de Oliveira, que relatou o caso, manteve o dano moral com base no artigo 20 do Código Civil Brasil, que dispõe: "Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais".
A desembargadora, no entanto, votou pela redução da indenização, passando o valor de R$ 8 mil para R$ 2,5 mil. "O descumprimento de obrigações decorrentes do contrato de trabalho, de caráter patrimonial, são reparáveis pela restitutio in integro, não havendo que se falar em reparação moral por tal fundamento", observou a relatora. Cabe recurso. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-1.

GASTO EXTRA - Mesmo comum no dia a dia, uniforme deve ser pago pelo empregador

O empregador não pode transferir ao funcionário o custo do uniforme, se este for exigido, mesmo que as peças de roupa sejam comuns no vestuário do dia a dia. Com base nesse entendimento, a 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) reformulou sentença de primeira instância e concedeu indenização a um cobrador de ônibus que tinha de usar calça e camisa sociais, cinto, sapato e meias, tudo na cor preta, mas só recebia do patrão os dois primeiros.
Insatisfeito com a situação, o empregado procurou a Justiça pedindo ressarcimento no valor de R$ 359,30 por ano de trabalho. Na sentença, o juiz de primeiro grau entendeu que os itens exigidos são comuns a qualquer cidadão e podem ser facilmente utilizados fora do ambiente de trabalho. Por essa razão, não considerou razoável a condenação e julgou improcedente o pedido. O reclamante então recorreu e conseguiu reverter a situação.
Com base no voto do desembargador Rogério Valle Ferreira, a 6ª Turma do TRT-3 reconheceu que a empresa é quem deve arcar com o pagamento das roupas exigidas como uniforme. "A meu ver, o simples fato de se tratar de peças comuns do vestuário e que, assim, podem ser usadas fora do ambiente de trabalho, não afasta a obrigação da reclamada de indenizar os valores gastos pelo empregado a tal título", destacou o relator.
Acompanhando o entendimento, a 6ª Turma deu provimento ao recurso para acrescer à condenação o pagamento de indenização de R$ 359,30 por ano de trabalho a título de restituição de gastos com uniforme. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-3.
Processo 0000875-18.2014.5.03.0180 RO.

VIGILANTE VIRTUAL - Juiz anula multa de trânsito depois de checar dados usando o Google Maps

Não é só para descobrir o caminho mais rápido para chegar ao tribunal que os juízes estão usando os aplicativos de trânsito e mapas. Com uma consulta ao Google Maps e ao Google Street View, o desembargador Paulo Sérgio Prestes dos Santos, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, embasou seu entendimento para anular uma multa de trânsito emitida pela prefeitura do Rio de Janeiro e pelo Departamento de Trânsito fluminense.
A 2ª Câmara Cível do TJ-RJ acompanhou o voto de Santos, que demonstrou que o motorista que recorreu da multa não havia estacionado em local proibido, ao contrário do que argumentava o Detran. A decisão condena o município a pagar R$ 10 mil de indenização por dano moral ao condutor. Já o Detran terá que cancelar a pontuação negativa que atribuíra à habilitação dele.
O acórdão reforma a decisão de primeira instância, que havia julgado o pedido do autor por considerar que no caso “incide a presunção relativa de legitimidade dos atos administrativos”.
A prefeitura dizia que o condutor estacionou o carro em frente ao número 31 da rua e a apenas cinco metros de distância de um cruzamento. Ao apreciar o caso, o relator concluiu que apenas uma questão "já seria suficiente como início da prova a contrapor a presunção que o autor estacionara em frente à loja 31": é que o auto de infração fora emitido às 10h, sendo que as 9h59 o autor ainda se encontrava no interior da farmácia localizada no numera 13/15 da mesma rua.
Mas, de acordo com Santos, é possível ir além: o auto de infração é inverossímil. "Com os recursos da ferramenta Google Street View é possível verificar in loco o logradouro onde ocorreram os fatos debatidos na inicial, percorrendo-se virtualmente a Rua Dias da Cruz de modo a constatar que o imóvel do numeral 31 não se situa em uma esquina. Já com os recursos de cálculo de rotas da ferramenta Google Maps, observa-se que a loja de número 31 está a pelo menos 55 metros de distância da via transversal, o que prudentemente assegura uma razoável margem de erro frente aos cinco metros imputados pelo auto de infração.”
De acordo com Santos, foi-se o tempo em que controle jurisdicional do ato administrativo restringia-se apenas aos aspectos da legalidade do ato. Hoje, o ato administrativo pode e, se for o caso, deve ser invalidado. “E isto assim se opera por força de um controle ampliado e dotado de maior efetividade que é garantido pela inarredável adequação a que o ato deve ser submetido diante de todo ordenamento jurídico vigente, aí incluídas as regras, princípios e demais atos normativos de conformação.”
Segundo o relator, o julgador deve se valer de todos os recursos que estejam à sua disposição na busca da verdade. “O magistrado moderno tem acesso a instrumentos tecnológicos que lhe permitem comparecer a determinados locais no mundo físico sem sequer precisar sair de seu gabinete. Seria, a certo modo, uma forma de efetivar a norma contida no artigo 442, I, do Código de Processo Civil [...]”, afirmou. 
Diz o CPC: “O juiz irá ao local, onde se encontre a pessoa ou coisa, quando: julgar necessário para a melhor verificação ou interpretação dos fatos que deva observar”.

Acorda Caraguatatuba e politicos que respondem a processos - INFORMAÇÃO LIVRE - Imprensa não deve aguardar fim de processo para publicar notícias

Na atividade da imprensa, a caracterização da responsabilidade civil pela divulgação de notícia deve estar associada a uma conduta abusiva ou excessiva do profissional ou do meio de comunicação. A imprensa também não tem obrigação de aguardar a conclusão de uma investigação oficial ou processo judicial, até que não restem mais dúvidas sobre os fatos.
Foi o que entendeu o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro ao julgar procedente a ação movida por uma editora para tentar rescindir o acórdão que a condenou pagar R$ 8 mil a um homem citado nas reportagens que publicou sobre a chacina de Vigário Geral. A decisão foi proferida na última segunda-feira (16/6).
A chacina aconteceu em 1993, em uma favela da Zona Norte do Rio — 21 pessoas morreram no episódio. O homem foi citado nas reportagens como um dos integrantes do grupo Cavalos Corredores, responsável pela matança.
Ele, então, processou a editora sob a alegação de que havia sido absolvido em outra ação julgada anteriormente pelo TJ-RJ. Depois de tramitar na primeira instância, recursos levaram o caso à 8ª Câmara Cível, que acolheu o pedido e condenou a empresa de comunicação e um de seus profissionais a pagarem de forma solidária a indenização.
A editora baseou o pedido em dois fatos. O primeiro seria o dolo processual do acusado, que teria omitido da 8ª Câmara Cível que o processo em que fora absolvido versava apenas sobre o crime de quadrilha ou bando, previsto no artigo 288 do Código Penal, “sem pôr a termos às investigações e aos processos sobre as relações do réu com o grupo Cavalos Corredores”.
O desembargador Mauricio Caldas Lopes, não acolheu essa alegação. Para ele, não houve dolo processual. "Isto porque, na peça inicial da demanda originária encontra-se a transcrição literal de diversos trechos do voto do relator da ação penal a evidenciar que o ora réu não procurara falsear a realidade objetiva dos fatos. Tanto assim que a sentença de 1º grau julgara improceder a ação indenizatória”, afirmou.
Posição diferente demonstrou o relator diante do segundo argumento do pedido rescisório apresentado pela editora: o surgimento de um novo documento — no caso, o inquérito policial e a subsequente denúncia que resultou na abertura de nova ação penal.
“Como demonstra a prova diligentemente produzida pela douta procuradoria de justiça, os documentos em questão preenchem os requisitos para o conhecimento da presente ação rescisória, pois existiam antes da prolação do julgado que se pretende desconstituir, e a parte autora justificara o motivo pelo qual estava impedida de tê-lo obtido para o fim de ser utilizado na fase instrutória do processo principal”, disse o desembargador.
Segundo Lopes o inquérito, que tramitou em sigilo, só foi instaurado em 1996. A denúncia, por sua vez, somente chegou ao Judiciário em julho de 2011, quando já havia sido concluída a fase recursal da ação movida pelo homem contra a editora.
Jurisprudência
Ao analisar o caso, o relator destacou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmada no julgamento de uma ação sobre “a potencialidade ofensiva de matéria publicada em jornal de grande circulação” que apontava o possível envolvimento de um juiz com ex-deputado ligado ao desabamento do edifício Palace II, também no Rio de Janeiro. No julgamento, o STJ afirmou que ainda que o magistrado tenha sido absolvido, a reportagem foi veiculada quando as investigações estavam em andamento.
A diligência que se deve exigir da imprensa, de verificar a informação antes de divulgá-la, não pode chegar ao ponto de que notícias não possam ser veiculadas até que haja certeza plena e absoluta da sua veracidade. O processo de divulgação de informações satisfaz verdadeiro interesse público, devendo ser célere e eficaz, razão pela qual não se coaduna com rigorismos próprios de um procedimento judicial, no qual se exige cognição plena e exauriente acerca dos fatos analisados”, entendeu a corte na ocasião.
O desembargador aplicou o mesmo entendimento ao caso das reportagens da chacina.  Lopes votou pela desconstituição do acórdão da 8ª Câmara Cível. Ele foi seguido por todos os membros do Órgão Especial do TJ-RJ.
Processo: 0066562-35.2013.8.19.0000.

Falta de afeto não é desculpa para pai deixar de arcar com obrigações, diz TJ-RJ

O fato de a jurisprudência brasileira valorizar a ligação afetiva na hora de determinar as obrigações da paternidade não coloca o vínculo biológico em segundo plano. Sendo assim, a inexistência de estreito relacionamento não pode servir de justificativa para o pai biológico deixar de cumprir com suas obrigações, incluindo o pagamento de alimentos.
Assim decidiu o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. No caso, um homem tentava rescindir o acórdão que o condenara a pagar pensão alimentícia ao filho de 50 anos, que não pode mais trabalhar em razão das doenças que desenvolveu por ser portador do vírus HIV. O pai biológico do autor da ação alegou que a ajuda deveria ter sido reivindicada do homem que o registrou e com quem ele teria desenvolvido relação socioafetiva. Mas o colegiado rejeitou o argumento. 
Tudo começou em 2000, quando o filho ingressou com uma ação de reconhecimento de paternidade. O exame de DNA comprovou a paternidade, e o Judiciário do Rio acabou por condenar o homem, “um diretor da Rede Globo”, a pagar pensão alimentícia no valor de 700% sobre o salário mínimo. Após o julgamento dos recursos, a Justiça confirmou a condenação, que transitou em julgado em 2007. Mas inconformado, o pai biológico propôs uma nova demanda, desta vez para tentar rescindir a decisão que lhe foi desfavorável.
Na ação rescisória, o homem criticou o fato de a ação investigatória de paternidade ter sido proposta pelo filho somente aos 50 anos. Disse que o processo foi motivado exclusivamente pelo interesse financeiro do filho, “pelo simples fato de ser um homem mais rico” e “que a simples ligação genética não justifica a legitimidade ativa para uma ação de alimentos”. Para o homem, “na obrigatoriedade da prestação alimentar deveria prevalecer a paternidade socioafetiva” — ou seja, do homem que o registrou mesmo sabendo que não era o verdadeiro pai.
O desembargador Celso Ferreira Filho, que relatou o caso, rejeitou os argumentos. Ele afirmou que a ação de reconhecimento de paternidade julgada pelo TJ-RJ revelou que filho e pai adotivo nunca tiveram “o que se possa chamar de relacionamento afetivo”. É que apesar de tê-lo registrado, esse pai não conviveu com o filho, que morava com a avó. E depois de separar-se da mãe dele, não tiveram mais contato. “É fato que só conviveram por curto espaço de tempo, tendo durante esse período dispensado ao filho adotivo a indiferença”, disse o desembargador.
Ferreira Filho também refutou a crítica feita pelo pai biológico de a ação de reconhecimento de paternidade ter sido movida pelo filho apenas aos 50 anos de idade. Segundo o desembargador, não há porque se questionar o direito de um filho buscar sua verdade, “pois tal necessidade por vezes é tão visceral que quis o legislador não estabelecer prazo derradeiro”.
O relator também rejeitou a alegação de que a ligação genética não é suficiente para determinar o pagamento de alimentos, anda mais quando considerada a necessidade do filho, que deixou de trabalhar por causa de doença. De acordo com ele, “embora talvez nunca se possa precisar ao certo porque um pai se negaria a ajudar um filho necessitado, fato é que a decisão judicial deve ser acatada, não se prestando para vê-la rescindida o mero e incansável inconformismo do autor”.
“O direito brasileiro, como bem já salientado, não contempla a figura do filho meramente biológico […]. O que existe em nosso ordenamento é a filiação, compreendidos nela os filhos havidos ou não do casamento, aos quais é vedado qualquer tratamento discriminatório. Portanto, ou se é filho ou não se é. No mais, todos os direitos e deveres estão salvaguardados, inclusive o de prestar mútua assistência”, acrescentou o relator
Sem argumentos
No julgamento, Ferreira Filho afirmou que a ação rescisória não é uma nova instância recursal e criticou o fato de o autor ter apresentado nesta demanda os mesmos argumentos que defendera no processo original. “Tal tese está fadada ao fracasso, pois para vê-la triunfar, não basta ao autor repeti-la e repeti-la”.

O relator concluiu afirmando que a inexistência de estreito relacionamento não pode servir de justificativa para o pai biológico deixar de cumprir com suas obrigações. “O estigma lançado aos filhos de pais que, ao gerá-los, não os desejavam, clama por Justiça, pois subverte os princípios mais sagrados da responsabilidade, fazendo do réu a vítima e da vítima o réu condenado a expiar inexoravelmente a pena de um delito ou ato que não cometeu. Todo homem com capacidade generandi é responsável pelos filhos que põe no mundo. O ordenamento jurídico, como assinalado, disciplina cuidadosamente esse atuar humano”, afirmou o desembargador.
O processo tramitou em segredo de justiça e não foi provido por maioria de votos. No julgamento, o homem também acabou sendo condenado a arcar com as custas processuais e os honorários advocatícios no valor de R$ 10 mil. A decisão foi publicada no último dia 10 de junho. 

Homem é condenado a manter pensão paga a ex-mulher há mais de 15 anos

Uma pessoa idosa, com problemas de saúde e sem possibilidade de se inserir no mercado de trabalho tem direito a continuar recebendo pensão alimentícia do ex-cônjuge. Este é o entendimento unânime da 4ª Vara da Família e Sucessões do Tribunal de Justiça do Paraná em um caso no qual o ex-marido pediu que fosse autorizado a parar de pagar ajuda a antiga mulher da qual está separado há mais de 15 anos.
O casamento entre as partes durou dez anos, entre 1982 e 1992, e logo que terminou ficou estabelecido no processo de divórcio que o homem pagaria uma pensão de 20% dos seus rendimentos à ex-mulher. Por comum acordo esse valor caiu para 10% em 2009. E agora o antigo marido alegou que formou nova família, inclusive com filha menor de idade, e por isso deve usar seus rendimentos para o novo núcleo.
O relator do caso, Ruy Muggiati, entendeu que foi criado um vínculo financeiro tão grande entre as partes que não é possível simplesmente desfazê-lo. “A requerida se dedicou ao lar na época em que tinha efetivas condições de desenvolver autonomia financeira e sacrificou essa possibilidade em benefício do casamento. Neste quadro de sua vida, seria incorreto supor que ela poderá se manter sem o pensionamento. Não há nenhuma perspectiva de que possa se reorganizar economicamente, na idade em que se encontra e com estado de saúde debilitado”, escreveu em seu voto.
Jurisprudência esmiuçada
O ex-marido teve seu pedido aceito em primeira instância. O juiz que analisou o caso ressaltou que a jurisprudência aponta para um caminho no qual a pensão entre ex-cônjuges seja interrompida em algum momento. Além disso, acatou os argumentos do homem, que contestou o problema de saúde da mulher e ressaltou que ela possui atividades econômicas que geram renda.

“A parte apenas demonstrou que se encontra realizando tratamento de saúde, sem trazer qualquer demonstrativo que esteja acometida por grave doença que impeça a realização de qualquer atividade laborativa. Além disso, o autor trouxe aos autos a informação de que a ré, além de auferir renda com o aluguel de um imóvel, trabalha em casa, fazendo comida e lavando roupas para terceiros. O divórcio do casal já chega a dezesseis anos, sendo certo que a jurisprudência atual caminha no sentido de se colocar termo final à obrigação alimentar entre cônjuges, sob pena de eternização da ajuda, ressalvadas, por óbvio, situações excepcionais”, disse o juiz em sua decisão.
Quando recorreu ao TJ, a ex-mulher afirmou que seu rendimento é de R$ 840, valor que não ultrapassa o salário mínimo. O desembargador Ruy Muggiati acolheu os pontos apresentados e em seu voto demonstrou que está ciente da jurisprudência, mas que este é um caso diferente.
“A jurisprudência vem assentando orientação firme no sentido de que a assistência conjugal posterior ao casamento tem caráter precário, é limitada ao período em se revele indispensável para o recomposição financeira e recuperação da possibilidade de autossustento pela parte menos favorecida. Com efeito, a falência do projeto conjugal não autoriza um paternalismo condescendente do Poder Judiciário, garantindo pensionamento eterno à parte alimentanda, com base em simples comodismo. Todavia, também não descaracteriza o dever de assistência e solidariedade entre os nubentes. Assim, são as particularidades do caso e os contornos do projeto de vida do casal que vão definir a necessidade ou não de extinção da obrigação”, escreveu o desembargador.

EXAME INDISPENSÁVEL - STF reafirma exigência de concurso para cartórios

É preciso prestar concurso público para exercer atividades notoriais e de registro. Foi esse o entendimento reafirmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal ao interpretar como inconstitucional artigos da lei do estado de Santa Catarina que permite a efetivação de profissionais contratos sem concurso. Tramita no Congresso Nacional a PEC 471, que pretende modificar a Constituição para permitir a efetivação dos titulares de cartórios que foram contratados sem prestar concurso. Estima-se que mais de 5 mil funcionários estejam nessa situação no país.
A Lei 14.083/07 criada pela Assembleia Legislativa de Santa Catarina assegura aos substitutos da atividade notorial e de registro a efetivação no cargo como titular em caso de vacância. De acordo com a lei, os profissionais precisariam apenas estar em efetivo exercício, pelo prazo de três anos, na mesma serventia, na data da promulgação da Constituição.
A matéria foi debatida no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pelo Conselho Federal da OAB. Para o autor da ação, os dispositivos contestados ferem a Constituição Federal, especialmente o artigo 236 (parágrafo 3º), o artigo 37 (inciso II) e o artigo 5º (caput). O artigo 236, por exemplo, estabelece que o ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público e não permite que qualquer serventia permaneça vaga por mais de seis meses sem abertura de concurso público.
A PEC dos Cartórios em votação na Câmara dos Deputados propõe a efetivação, sem concurso público, de cerca de 5 mil funcionários de cartórios. A proposta dá nova redação ao parágrafo 3º do artigo 236 da Constituição, para a efetivação sem concurso público dos tabeliães substitutos. A PEC 471 contraria posição do Conselho Nacional de Justiça que, em junho do ano passado, estipulou a data máxima de 16 de dezembro para que todos os tribunais estaduais efetivassem os aprovados nos concursos em andamento para preenchimento dos cartórios vagos. A OAB também é contra a medida.
O relator da ADI contra a lei de Santa Catarina, ministro Eros Grau, disse “que não há dúvida de que o provimento de cargo da atividade notarial depende de concurso público”. Já o ministro Celso de Mello lembrou que o Supremo já defendeu o concurso público público de provas e títulos, que representa uma exigência explícita do próprio artigo 236, parágrafo 3º, da Constituição. “Nesse caso, o próprio Conselho Nacional da Magistratura editou resolução nesse sentido. É que se impõe, para efeito de se legitimar a outorga de delegação registral ou notarial, a prévia aprovação em concurso público de provas e títulos”, afirmou o ministro, ao frisar que esta é uma regra constitucional muito clara. Com informações da Assessoria de Imprensa do Supremo Tribunal Federal.

SEM CONCURSO PEC - dos Cartórios é aprovada em primeiro turno pelo plenário da Câmara

Proposta de Emenda Constitucional 471 foi aprovada pelo plenário da Câmara dos Deputados em primeiro turno com 333 votos favoráveis, 133 contrários e 6 abstenções. Conhecida como PEC dos Cartórios, a proposta quer efetivar interinos de cartórios extrajudiciais sem exigir concurso público. A PEC ainda passará por segundo turno de votação e ainda precisa ser analisada pelo Senado.
O artigo 236, parágrafo 3º da Constituição Federal, delimita que o exercício da atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não sendo permitido vacância de postos por mais de seis meses sem abertura de concurso público. Segundo dados de 2014 do Conselho Nacional de Justiça, a proposta vai beneficiar cerca de 4,5 mil pessoas com titularidade provisória, dentre os 13.785 cartórios existentes no Brasil.
Em 2009, o CNJ encaminhou ao Congresso Nacional nota técnica contra a aprovação da PEC 471. À época, o corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp, afirmou que a aprovação da PEC acarretaria retrocessos e favorecia aqueles que, “em ofensa ao artigo 236 da Constituição Federal, há anos se beneficiam indevidamente de serviço público remunerado pela população brasileira”.
Segundo o ministro Dipp, a PEC conflita com a Resolução 80/2009, editada pelo CNJ, que busca garantir os princípios constitucionais da moralidade pública, da impessoalidade e a forma republicana de governo, “de maneira que os Cartórios de Notas e de Registros sejam preenchidos por cidadãos devidamente aprovados em concursos públicos, e não por pessoas escolhidas por critérios subjetivos e muitas vezes nebulosos”.
Em 2012, o substitutivo elaborado pela comissão responsável por analisar a proposta na Câmara foi rejeitado pelo plenário da Casa. À época, faltaram 25 votos para que o substitutivo fosse aprovado e, após várias tentativas de votação, a PEC não votada. Na noite da aprovação (26/8), os deputados votaram o texto original da PEC, apresentado pelo deputado João Campos (PSDB-GO), porque o substitutivo havia sido rejeitado.
Deputados favoráveis à PEC argumentam que não é justo deixar desamparadas essas pessoas que são responsáveis pelas serventias há anos e que investiram recursos próprios.
Grave retrocesso
Em nota, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil classificou a aprovação em primeiro turno da PEC dos Cartórios como um grave retrocesso. "Não é possível que em pleno século XXI uma PEC que não atende aos vários princípios republicanos seja avalizada", diz o texto.

De acordo com a OAB, a proposta traz critérios que se assemelham a uma monarquia, ao manter a hereditariedade dos cartórios e eternizar direitos e privilégios de pessoas por causa de consanguinidade. "Não bastassem tais problemas, do ponto de vista legal a matéria é, inclusive, inconstitucional. Ela fere o direito daqueles que fizeram concurso público — conforme determina a Constituição — e aguardam o momento de assumirem suas vagas."
Na nota, a OAB pede que o Congresso não aprove a PEC e afirma que, caso seja aprovada, a proposta será questionada no Supremo Tribunal Federal. Com informações da Agência Brasil e da Assessoria de Imprensa da OAB.

INTERESSE SOCIAL - Imóvel público não pode ser adquirido por usucapião, decide TJ-GO

Imóvel público não pode ser adquirido por usucapião. Com esse entendimento, o desembargador do Tribunal de Justiça de Goiás Kisleu Dias Maciel Filho reconheceu o domínio público da área em Anápolis onde foi construída a residência de José Eustaque Dias e determinou a desocupação do imóvel.
Dias alegou que embora o imóvel esteja matriculado em nome do município, ele está abandonado há mais de dez anos. Por isso, ele construiu sua residência no local, sendo justa sua posse, pois a área não estava sendo utilizada para nenhum fim público. Disse também que a prefeitura só manifestou interesse após ter edificado sua casa no terreno.
O município de Anápolis, por outro lado, defendeu que Dias exerce posse precária sobre o imóvel, uma vez que se trata de bem de uso comum do povo, sendo que a área é destinada à construção da Praça II do setor onde está localizado.
Em sua decisão, o desembargador mencionou o artigo 1.228 do Código Civil, que prevê que “o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”. Portanto, o município, provando ser o proprietário do imóvel, tem o direito de reavê-lo de quem o possua ou detenha injustamente.
Maciel Filho citou o entendimento do juiz de primeira instância que considerou comprovado que Dias se instalou na área urbana por força de aquisição ilegítima. Ele próprio admitiu que ocupou a área após invadi-la, tendo construído sua residência sob o pretexto que não estava sendo beneficiado por programa habitacional. Observou ainda, que Dias admitiu não ter adquirido a área de qualquer pessoa física ou jurídica, decidindo por ocupar o espaço urbano que se encontrava vago.
No entanto, a área ocupada por ele é um espaço público reservado no ato de constituição do loteamento para instalação da Praça II, previsto no Decreto Municipal 18.342/2004, conforme ficou provado na documentação juntada aos autos. Além disso, o magistrado disse que é inviável o exercício da exceção de usucapião em face de bem imóvel integrante do patrimônio público.
“Desta feita, diante dos requisitos legais que autorizam a procedência do pleito reivindicatório, não enseja reparo a sentença recorrida, mormente considerando a posse injusta que o apelante exerceu sobre o bem público, destinado à edificação de uma praça, cuja posse não lhe assegura nenhum direito”, afirmou Maciel Filho. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-GO.